1 Introdução
A pandemia ocasionada pelo Covid-19 apresenta quatro diferenças fundamentais em relação a outros eventos catastróficos ocorridos nos últimos anos que a tornam mais grave: intensidade, abrangência geográfica, duração e grau de incerteza, visto que o setor hoteleiro foi extremamente impactado pela pandemia (Hidalgo, Martín-Barroso, Nunez-Serrano, Turrion & Velazquez, 2022). Sabe-se que o setor do turismo ficou sem receita por quase um ano e com hotéis funcionando de forma quase programada nos poucos períodos em que o vírus se mostrou mais ameno, o setor teve queda nas vendas de cerca de 50%, de acordo com os dados da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa, 2020).
Nesse sentido, conforme afirma Ivanov, Webster, Stoilova & Slobodskoy (2020), para gerenciar uma crise torna-se necessário o fornecimento de tecnologia de automação às empresas relacionadas ao turismo a fim de mitigar os impactos negativos das ameaças de biossegurança em seu desempenho econômico, sobretudo no gerenciamento de receitas. Nesse contexto, identifica-se que a inovação poderá implementar decisões deliberadas feitas para melhorar a estratégia da empresa, explorando oportunidades de mercado e respondendo aos desafios do ambiente de negócios, o que poderá ajudar o setor econômico no período de pandemia e pós-pandemia quanto aos Meios de Hospedagem.
Nesse sentido, a capacidade de inovação poderá desempenhar um papel fundamental na recuperação de crises e tornar-se uma questão altamente atual à medida que as empresas se esforcem para lidar com a crise da saúde vivenciada em todos os setores, mas especialmente no setor hoteleiro (Breier, Kallmuenzer, Clauss, Gast, Kraus & Tiberius, 2021). Complementando com a ideia de Wooder e Baker (2012) e Ramos, (2021), a inovação tecnológica poderá ser uma combinação de inovações associada ao desenvolvimento de tecnologia com o objetivo de melhorar o produto e serviços existentes de forma incremental ou criando novos.
Assim, entende-se que o presente estudo é de interesse social por contribuir com investigações, discussões e ações referentes ao uso de novas tecnologias e estratégias no referido setor a fim de avaliar como estas influenciam o desempenho nos meios de hospedagem. Nesse sentido, tem-se por objetivo neste estudo discutir a relação entre a inovação tecnológica e o desempenho nos meios de hospedagem das regiões turísticas do Estado do Rio de Janeiro no contexto da pandemia da Covid-19.
2 Revisão de Literatura
2.1 O uso da inovação tecnológica como estratégia organizacional
A organização que apresenta a capacidade de inovar torna-se capaz de responder aos desafios de maneira mais rápida e explorar novos produtos e oportunidades de mercado de forma mais eficaz do que aquelas organizações consideradas não inovadoras. A capacidade de inovar em uma organização significa a capacidade de descobrir e introduzir novos produtos no mercado de maneira que se possa combinar estratégias com comportamentos e processos inovadores e atuar no mercado. Pode-se compreender a capacidade de inovar como um alinhamento das práticas de inovação com as práticas organizacionais, o que consequentemente transforma o conhecimento e aprendizagem em inovações radicais e incrementais (Welter, Sausen & Cappellari, 2019; Froehlich & Nodari, 2021).
A capacidade de inovação significa a capacidade de transformar continuamente conhecimento e ideias em novos produtos, processos e sistemas para o benefício da empresa e de seus stakeholders (Silva, 2021).
Compreende-se que a organização com capacidade de inovar baseia-se também em uma perspectiva de aquisição de novos conhecimentos desenvolvimentos de novas ideias e experiências dentro da organização e junto às suas equipes, ou seja, existem diferentes combinações de capacidades ou diferentes conjuntos específicos de conhecimentos, habilidades e rotinas que permitem que as organizações tornem-se capazes de desenvolver, transformar, adaptar e processar recursos, cujo objetivo é atingir metas de competitividade e de desempenho (Silva, 2021).
