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New Trends in Qualitative Research

On-line version ISSN 2184-7770

NTQR vol.12  Oliveira de Azeméis Aug. 2022  Epub Aug 25, 2022

https://doi.org/10.36367/ntqr.12.2022.e630 

Artigo Original

Análise qualitativa de modelos de curadoria de conteúdo digital: Possibilidades para o uso em CAQDAS

Qualitative analysis of digital content curation models: Possibilities for use in CAQDAS

Katia Alexandra de Godoi e Silva1  2 
http://orcid.org/0000-0002-6003-6852

António Pedro Costa3 
http://orcid.org/0000-0002-4644-5879

Natália Parron Teixeira1 
http://orcid.org/0000-0002-5777-5670

1Uniderp, Brasil

2 Unopar, Brasil

3Universidade de Aveiro, Portugal


Resumo:

Nos últimos anos, tem ocorrido um crescente desenvolvimento e interesse, por parte dos pesquisadores, no uso de software em investigações científicas, tanto no incremento de estratégias de revisão de literatura quanto na organização, coleta, análise e triangulação de dados. Esses aspectos revelaram possibilidades para discussões relacionadas à curadoria de conteúdo digital em Computer-assisted Qualitative Data Analysis Software (CAQDAS), pois a escolha e organização de dados qualitativos da pesquisa científica é afetada por essa complexidade de informações, envolvendo dilemas éticos que perpassam as investigações. Assim, o objetivo do presente estudo reside em contribuir para a reflexão e análise de modelos de curadoria de conteúdo digital que podem ser utilizados em CAQDAS. Para alcançar tal objetivo, utilizou-se metodologia qualitativa de cunho descritivo, possibilitada por uma revisão sistemática de literatura de trabalhos científicos sobre o tema da curadoria de conteúdo digital, a partir de buscas em duas bases de dados acadêmicas (ScientificElectronic Library On-line - SciELO e Scopus) e em duas bases da literatura cinzenta (Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - BDT/Capes e Google Acadêmico). Como resultados, constatou- se que há poucos modelos de curadoria de conteúdo digital, com aspectos semelhantes e empregados em diferentes modalidades de ensino (superior, médio e fundamental), e que há autores interessados em refletir sobre e utilizar tais modelos. Também se constatou que os modelos de curadoria de conteúdo digital podem ser ressignificados e explorados no contexto da organização de dados qualitativos em CAQDAS.

Palavras-chave: webQDA; Curadoria digital; Pesquisa qualitativa; Modelos de curadoria.

Abstract:

In recent years there has been a growing development and interest, on the part of researchers, in the use of software in scientific investigations, both in the increase of literature review strategies and in the organization, collection, analysis and triangulation of data. These aspects revealed possibilities for discussions related to the curation of digital content in Computer-assisted Qualitative Data Analysis Software (CAQDAS), as the choice and organization of qualitative data from scientific research is affected by this complexity of information, involving ethical dilemmas that permeate investigations. Thus, the objective of the present study is to contribute to the reflection and analysis of digital content curation models that can be used in CAQDAS. To achieve this objective, a qualitative descriptive methodology was used, made possible by a systematic literature review of scientific works on the subject of digital content curation, based on searches in two academic databases (Scientific Electronic Library On-line - SciELO and Scopus) and in two gray literature bases (Bank of Theses and Dissertations of the Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel (BDT/Capes) and Google Scholar). As a result, it was found that there are few models of curation of digital content, with similar aspects and used in different modalities of education (higher, secondary and elementary), and that there are authors interested in reflecting and using such models. It was also found that digital content curation models can be re-signified and explored in the context of organizing qualitative data in CAQDAS.

Keywords: webQDA; Digital curation; Qualitative research; Ccuration framework.

