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Political Observer

versión impresa ISSN 2795-4757versión On-line ISSN 2795-4765

Political Observer vol.18  Lisboa dic. 2022  Epub 22-Mayo-2023

https://doi.org/10.33167/2184-2078.rpcp2022.18/pp.9-14 

Editorial

Os Açores da Europa e do Atlântico

Cristina Montalvão Sarmento* 
http://orcid.org/0000-0002-8068-4478

Nuno Santos Lopes
http://orcid.org/0000-0001-8466-7379

1Observatório Político, Portugal;


A Revista Portuguesa de Ciência Política, cuja publicação se iniciou em 2010, vem-se afirmando no espaço global com a designação de Political Observer, designação imposta pelas necessidades de indexação internacional e pela pressão anglófona das mesmas. Tal desiderato não impede todavia que centremos a nossa atenção no espaço nacional, vocação primeira dos estudos políticos e que, sobre este espaço, se produzam reflexões específicas.

País europeu, Portugal tem uma dimensão arquipelágica que se revela nas ilhas atlânticas dos Açores e da Madeira. Estes arquipélagos, com as suas identidades próprias, têm no seu espaço particular uma especificidade que os distingue, o que à luz da geopolítica crítica pode ser entendido como um espaço geográfico que é representado e tem significado para os agentes políticos como parte de um projeto maior de acumulação, gestão e engrandecimento do poder (Wu, 2018).

Neste caso, escrever sobre os Açores é, portanto, sempre um desafio e uma responsabilidade. Recheada de episódios históricos, a realidade do arquipélago açoriano, nos tempos correntes, procura valorizar as suas potencialidades político-sociais e científico-tecnológicas, ancorada, inevitavelmente, no fator geoestratégico. Quer isto dizer que os Açores, inseridos na esfera portuguesa, permanecem entre a Europa e o mundo, pertencendo aos espaços europeu, entendido do ponto de vista continental e atlântico.

Se por um lado desde a descoberta e povoamento do arquipélago açoriano até meados do século XX aquele território se caracterizava como um ativo essencialmente atlântico, por outro lado, com a adesão de Portugal às Comunidades Europeias, os Açores abraçaram e têm vindo a fortalecer a sua posição junto da União Europeia no quadro da ultraperiferia. A relação de dualidade dos Açores entre o Atlântico e a União Europeia é, indubitavelmente, questão que merece particular atenção, dada a sua relevância no século XXI.

No âmbito do denominado sistema internacional, são as decisões humanas que modificam e remodelam constantemente os espaços onde as populações vivem, o que pode ser entendido a partir das perceções, das identidades e dos valores, o que transforma o espaço em dinâmico e complexo. As alterações sistémicas que o tempo transporta consigo podem ser melhor compreendidas, por isso, a partir dos seus agentes, atores principais e secundários, de uma realidade vivida. Desde logo agradecemos aos autores dos textos aqui recolhidos, de entre muitos dos construtores dessa verdade construída, que por essa via espelham a dinâmica e o processo político que lhes subjaz.

Deste modo, na primeira parte, a revista dá voz aos protagonistas efetivos, como o ilustra o debate sobre Autonomia dos Açores e da Madeira na Assembleia Constituinte, aqui descrito por um dos seus mais importantes promotores e responsáveis, João Bosco Mota Amaral, nesta denominada política em contexto. Os textos de Luís Andrade e Miguel Rocha enquadram respetivamente os Açores nas relações internacionais e na política externa portuguesa, três vetores fundamentais para compreender a posição interna e externa do arquipélago.

Na segunda parte, debatem-se as vantagens e os condicionalismos particulares da posição geográfica dos Açores que oscila entre a centralidade atlântica e a ultraperiferia europeia que Paulo Fontes, Nuno Lopes, Isabel Valente, Cristina Montalvão Sarmento e Tomé Ribeiro Gomes perspetivam sob vários ângulos a que os acontecimentos e a história não são estranhos.

No tocante às leituras sugeridas que as recensões críticas sempre trazem, estas são ilustradas por três obras publicadas em 2021 que mantêm os Açores no horizonte. Seja relembrando a presença francesa nos Açores, seja particularizando a ilha de Santa Maria nas Relações internacionais, seja revisitando a fotobiografia de João Bosco Mota Amaral, pelas penas sucessivamente de Mariana Borges, Henrique Fonseca e José Luís Brandão da Luz, que oferecem um panorama dos interesses regionais da atualidade.

É esta problemática que este número especial da Revista Portuguesa de Ciência Política, dedicado aos Açores, tenciona dar a conhecer à comunidade científica, assim como, e talvez mais importante, à sociedade civil. Os textos publicados neste número são o reflexo de uma região arquipelágica, insular e ultraperiférica que ousa posicionar-se, e destacar-se, num sistema internacional atribulado.

Sabiamente escreveu José Enes, primeiro reitor da Universidade dos Açores, que “a consideração geopolítica, porém, não atende somente à caracterização física do espaço. Parte dele, com certeza, procura descobri-lo através das várias óticas científicas e explora-as inventando e aplicando as múltiplas tecnologias, mas fá-lo na perspetiva do projeto político que sobre ele se organiza.” (2015, p. 122). Os Açores contemporâneos têm feito vingar este pensamento.

No âmbito das regras de uma publicação periódica, que assumimos ser, a edição de números especiais coloca diversos desafios: a abertura de chamadas de artigos especiais, a sua recolha, a prontidão da sua preparação e finalmente a necessidade da sua revisão por pares, que nestes casos se torna mais especializada. Importa referir que a produção deste número se deve ao facto real da imersão na vida quotidiana nas ilhas dos Açores de ambos os signatários, apoiados neste número especial pela Doutora Patrícia Oliveira, que connosco comunga da vontade de trazer à luz a realidade política através da investigação, que por isso não se afasta da criatividade que lhe está associada.

Pelo que, como é tradição, também a capa deste número se dedica à arte urbana, porquanto reflete posições, valores e uma certa identidade. A imagem da capa foi realizada e pode ser encontrada na Rua da Solidariedade, na freguesia da Lagoa, na ilha de São Miguel. Denominada pelo seu autor, Ricky Lee Gordon, “The Road of Solidarity”, foi preparada no âmbito do festival Walk&Talk, festival de artes promovido pela associação cultural sem fins lucrativos com o mesmo nome, fundada em 2011, aqui tratado e contextualizado por Patrícia Oliveira. O festival, apoiado pelas entidades de governo autónomo da Região, motiva a criação de objetos inéditos em diálogo com o território, e atua no envolvimento de comunidades locais e migrantes em torno do conhecimento gerado no campo expandido das artes, intersetando artes visuais, performance, música, arquitetura e design, que são parte integrante da dinâmica do político. Motivo pelo qual a associação faz parte do grupo de reflexão e trabalho Periferias Centrais; é um dos nove parceiros do programa Centriphery, vencedor do Creative Europe 2019-2022 da Comissão Europeia; e o Festival Walk&Talk é membro da EFFE - Europe for Festivals, Festivals for Europe.

Cristina Montalvão Sarmento

Nuno Santos Lopes

30 de dezembro de 2022

Referências

1. Enes J. (2015). Portugal Atlântico. Lajes do Pico: Companhia das Ilhas. [ Links ]

2. Wu Z. (2018). Classical geopolitics, realism and the balance of power theory. Journal of Strategic Studies, 41 (6), pp. 786-823. [ Links ]

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