Baseado na ideia de Silva (2021), a capacidade de uma organização em inovar baseia-se em alguns fatores essenciais como a liderança transformadora, a intenção estratégica para inovar, o gerenciamento para a inovação, o conhecimento do cliente e do mercado, a gestão estratégica para o uso da tecnologia, a estrutura organizacional, o gerenciamento de projetos e o desempenho baseado na inovação, de forma que tais fatores possam contribuir para a geração de resultados para a organização e seus negócios (Silva, 2021).
A inovação tecnológica está relacionada a novas estratégias implementadas pelas organizações, o que requer novas estruturas organizacionais e mudanças para todos os membros envolvidos na equipe. Nesse sentido, para que ocorra a inovação tecnológica e um melhor desempenho da organização no mercado necessita de uma estrutura organizacional prévia e a capacidade de transformação frente a novos paradigmas (Oliveira & Avellar, 2020; Ramos, 2021).
Nesse sentido, a busca pelo melhor desempenho frente ao mercado e ao cliente poderá aumentar a capacidade da organização em inovar, de forma a aprimorar o processo de produção e permitir o desenvolvimento de novos produtos e serviços, práticas organizacionais e promover novos conhecimentos (OECD, 2018). Destaca-se aqui a inovação tecnológica, sendo esta uma combinação de inovações associada ao desenvolvimento de tecnologia, cujo objetivo é melhorar os produtos e os serviços existentes na organização de forma incremental ou criando novos produtos ou serviços para o mercado (Wooder & Baker, 2012).
2.2 A prática da inovação tecnológica nos meios de hospedagens
Com a revolução digital houve uma grande transformação na operação e na gestão hoteleira, onde as tecnologias digitais têm sido reconhecidas como as principais fontes de eficiência e vantagem competitiva no hotel. Nos últimos anos o setor hoteleiro obteve uma explosão de novas tecnologias e testemunharam como as tecnologias inovadoras remodelam a indústria hoteleira. Tecnologias digitais, como tecnologias de autoatendimento, robôs, blockchain, análise de big data, aplicativos móveis, mídia social e sistemas de informação, podem alterar a forma como os hotéis gerenciam suas gestões/operações como também seus stakehoders (Choi, Choi, Oh & Kim, 2020; Mingotto, Montaguti & Tamma, 2021; Ramos, 2021).
Os hotéis podem usar essas tecnologias para gerenciar serviços, pedidos e processos, porém demanda diferentes capacidades e recursos, relacionamento com o cliente e o fornecedor, alcançando um melhor desempenho em termos financeiros, vantagem competitiva, qualidade nos serviços, melhor utilização de recursos, flexibilidade e inovação em seus negócios (Ivanov et al., 2020; Lenuwat & Boon-itt, 2021).
Orfila-Sintes e Mattsson (2009) salientam que empresas hoteleiras mostram uma maior propensão em inovar através da introdução de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) incorporada em tecnologia (novos equipamentos e/ou software) e uma menor predisposição para realizar atividades internas de P&D. Baseado no estudo de Guisado-González, Guisado-Tato e Sandoval-Pérez (2013), perceberam que a inovação mais comum na hotelaria como estratégia é a aquisição de novas tecnologias através da compra de máquinas e equipamentos, seguido pela formação do pessoal envolvido na execução das atividades, a compra de tecnologia intangível e atividades de marketing relacionadas com a introdução de novos serviços.
Em suma, a inovação no setor hoteleiro é ilustrada na adoção de novas tecnologias e se traduz em vantagens competitivas, seja por eficiência produtiva, entendida como a redução de custos, ou uma maior capacidade de diferenciação através de melhorias nos serviços e sua maior adaptação às necessidades do cliente. Especificamente, a inovação neste setor está amplamente associada a avanços em tecnologias da informação (Nieves, 2017).
2.3 A influência do desempenho na estratégia organizacional
Desempenho ou performance organizacional é um conceito amplo e complexo em razão de diferentes empresas poderem ter indicadores de desempenho distintos, dependendo da natureza de suas estratégias. Deve-se considerar ainda que diferenças estruturais entre os vários mercados de atuação de uma empresa, seja local, regional ou internacional, podem conduzir a diferentes variáveis que podem determinar sua performance (Oliveira & Avellar, 2020; Ramos, 2021).