1.Introdução

O tema da curadoria é amplo e discutido em várias áreas do conhecimento. Por isso, não temos a pretensão de esgotá-lo, mas sim de trazer alguns elementos que consideramos importantes para pensar conceitos-chave para a proposta do presente estudo, que desenvolvemos no âmbito de um projeto de pesquisa aprovado pela Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular (Funadesp). Nessa perspectiva, encontramos a palavra curadoria usada no contexto artístico para descrever os processos de pesquisar e desenvolver projetos; escolher e organizar espaços e obras; administrar e estabelecer aproximações e diálogo entre as produções; assim como dar visibilidade às obras selecionadas. O trabalho curatorial é desenvolvido por um curador, ou seja, uma pessoa que “transita com facilidade através das emaranhadas florestas de produções artísticas.” (Santaella, 2007, p. 146). Na perspectiva destes pesquisadores, o processo de curadoria, para além de aspectos burocráticos e institucionais, estabelece autoria ao trabalho do curador. Excetuando esse conceito, segundo Souza (2018), Silva & Costa (2021), o termo curadoria digital passou a ser empregado em dispositivos que trabalham com a informação digital, isto é, que necessitam de seleção, armazenamento, classificação e análise. Dessa forma, o conceito amplia-se para todo o processo de gestão de materiais digitais. Por isso, a curadoria digital traz conceituações que se apoiam no Modelo do Ciclo de Vida da Curadoria Digital (DCC, 2019). Para o DCC, a curadoria digital é um processo complexo, contínuo e interdisciplinar, que envolve manutenção, preservação, avaliação, reavaliação, uso e reúso, assim como a agregação de valores aos dados da pesquisa digital, por todo o seu ciclo de vida. Barton (2018) e Silva & Costa (2021) acrescentam que são diversas e diferentes as atividades que envolvem a curadoria digital. Barton (2018) identificou um conjunto de palavras que contribui para a compreensão do processo da curadoria digital: criação, seleção, organização, apresentação, interpretação. Observa-se que a curadoria digital vem se espalhando rapidamente, por diferentes contextos, dentre eles, o Computer-assisted Qualitative Data Analysis Software (CAQDAS). A partir desse cenário, é essencial reconhecer e refletir sobre os impactos provocados pelas tecnologias digitais em nosso dia a dia e, consequentemente, para o processo da pesquisa qualitativa, como também compreender a importância da análise de modelos de curadoria digital e como tais modelos poderão auxiliar pesquisadores qualitativos na curadoria de conteúdo digital utilizando softwares conhecidos por CAQDAS. Nesse sentido, esta pesquisa foi orientada pela seguinte questão: Quais modelos de curadoria de conteúdo digital estão sendo propostos nas literaturas nacional e internacional que podem ser utilizados em CAQDAS? Chagas, Linhares, & Mota (2019) também discutem, em seus estudos, sobre o termo curadoria de conteúdo digital, o qual envolve o processo de selecionar e avaliar, entre a grande quantidade de materiais didáticos digitais disponíveis na world wide web (web) 2.0, um conjunto de conteúdos e apresentá-los de forma significativa, a partir das necessidades demandadas pelo contexto no qual o professor está inserido (Silva, 2013). Bruno & Mattos (2020) acrescentam que a curadoria de conteúdo digital no ensino também pode criar caminhos e possibilidades para que os materiais selecionados sejam acessíveis e compartilhados entre professores que busquem um tema específico. Tendo em vista esse recorte, o objetivo do presente estudo reside em contribuir para a reflexão e análise de modelos de curadoria digital e curadoria de conteúdo digital que possam ser utilizados em CAQDAS.