A estratégia pode ser definida como a forma para se pensar o futuro integrada ao processo decisório das organizações, assim como baseada em procedimentos formalizados e articulados pelos gestores (Eisenhardt & Santos, 2000).
Para que as organizações possam criar um ambiente organizacional inovador, espera-se que tenha um conjunto mínimo de capacidades criativas, de maneira que consiga executar suas atividades e gerar novas ideias de forma integrada com suas equipes (Silva, Arvela & Ramos, 2021).
Nesse contexto, o uso da tecnologia torna-se um recurso necessário para gerar e gerenciar atividades inovadoras em produtos, processos e organização da produção, sistemas organizacionais, equipamentos e engenharia de projetos. Os recursos estão incorporados nas habilidades, experiências e qualificações formais dos profissionais pertencentes às equipes, assim como, no sistema organizacional, rotinas e procedimentos da empresa (Silva, Arvela &Ramos, 2021).
Compreende-se que a utilização de recursos tecnológicos é "um critério de desempenho que avalia a eficiência com que os recursos são utilizados na prestação de serviços" (Cho et al., 2012, p. 807). Nos estudos de Jeong, Lee & Nagesvaran (2016) foram testados empiricamente os impactos do uso de dispositivos móveis na equipe de hotéis de luxo nos Estados Unidos pode-se encontrar uma associação positiva entre o uso de dispositivos móveis e o desempenho da equipe do hotel. Os autores argumentam que os dispositivos móveis permitem que a equipe do hotel execute tarefas relacionadas ao trabalho em qualquer local com eficiência.
Seguindo os estudos de Cho et al. (2012), as dimensões de desempenho do hotel podem ser categorizadas como desempenho financeiro, competitividade, qualidade do serviço, utilização de recursos, flexibilidade e inovação. Em estudos realizados na Malásia, Ahmad e Scott (2019) constataram que, além da redução de custos, os recursos tecnológicos podem influenciar positivamente o desempenho financeiro dos hotéis, fornecendo informações para que os gestores tomem melhores decisões e proporcionando aos colaboradores mais tempo para focar em funções estratégicas e ser mais proativo no planejamento.
Baseado em estudos de Garrido-Moreno, García-Morales, King & Lockett (2020) realizados em hotéis na Espanha, estes descobriram que o uso de mídias sociais tem uma influência positiva no desempenho do hotel, aprimorando os recursos de engajamento do cliente e o gerenciamento de relacionamento com o cliente social, citando aqui como ferramenta o uso do CRM (Customer Relationship Management) como forma de melhorar o seu relacionamento com o cliente. Em outro estudo citado por Palácios-Marqués, Merigó & Soto-Acosta (2015) sobre hotéis quatro e cinco estrelas na Espanha, apresentam também que o uso de mídias sociais gera maior desempenho e maior capacidade de inovação no setor hoteleiro.
Além disso, Garrido-Moreno et al., (2020) citam ainda em seu estudo que os hotéis podem sim reduzir os custos das atividades de marketing e se comunicar diretamente com os clientes utilizando plataformas de mídia social que podem reduzir custos, gerar aumento na imagem da marca e crescimento de vendas, ou seja, o uso de mídias sociais poderá gerar o aumento da capacidade de inovação dos hotéis, o que também permite entender e antecipar os desejos e necessidades dos clientes.
De acordo com Ivanov et al. (2020), os custos operacionais podem ser reduzidos de maneira que permita que os profissionais atuantes nos hotéis possam ter um desempenho mais eficiente e eficaz. O uso dos robôs, por exemplo, pode gerar receita adicional ao fornecer serviços adicionais, permitindo que os hotéis ofereçam aos clientes experiências robóticas e diferenciadas, assim como possam liberar os colaboradores para executar demais atividades de valor agregado. Além disso, o uso das tecnologias de autoatendimento também pode reduzir os custos de mão de obra. No entanto, embora os robôs e as tecnologias de autoatendimento possam reduzir os custos operacionais dos hotéis, eles devem ser usados com cautela devido à importância do atendimento personalizado, interação e emoção no setor hoteleiro.