2.Metodologia

O presente estudo apresenta-se como uma pesquisa de abordagem qualitativa, a partir de uma revisão crítica da literatura. Tal tipo de estudo qualitativo caracteriza-se por destacar a relevância da interpretação dos autores acerca do fenômeno em análise: além de fundamentar-se na interdependência dinâmica entre o sujeito e o objeto, considera que os dados não são inerentes e neutros e, sim, possuidores de significados e relações (Chizzotti, 2017). Ademais, a revisão crítica da literatura é uma etapa fundamental em qualquer pesquisa, pois, para além de permitir identificar lacunas e propostas de pesquisa, seus resultados alicerçam todo o trabalho investigativo. Apesar da variedade de tipos de revisão, com especificidades, potencialidades e limitações, também existem etapas e procedimentos comuns que devem ser observados como orientadores e facilitadores de uma investigação (Fornari, Pinho, & Costa, 2019). Vale considerar que um dos problemas de realizar uma revisão crítica da literatura está na necessidade de lidar com o crescente volume de informações e da sua seleção. A partir desse panorama, esta pesquisa demonstra ser apropriada ao contexto para o qual se propõe, qual seja, a análise de modelos de curadoria de conteúdo digital que podem ser utilizados em CAQDAS, pois favorece o aporte de novos conhecimentos sobre tal temática. Ressalte-se que, para o desenvolvimento deste estudo, os autores formularam uma pergunta que norteou a investigação: Quais modelos de curadoria de conteúdo digital estão sendo propostos nas literaturas nacional e internacional que podem ser utilizados em CAQDAS? Para responder a essa indagação, planejou-se a busca de referências nas bases de dados, ao longo do mês de fevereiro de 2022. A procura por artigos, teses e dissertações foi realizada no período de 2018 a 2022, em duas base de dados acadêmicas: Scientific Electronic Library On-line (SciELO) e Scopus; e duas bases da literatura cinzenta: o Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (BTD/Capes) e o Google Acadêmico. As bases foram escolhidas por abrangerem grande e diversificado volume de publicações científicas representativas dos diversos campos de conhecimento. Para pesquisar os artigos, as teses e dissertações, foi utilizada a seguinte palavra-chave: “curadoria de conteúdo digital” and “modelo”, no idioma português, além do termo "digital content curation" and “framework”, no idioma inglês. As bases de dados foram configuradas para apresentar as palavras nos campos “título”, “resumo” e “palavras-chave”. Num primeiro momento, na busca de trabalhos científicos no idioma português, na base do Google Acadêmico, foram encontrados 44 trabalhos e quatro títulos selecionados. Na SciELO, não foi encontrado nenhum trabalho. No BTD da Capes, constavam duas teses de doutorado. Em idioma inglês, utilizamos a Scopus, na qual foram encontrados três trabalhos científicos. Em um segundo momento, foram selecionados seis estudos, que preencheram os seguintes critérios de inclusão: (a) ano de publicação: entre 2018 e 2022; (b) foco do estudo: proposta de modelo voltada especificamente para a curadoria de conteúdo digital; (c) idiomas da publicação: português e inglês. Em seguida, num terceiro momento, foram excluídos os artigos duplicados. A Tabela 1 ilustra esses procedimentos utilizados para a seleção do material.

Tabela 1 Percurso metodológico, baseado no protocolo Prisma 

Fonte: Elaboração própria

Os critérios de inclusão abrangeram estudos que explorassem o tema “modelos ou frameworks de curadoria de conteúdo digital”, haja vista que tais modelos representam construto bastante recente. Foram excluídos aqueles estudos que: (1) envolviam apenas curadoria de conteúdo digital; (2) o texto completo não estava disponível; (3) não tinham como objeto modelos ou frameworks de curadoria de conteúdo digital. Em seguida, os estudos foram eliminados por título e resumo. Os resumos condizentes com os critérios adotados (citados anteriormente) foram selecionados e incluídos nesta revisão crítica. Na sistematização e análise do material, foram lidos, na íntegra, os seis trabalhos científicos (Tabela 2) que contemplaram os critérios de inclusão, com enfoque na análise dos modelos propostos de curadoria de conteúdo digital. Na sistematização desses artigos, foi possível observar convergências entre artigos, autores e propostas de modelos.

Tabela 2 Bases de dados e trabalhos científicos encontrados e selecionados 

Fonte: Elaboração própria.