Salienta-se que os comentários online dos clientes são importantes para a gestão da qualidade e os hotéis podem melhorar a qualidade dos serviços com base nas avaliações publicadas, visto que sistemas inteligentes, aplicativos móveis, robôs e tecnologias de autoatendimento tendem a aprimorar a experiência do cliente (Leung, 2019; Silva, Arvela & Ramos, 2021). Assim como, os autores apontam que o uso das ferramentas tecnológicas facilita as reservas de serviços, como spa, restaurante e reservas de quartos, oferece controle de tecnologia no quarto (luzes, TV, termostatos), fornece serviços pessoais em tempo real, como coleta de roupas e serviços de limpeza, ou outros pedidos especiais que os clientes possam solicitar (Lei, Wang & Law, 2019).
Sabe-se que no período de pandemia da COVID-19 as tecnologias demonstraram desempenhar um papel importante na superação dos desafios trazidos à tona pela pandemia, por exemplo, devido ao COVID-19, as pessoas preferiram experiências menos arriscadas e a realidade virtual permitiu que os clientes avaliassem os riscos antes de realizarem suas reservas (Schiopu, Hornoiu, Padurean & Nica, 2021). No entanto, a análise das estratégias de gestão hoteleira e suas implicações no desempenho tornou-se uma questão urgente à luz da crise global derivada da pandemia do COVID-19 (Marco-Lajara et al, 2021).
Entende-se que quando se busca melhorar o desempenho da empresa, aumentará a capacidade de inovar, assim como estará aprimorando o processo de produção e permitindo o desenvolvimento de novos produtos e práticas organizacionais, o que consequentemente também fará aumentar a capacidade da empresa em adquirir e criar novos conhecimentos (OECD, 2018).
3 Metodologia
A metodologia proposta nesta pesquisa caracteriza-se como um estudo quantitativo, utilizando-se como instrumento para coleta de dados o questionário, permitindo trazer para o estudo um caráter exploratório e descritivo. Na primeira etapa da pesquisa, se estendendo por todo o período de sua realização, foram feitos levantamentos bibliográficos que tratam da temática da inovação tecnológica e desempenho. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica para estruturar a fundamentação teórica, a fim de adotar artigos nacionais e internacionais, pesquisados em Bases de Dados como EBSCO, Web Of Science, SCIELO, Portal da Capes e Scientific Periodicals Eletronic Library (SPELL).
A abrangência proposta para a investigação teve como universo os Meios de Hospedagem das regiões turísticas do Estado do Rio de Janeiro, como forma de analisar a inovação tecnológica adotada no período de pandemia da Covid-19. A segunda etapa da pesquisa envolveu a elaboração do material de coleta de dados, a realização de pré-teste e aplicação do questionário aos gestores dos Meios de Hospedagem, sendo hoteis, pousadas, hostel/albergues, resorts, entre outros do Estado do Rio de Janeiro, conforme tabela 1 representando as regiões pesquisadas.
Regiões | Universo | % | Entrevistas |
---|---|---|---|
Metropolitana | 281 | 14,4 | 43 |
Agulhas Negras | 56 | 2,9 | 9 |
Baixada Fluminense | 16 | 0,8 | 2 |
Caminhos da Mata | 8 | 0,4 | 1 |
Costa Doce | 14 | 0,7 | 2 |
Costa do Sol - Região dos Lagos | 865 | 44,4 | 134 |
Costa Verde | 443 | 22,7 | 68 |
Noroeste das Águas | 16 | 0,8 | 2 |
Serra Norte | 19 | 1,0 | 3 |
Serra Verde Imperial | 153 | 7,8 | 24 |
Vale do Café | 79 | 4,1 | 12 |
TOTAL | 1.950 | 100,0 | 300 |
Fonte: Dados primários (2023).
A população alvo deste estudo foi constituída por gestores localizados nas diferentes regiões do Estado do Rio de Janeiro, conforme descrito no quadro. Inicialmente foi feito um mapeamento do total de Meios de Hospedagem no CADASTUR-RJ que é o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos, do Ministério do Turismo (MT), sendo definido, no site do MT, como cadastro de pessoas físicas e jurídicas que atuam no setor turístico, sendo obrigatório para Meios de Hospedagem, Agências de Turismo, Transportadoras Turísticas, Organizadoras de Eventos, Parques Temáticos, Acampamentos Turísticos e Guias de Turismo-MEI.