Para apoiar as análises desse estudo, recorremos ao software webQDA (Costa, 2016), que permitiu o tratamento dos dados coletados. Esse autor considera que, apesar de se apresentar de forma “vazia”, o software webQDA pode ser configurado de acordo com as necessidades do investigador. O programa não se direciona a um tipo específico de desenho de investigação, por isso permite explorar diferentes métodos e técnicas. Para o recorte deste artigo, utilizamos a ferramenta Fontes, a primeira ação do pesquisador com o webQDA. Essa área pode ser organizada de acordo com a necessidade de quem utiliza o software, por tipos de documentos, ou função de cada um. Neste estudo, as fontes utilizadas e organizadas para a constituição dos materiais de análise foram as referências bibliográficas encontradas nas bases de dados. Assim, com o apoio do webQDA, realizou-se um estudo bibliográfico qualitativo, exploratório, descritivo- interpretativo. Com o estudo exploratório, objetivou-se a análise de um problema de pesquisa pouco estudado para abordar o que ainda não havia sido discutido, tendo como propósito familiarizar-se com o fenômeno. Já com o estudo descritivo visou-se descrever como se manifesta um determinado acontecimento; neste caso, os modelos de curadoria digital (Minayo, 2013). As referências encontradas foram organizadas e, em seguida, importadas para o webQDA. O passo seguinte foi realizar uma análise para cruzar publicações, ano, autores e palavras-chave. Posteriormente, recorreu-se a uma funcionalidade do Sistema de Questionamento: “pesquisa de texto”, pelo qual se buscou identificar o conceito que fundamenta os “modelos de curadoria de conteúdo digital”. Embora o webQDA possua outras funcionalidades, no Sistema de Questionamento, apenas uma foi explorada.