A opção por investigar o Estado como um todo tem o objetivo de perceber como há predomínio da adoção de determinado modelo de inovação tecnológica em alguma região e se essas ferramentas podem ser aplicadas por regiões que não as adotem.
Quanto ao plano amostral, o universo correspondia a 1.950 participantes, sendo o número total de entrevistas 300 gestores, com margem de erro para cada público de ± 5,2% e coeficiente de confiança de ± 95%. As entrevistas ocorreram por telefone e foram realizadas entre 11 de janeiro a 06 de fevereiro de 2023, por agentes pesquisadores com treinamento específico para esta tarefa. Salienta-se que foram realizados os pré-testes com 30 Meios de Hospedagens e não havendo alteração no instrumento foi dada continuidade.
Por meio dos questionários respondidos pôde-se dar início ao tratamento e análise dos dados, utilizando-se primeiramente planilhas eletrônicas para organizar os dados coletados. Nesse caso, o software Excel pôde auxiliar na organização dos dados coletados e na sequência houve a importação dos dados para o software estatístico SPSS Statistics versão 21.
Nesta pesquisa optou-se pela Análise Fatorial Exploratória para a análise estatística dos dados, buscando-se a redução de um determinado número de variáveis. Entende-se que a Análise Fatorial Exploratória (AFE) gera fatores e a Análise de Componentes Principais (ACP) gera componentes, sendo que a diferença entre fatores e componentes está relacionada à forma como os itens são retidos. As duas técnicas de redução de dados, partem do pressuposto de que cada item do questionário tem 3 tipos de variâncias, sendo elas: a específica, a comum e a de erro.
No caso desta análise, primeiramente foi feita uma Análise Fatorial Exploratória, partindo de como foi elaborado e aplicado o questionário de 18 perguntas distribuídas em 2 blocos, sendo eles a Capacidade de Inovação (Bloco 1) e o Desempenho (Bloco 2), além de 4 perguntas referentes à caracterização dos Meios de Hospedagens. Esta é uma análise utilizada como uma etapa na criação e validação dos dados, sendo ela muito mais teórica que matemática. Salienta-se que analisando a estatística descritiva, todas as questões foram respondidas por todos os entrevistados (300) e não houve omissão nas respostas.
O instrumento para mensurar capacidade de inovação foi baseado nos modelos de Gallouj (2002) e Jimenez-Jimenez & Sanz-Vale (2011), baseado em seus artigos e posterior tradução dos respectivos instrumentos, e para o desempenho, foi baseado nos modelos de Zou, Taylor & Osland (1998), conforme quadro 1.
Quadro 1: Dimensões e variáveis investigadas para capacidade de inovação e desempenho
Foi realizado o teste KMO para avaliar a adequação do tamanho da amostra, sendo que a variação desse índice vai de 0 a 1, sendo que zero é inadequado para a análise fatorial, sendo aceitável se for maior que 0,5 e recomendado acima de 0,8. Foi realizado o Teste de esfericidade sendo este um teste estatístico para verificação da presença de correlação entre as variáveis, sendo que irá medir a adequação da análise, devendo-se assim encontrar um p-valor (Sig) abaixo de 0,05.
As comunalidades ou Cos2, são quantidades das variâncias (correlações) de cada variável explicada pelos fatores, visto que quanto maior a comunalidade, maior será o poder de explicação daquela variável pelo fator. Cos2 é uma medida que indica a qualidade da representação para variáveis. A comunalidade é a soma dos quadrados das correlações entre cada variável e a componente principal. As comunalidades são quantidades das variâncias (correlações) de cada variável explicada pelos fatores. Salienta-se que quanto maior a comunalidade, maior será o poder de explicação daquela variável pelo fator. Nesse caso, deseja-se comunalidades superiores a 0.5, ou seja, superiores a 50%.
4 Resultados e Discussão
Nesse momento serão descritos os dados dos Meios de Hospedagens pesquisados, sendo o total de respondentes 300 empresas em regiões do Estado do Rio de Janeiro, no período entre 11 de janeiro a 06 de fevereiro de 2023, realizadas por agentes pesquisadores com treinamento específico e por telefone.