3.Resultados e Discussão

Diferentes áreas do conhecimento definem e trabalham com o conceito de curadoria digital e de maneiras variadas. Para este trabalho, compreendemos, de modo geral, que a curadoria de conteúdo digital está relacionada ao ato de encontrar, reunir e disponibilizar conteúdos digitais que envolvam um determinado tema, de forma organizada. Desse modo, com o presente estudo, foram identificados e analisados seis trabalhos científicos, os quais estão articulados e apresentam concepções sobre curadoria de conteúdo digital, a partir do desenvolvimento de dois modelos teórico-metodológicos voltados à área do Ensino. O primeiro modelo parte dos estudos de Chagas (2018), Chagas, Linhares & Mota (2019) e Chagas, & Linhares (2020), e se complementam. Nesses estudos, a curadoria de conteúdos digitais foi utilizada como forma de autorizar os alunos a se tornarem protagonistas no processo de aprendizagem, com o objetivo de analisar as possibilidades pedagógicas do uso de tal curadoria como metodologia ativa na formação profissional de discentes e docentes/pesquisadores do curso de Comunicação Social: Publicidade e Propaganda de uma universidade privada. Nesse contexto, Chagas & Linhares (2020), com base em revisão de literatura, apresentam e descrevem cronologicamente modelos de curadoria de conteúdo digital, baseados em Curata (2011), Fernández (2012) e Archanco (2022), além de proporem um modelo de curadoria de conteúdo digital, fundamentados em Guallar & Leiva-Aguilera (2014), que possui característica cíclica e é organizado em seis fases: plano de curadoria; busca; seleção; contextualização; compartilhar; avaliar. A primeira fase refere-se ao plano de curadoria, momento no qual o curador realiza o planejamento da curadoria proposta, contemplando os seguintes aspectos: público-alvo; temática; objetivos; tipos e quantitativos de conteúdos curados; periodicidade de atualização desta curadoria. A segunda trata do início da busca por informação, por meio da definição das fontes de pesquisa, por exemplo, dos espaços virtuais (blog, site, rede social digital), sites de buscas, objetos digitais educacionais, entre outros conteúdos. Uma vez determinadas as fontes, tem-se a etapa da definição e refinamento dos termos de busca. A seleção, terceira fase, é o momento em que o curador realiza uma análise crítica dos materiais encontrados na segunda fase. Chagas (2018) recomenda que essa etapa envolva os docentes e/ou discentes a partir de uma análise crítica do curador. Após a busca e seleção dos conteúdos digitais, Chagas (2018) apresenta a quarta fase, que se refere à contextualização. Figueiredo (2016) traz contribuições importantes sobre o conceito da pedagogia do contexto de aprendizagem, relacionando diferentes contextos, estratégias pedagógicas e relações estabelecidas entre discente e/ou docente. Na quinta etapa, Chagas (2018) e Chagas & Linhares (2020) sugerem o compartilhamento, no qual o curador disponibiliza o conteúdo curado, como resultado das fases anteriores. O autor ainda sugere diferentes formas de compartilhamento, como nas redes sociais. Por fim, Chagas (2018) e Chagas & Linhares (2020) explicam a sexta fase, que se refere à avaliação da curadoria; à receptividade do compartilhamento do conteúdo digital, por meio de comentários e/ou interações nas redes sociais. Nesse processo, Chagas (2018) destaca a importância da definição de indicadores e/ou critérios, os quais auxiliarão no processo da avaliação e deverão estar interligados aos objetivos definidos no início da primeira fase, o plano de curadoria. O segundo modelo refere-se à proposta de Magnus (2018) e Bassani & Magnus (2020), e traz as reflexões sobre a curadoria de conteúdo digital para o contexto do Ensino Superior; nesse caso específico, o curso de Moda de uma universidade privada. O objetivo do estudo residiu em compreender como a curadoria de conteúdo digital pôde fomentar o desenvolvimento do ambiente pessoal de aprendizagem de alunos, possibilitando o exercício da autoria e a ampliação do engajamento na internet, por meio de uma proposta teórico-metodológica. Após análises de modelos relacionados à curadoria digital, como o Ciclo de Vida da Curadoria Digital, proposto pelo Digital Curation Centre (DCC, 2019), assim como o modelo de curadoria de conteúdo, elaborado por Kanter (2011) e Jarche (2022), Magnus (2018) observa que existem aproximações entre as visões dos autores consultados e seus respectivos modelos, a partir de três eixos principais: seleção da informação; criação; compartilhamento. A partir desses modelos, Magnus (2018) e Bassani & Magnus (2020) elaboraram uma proposta teórico-metodológica constituída pelas seguintes etapas: curadoria preliminar; significativa; consolidada, as quais são subdivididas em ações, objetivos, assim como em práticas e tecnologias digitais, que possibilitam personalização. A curadoria preliminar refere-se à primeira etapa, e indica colecionar texto, imagem, áudio e vídeo pelas seguintes ações: pesquisar, selecionar, organizar e compreender, no intuito de atingir os objetivos de formar intenção e estabelecer direção. Nesse primeiro momento, ocorre o delineamento da prática curatorial, na qual os “discentes são motivados a pesquisar diferentes fontes de pesquisa para a sua coleção, selecionando, organizando e compreendendo dados e informações, para que possam transformá-los em conhecimento” (Magnus, 2018, p. 110). A partir desse contexto, emergem diferentes possibilidades de práticas (p. ex.: brainstorming, mapa mental, mapa conceitual, mapa de polaridades) e diversas alternativas de utilizar as tecnologias digitais. Na segunda etapa, curadoria significativa, concebem-se os entregáveis, que podem ser considerados como produtos/serviços e/ou conteúdos, os quais estão relacionados à autoria. Ainda contém as seguintes ações: relacionar, remixar, criar e materializar, e prevê os seguintes objetivos: atribuir sentido e desenvolver ideia e/ou conteúdo. Assim, espera-se que sejam criados e materializados conteúdos digitais autorais, por intermédio de práticas que englobam a produção de apresentações (p. ex.: desenho, moodboard, podcast, sketchbook, vídeo, entre outras possibilidades). Da mesma forma, as tecnologias digitais deverão ser escolhidas a partir das necessidades do contexto (Magnus, 2018). Na terceira e última etapa, curadoria consolidada, almeja-se disseminar itens compartilháveis como links e arquivos, a partir de ações que envolvem: compartilhar, dialogar, engajar e monitorar. Os objetivos preveem: publicar conteúdo autoral e ampliar a rede pessoal de contatos. Segundo Magnus (2018) e Bassani, & Magnus (2020), essa consolidação da curadoria de conteúdo digital ocorrerá de fato pelo compartilhamento do conteúdo digital autoral criado pelos discentes. As práticas poderão ocorrer por meio da proposição de blogs, grupos de discussão, portfólios e/ou vídeo conferências, dentre algumas opções. Assim, para compartilhamento, engajamento e monitoramento de tais conteúdos digitais, as tecnologias digitais estão relacionadas às redes sociais, no entanto, também devem emergir das demandas do contexto. O terceiro e último modelo analisado refere-se a um estudo, desenvolvido por Albertson & Johnston (2021) sobre as percepções de professores do Ensino Fundamental e Ensino Médio quanto aos seus processos de busca de informações de diferentes conteúdos, no contexto da pesquisa de vídeo digital. Os resultados permitiram desenvolver um modelo que incorpora as percepções dos usuários (os professores) sobre a busca de informações, juntamente com construções de aprendizagem centradas no usuário, por meio da curadoria de conteúdo digital. Os autores compreendem o conceito de curadoria de conteúdo digital como um processo que agrega e enriquece grandes quantidades de informações digitais, ao organizá-las e apresentá-las em torno de determinados temas. O modelo de busca de imagens utilizado por Albertson & Johnston (2021) foi baseado em Pisciotta (2002), um dos estudos mais aprofundados sobre busca de informação visual. Deve-se considerar que, embora esse modelo de busca de imagens tenha sido desenvolvido especificamente em torno de um contexto visual, suas fases podem se alinhar com outras propostas de curadoria de conteúdo digital. Tal modelo está organizado a partir dos seguintes aspectos: iniciando; vasculhando; aplicando; selecionando; iterando; finalizando. A primeira fase - iniciando - refere-se ao processo de busca inicial de informações, a partir de alguma necessidade identificada. Nessa fase, o curador define/refina a necessidade com o objetivo de desenvolver um conjunto de critérios para avaliar a adequação da imagem, muitas vezes incorporando considerações relacionadas ao contexto de uso. Vale ressaltar que muitos critérios podem definir as necessidades visuais, incluindo qualidade (da imagem ou vídeo), formato, tamanho físico, tempo de download, audiência, características, aparência visual, restrições de direitos autorais, valor semântico, data, entre outros aspectos. Esses critérios são estabelecidos na fase inicial e usados para começar a formular estratégias de busca (Albertson & Johnston, 2021). Segundo Albertson & Johnston (2021), a segunda fase do modelo é o escopo, também denominada vasculhando, na qual o curador busca definir a abrangência da abordagem de busca. Alguns curadores poderão iniciar suas pesquisas utilizando termos gerais e critérios de pesquisa para receber um maior número de opções. Outros poderão ser mais específicos e adotarão uma abordagem restrita, usando termos de pesquisa mais precisos. Essa fase pode ocorrer continuamente ao longo de um processo de busca, pois possibilita modificações nos critérios de busca. Na terceira fase - aplicando - os curadores iniciam a interação com os recursos de informação, para procurar e recuperar imagens. Nesse momento, devem decidir o que e de que forma usar as informações. Essas escolhas são muitas vezes influenciadas pelo tempo, pelas despesas e pelo nível de experiência do curador, para encontrar imagens relevantes (Albertson & Johnston, 2021). De acordo com Albertson & Johnston (2021), após a pesquisa, na quarta fase - selecionando - um conjunto de resultados é retornado ao curador e, assim, ele tomará decisões sobre quais imagens selecionar. Esse processo poderá ocorrer em uma ou em várias fases, tendo em vista que o curador deverá selecionar os conteúdos a partir dos critérios estabelecidos. Ainda na perspectiva de Albertson & Johnston (2021), as pesquisas de informações visuais raramente envolvem apenas uma ação de pesquisa, pois geralmente incluem modificações nos critérios previamente estabelecidos. Essa fase é denominada - iterando -, ou seja, a reiteração da busca, a qual poderá ocorrer ao longo de mais de uma fase ou durante todo o processo. Dessa forma, os curadores podem modificar sua pesquisa ou redefinir o escopo da pesquisa para aumentar ou diminuir o número de resultados. Por fim, a última etapa - finalizando -, que trata do processo de encerramento da pesquisa e na qual o curador decide parar de pesquisar, com ou sem sucesso, as informações visuais. Essa fase pode ser encerrada de três formas: “exaustiva”, em que os curadores percebem que cobriram todas as opções disponíveis e acreditam ter a melhor maneira de pesquisar possível, ou, ainda, não encontraram itens adequados; “não exaustiva”, na qual o curador pesquisa apenas uma parte das imagens retornadas, mas termina a pesquisa com base no tempo ou na sensação de ter obtido os itens que considera suficientes; “não exaustiva - correspondência exata”, em que o curador encontra a imagem que satisfaz sua necessidade e, portanto, encerra a pesquisa sem ter que realizar nenhuma iteração adicional. Assim como nas outras fases do modelo de busca de imagens, a fase final também pode ser influenciada por vários fatores, como tempo, urgência, importância, natureza e facilidade de encontrar imagens (Albertson & Johnston, 2021). A partir dos modelos apresentados, observa-se que o primeiro, estudado por Chagas (2018), Chagas, Linhares & Mota (2019) e Chagas & Linhares (2020), a partir da proposta de Guallar & Leiva-Aguilera (2014), desdobra-se em seis fases detalhadas do processo de curadoria de conteúdo digital: plano de curadoria; busca; seleção; contextualização; compartilhamento; avaliação. O segundo modelo, proposto por Magnus (2018) e Bassani & Magnus (2020), apresenta três etapas, numa visão macro do processo - curadoria preliminar; curadoria significativa; curadoria consolidada -, as quais são desdobradas em ações, objetivos, práticas e tecnologias digitais e que contemplam aspectos mais específicos do primeiro modelo, além de prever o desenvolvimento de conteúdo, o que não se observa no primeiro modelo. Já o terceiro, proposto por Albertson & Johnston (2021), baseado em Pisciotta (2002), prevê seis fases de curadoria de conteúdo digital direcionadas à busca de informação visual: iniciando, vasculhando, aplicando, selecionando, iterando e finalizando. Após a análise das propostas, observam-se convergências e singularidas entre os modelos teórico- metodológicos. As convergências estão relacionadas à busca, seleção, organização e avaliação do conteúdo digital; já as singularidades referem-se ao planejamento da curadoria e à (re)criação de conteúdos digitais. Vale pontuar que, com essas análises, não se pretende que sejam a única forma de exercício da curadoria de conteúdo digital com ênfase na autoria e no protagonismo, mas, sim, que possam instigar os pesquisadores qualitativos a utilizar o potencial das tecnologias digitais a serviço do uso de CAQDAS, pois os artigos analisados não tratam especificamente de modelos de curadoria de conteúdo digital voltados para esses softwares.