Dos Meios de Hospedagens pesquisados, 134 (44,7%) estão localizadas na Costa do Sol - Região dos Lagos, 68 (22,7%) na Costa Verde, 43 (14,3%) na Região Metropolitana, 24 (8%) na Região da Serra Verde Imperial, 12 (4%) na Região do Vale do Café, 9 (3%) na Região de Agulhas Negras, 3 (1%) na Região da Serra Norte, 2 (0,7%) na Região da Baixada Fluminense, 2 (0,7%) na Região da Costa Doce, 2 (0,7%) na Região do Noroeste das Águas, e 1 (0,3%) na Região de Caminhos da Mata.
Quanto à classificação dos Meios de Hospedagens pesquisados, identifica-se que 105 (35%) são classificados como Hotel, 159 (53%) são pousadas, 6 (2%) são classificados como Hotel Fazenda, 2 (0,7%) são Resorts e 28 (9,3%) são classificados como Hostel ou Albergue. Salienta-se que 33% dos Meios de Hospedagens fazem parte de uma rede hoteleira e 67% não pertencem à rede hoteleira.
Quanto ao porte dos Meios de Hospedagens, identifica-se que em empresas consideradas de pequeno porte (até 100 unidades habitacionais) predominam as Pousadas (58,7%), de médio porte (de 101 até 399 unidades habitacionais) e de grande porte (mais de 400 unidades habitacionais), predominam os hotéis, 87,5% e 75%, respectivamente.
Na sequência, a análise fatorial exploratória foi realizada para identificar se as discussões e ações referentes ao uso das novas tecnologias e estratégias nos meios de hospedagem influenciam o desempenho nos meios de hospedagem. Os itens que compõem as variáveis se agrupam nos aspectos abordados e se necessário pode-se reduzir o número de itens que compõem cada aspecto. Seguindo o critério indicado por Hair et al. (2005) foram considerados em cada fator os itens com coeficientes de carga fatorial acima de 0,5, obedecendo também os critérios de variância explicada já descritos na metodologia.
Observa-se que no teste de KMO foi encontrado o valor 0,86, sendo um indicador que demonstra que a amostra está adequada para a realização da análise fatorial. Caso esse índice fosse abaixo de 0,5 o estudo não seria feito, sendo que pelo teste de esfericidade de Bartlett, a matriz possui esfericidade se a Significância for abaixo de 0,05.
Foi gerada a Matriz de Correlações, sendo que a matriz gerada possui Determinante = 0,001. Na sua diagonal todos os valores obtidos são iguais a um, verificando-se que acima do eixo diagonal que contém seus valores espelhados com os valores abaixo da diagonal central. Conforme descrito na metodologia o questionário elaborado e aplicado foi distribuído em dois blocos sendo eles a Capacidade de Inovação (Bloco 1) e o Desempenho Geral (Bloco 2). Os resultados da análise fatorial destes serão discutidos a seguir.
4.1 Análise fatorial da Inovação Tecnológica
No bloco da Inovação Tecnológica houve alterações das variáveis das questões sinalizadas na construção do questionário. As questões 20, 21 e 22 que anteriormente eram do bloco do desempenho vieram para o bloco da inovação tecnológica. Também se destaca que as questões 5 e 6 foram descartadas pois não tiveram significância. A Tabela 2, é composta pelas comunalidades e as cargas fatoriais dos itens que compõem o fator extraído, o total de variância explicada pelos itens componentes de cada fator, bem como o valor de KMO.
Questões do instrumento | Comunalidade | Carga Fatorial |
---|---|---|
Questão 13 | 0,543 | 0,784 |
Questão 11 | 0,524 | 0,752 |
Questão 10 | 0,500 | 0,725 |
Questão 14 | 0,422 | 0,665 |
Questão 21 | 0,738 | 0,599 |
Questão 22 | 0,687 | 0,578 |
Questão 20 | 0,559 | 0,556 |
Variância Explicada | 32,62% | |
KMO | 0,861 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Verifica-se que os resultados alcançados pela comunalidade, carga fatorial, variância explicada e KMO demonstraram que todas as variáveis obtiveram carga fatorial adequada. As comunalidades das variáveis obtiveram seus resultados acima de 0,5, exceto na questão 14, porém a carga fatorial da questão está alta, o que sinaliza uma maior correlação.