4.Considerações Finais

A respeito das análises das propostas dos modelos teórico-metodológicos, segundo os desafios da curadoria de conteúdo digital, observa-se que há possibilidades de utilização no contexto de pesquisas qualitativas com o uso de CAQDAS. É assim que os modelos de curadoria digital, se bem explorados, podem facilitar o gerenciamento dos conteúdos em CAQDAS: o planejamento, a escolha, a (re)criação, a avaliação e o compartilhamento. Entretanto, quem deve decidir a curadoria de conteúdo digital é o pesquisador, a partir das problematizações sobre como, por que, o que, para que e a serviço do que se deve utilizar tais conteúdos digitais (Silva, 2013). A adoção da curadoria de conteúdo digital mostra-se em sinergia com as demandas atuais do processo de pesquisa qualitativa com uso de CAQDAS. Entretanto, esse processo poderá provocar questionamentos entre os pesquisadores, pois traz novas perspectivas e requer o repensar das formas de organizar o processo de pesquisa. Vale pontuar, ainda, que essa análise das propostas de modelos teórico- metodológicos encontrados na literatura refere-se a um estudo inicial sobre curadoria de conteúdo digital em CAQDAS e apresenta limitações, já que nossas considerações foram realizadas a partir das bases teóricas disponíveis nas bases SciELO, Scopus, Google Acadêmicos e BTD da Capes, usando o termo “curadoria de conteúdo digital” and “modelo”, em português, e “digital content curation” and “framework” em inglês. Por fim, vale salientar que não é pretensão deste trabalho encerrar as reflexões, mas contribuir com a construção do conhecimento acerca de tal temática. Como trabalhos futuros, recomenda-se promover uma nova revisão sistemática da literatura, com um volume maior de conteúdo científico, utilizando apenas bases de dados científicas internacionais, a fim de identificar outros modelos de curadoria de conteúdos digitais utilizados em investigações qualitativas e ampliar os níveis de análise.

5.Referências

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Recebido: 01 de Fevereiro de 2022; Aceito: 01 de Abril de 2022

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