As cargas fatoriais foram extraídas acima de 0,5, porém houve questões que não se agruparam com as outras variáveis, o que sinaliza a falta de importância que os entrevistados dão a elas, sendo uma variável que poderia ser mais bem trabalhada na hotelaria. A variância total explicada demonstra que este constructo está sendo explicado em 32,62%, atendendo ao critério de Hair et al. (2005), e o teste de KMO foi de 0,86, o que demonstra a adequação da amostra.
Observa-se que o fator da capacidade de inovação corrobora com os estudos de Guisado-González, Guisado-Tato & Sandoval-Pérez (2013), que perceberam que a inovação mais comum na hotelaria como estratégia é a aquisição de novas tecnologias através da compra de máquinas e equipamentos, seguido pela formação do pessoal envolvido na execução das atividades, a compra de tecnologia intangível e atividades de marketing relacionadas com a introdução de novos serviços. Verifica-se que a inovação neste setor está amplamente associada a avanços em tecnologias da informação (Orfila-Sintes & Mattsson, 2009; Fernández, Cala & Domecq, 2011; Nieves, 2017).
Como já citado anteriormente, as tecnologias digitais, como as tecnologias de autoatendimento, robôs, blockchain, análise de big data, aplicativos móveis, mídia social e sistemas de informação, surgem para alterar a maneira como os hotéis gerenciam suas operações. E para que ocorra a inovação tecnológica e consequentemente um melhor desempenho das organizações no mercado demanda diferentes capacidades e recursos, relacionamento com o cliente e o fornecedor. Dessa forma, torna-se possível alcançar um melhor desempenho em termos financeiros, vantagem competitiva, qualidade nos serviços, melhor utilização de recursos, flexibilidade e inovação em seus negócios (Cho et al., 2012; Ivanov et al., 2020; Oliveira & Avellar, 2020, Anser et al., 2020; Choi et al., 2020; Mingotto, Montaguti, & Tamma, 2021; Lenuwat & Boon-itt, 2021).
4.2 Análise fatorial do desempenho
Quanto ao bloco de desempenho, também houve alterações das variáveis das questões sinalizadas na construção do questionário. As questões 7, 8, 15 e 12, que anteriormente eram do bloco da inovação tecnológica, vieram para o bloco do desempenho. A tabela 3, é composta pelas comunalidades, as cargas fatoriais dos itens que compõem o fator extraído, o total de variância explicada pelos itens componentes de cada fator, bem como o valor de KMO.
Questões do instrumento | Comunalidade | Carga Fatorial |
---|---|---|
Questão 7 | 0,449 | 0,673 |
Questão 8 | 0,446 | 0,643 |
Questão 19 | 0,589 | 0,603 |
Questão 17 | 0,414 | 0,543 |
Questão 15 | 0,312 | 0,533 |
Questão 12 | 0,244 | 0,517 |
Variância Explicada | 9,20% | |
KMO | 0,861 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Observa-se que os resultados alcançados pela comunalidade, carga fatorial, variância explicada e KMO demonstraram que todas as variáveis obtiveram carga fatorial adequada. Nem todas as comunalidades das variáveis obtiveram seus resultados acima de 0,5, no entanto, Stevens (1992) sinaliza que com um número menor do que 20 variáveis podem-se ter comunalidades baixas (< 0,4).
As cargas fatoriais foram extraídas acima de 0,5, o que sinaliza que os entrevistados dão importância a essas variáveis. A variância total explicada demonstra que este constructo está sendo explicado em 9,20%, atendendo ao critério de Hair et al. (2005), e o teste de KMO foi de 0,86, o que demonstra a adequação da amostra.
Verifica-se que o fator de desempenho corrobora com o estudo de Ivanov et al. (2020), que sinaliza que os custos operacionais podem ser reduzidos de maneira que permita que os profissionais atuantes nos hotéis possam ter um desempenho mais eficiente e eficaz. Já no estudo de Ahmad e Scott (2019), estes sinalizam que os recursos tecnológicos podem influenciar positivamente o desempenho financeiro dos hotéis, fornecendo informações para que os gestores tomem melhores decisões e proporcionando aos colaboradores mais tempo para focar em funções estratégicas e ser mais proativo no planejamento.
Já foi citado neste estudo que o uso das tecnologias se torna também um critério de desempenho capaz de avaliar a eficiência com que os recursos são utilizados na prestação dos serviços nos hotéis. Pode-se citar como exemplo o impacto sobre o uso de dispositivos móveis nos hotéis, visto que os dispositivos móveis permitem que a equipe do hotel execute tarefas relacionadas ao trabalho em qualquer local com maior eficiência. Dessa forma, as dimensões de desempenho em um hotel poderão ser categorizadas como desempenho financeiro, competitividade, qualidade do serviço, utilização de recursos, flexibilidade e inovação (Cho et al., 2012; Jeong, Lee & Nagesvaran, 2016).
Nesse contexto, compreende-se que quando se busca melhorar o desempenho dos hotéis, estará aumentando a capacidade de inovar, aprimorando o processo de produção e permitindo o desenvolvimento de novos produtos e práticas organizacionais (OECD, 2018).
5 Conclusões
Este artigo teve como objetivo discutir a relação entre a inovação tecnológica e o desempenho nos Meios de Hospedagens das regiões turísticas do Estado do Rio de Janeiro no contexto da pandemia da Covid-19.
Com base nos resultados foi possível perceber, na perspectiva dos respondentes, que a adoção de novas ideias, tecnologias ou processos melhorou o posicionamento estratégico e a competitividade no mercado, bem como, aumentou a participação de mercado, a produtividade, vendas para novos clientes com o uso de OTA's (Agências de Viagens Online). Vale ressaltar ainda que houve um reconhecimento de que o contexto gerado pela pandemia impulsionou a implementação de inovações tecnológicas.
Foram apontados que são desenvolvidas habilidades para adotar novas ideias, tecnologias ou processos para oferecer produtos e serviços antes dos concorrentes, sendo oferecidos programas formais de treinamento e qualificação para seus colaboradores. Quanto ao uso de novas ferramentas tecnológicas, os colaboradores são estimulados para a criatividade e a inovação quanto ao uso de novas ferramentas tecnológicas.
Foram citadas como principais ferramentas tecnológicas adotadas nos últimos dois anos, respectivamente: WhastApp, Booking, Instagram, Facebook, Site da organização, Sistema/Programas/Motor de reservas, Check-in/out online, Email, TripAdvisor, Hoteis.com, QR Code, Airbnb, Expedia, Decolar, PIX e 123 milhas, que não eram utilizadas de forma significativa antes da pandemia.
Vale ressaltar que há diferenças significativas entre as regiões turísticas do Estado do Rio de Janeiro, onde em determinadas regiões como a Metropolitana predominam hotéis e em outras regiões como a Costa Verde e a Costa do Sol - Região dos Lagos, onde predominam as pousadas, por se tratar de regiões voltadas ao turismo de praia e sol onde há uma forte presença de pessoas que residem no próprio Estado e que muitas vezes buscam acomodações com custo mais baixo. Baseado nessa percepção, sugere-se para estudos futuros uma análise mais aprofundada por regiões a partir de um olhar mais criterioso e individualizado.
A pandemia de Covid-19 impactou de forma significativa os Meios de Hospedagens do Estado do Rio de Janeiro tendo sido de extrema importância a adoção de novas tecnologias, principalmente aquelas voltadas aos processos comunicacionais, operacionais e sanitários. Como já demonstrado em estudos anteriores, algumas destas inovações cumpriram seu papel em um determinado momento, mas outras vieram para ficar, pois permitem aos Meios de Hospedagens se conectar com novas realidades, dinâmicas e entender melhor novos hábitos, práticas e visões dos hóspedes pós pandemia. Porém, recomenda-se que os Meios de Hospedagens ao fortalecer e ampliar o uso das tecnologias preservem a humanização da relação com seus hóspedes, pois ainda que a inovação tecnológica tenha facilitado a comunicação e a gestão dos processos, os hóspedes ainda valorizam o contato pessoal.