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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  n.29 Lisboa mar. 2011

 

Brasil: relações internacionais com os Estados Unidos e a América do Sul*

 

Clóvis Brigagão1

Cientista político, director do Centro de Estudos das Américas e coordenador da Escola Sérgio Vieira de Mello – EPAZ, Instituto de Humanidades, Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro.

 

RESUMO

O artigo analisa a política externa do Brasil, centrando-se nas relações com os Estados Unidos e com a América do Sul. São ainda desenvolvidos os três pilares da nova política externa brasileira: a democracia (em que os interesses nacionais se tornam mais transparentes e surgem novos actores nos negócios internacionais do Brasil), a integração regional (que começa com o Mercosul, segue com os novos processos de integração física e culmina, actualmente com a Unasul) e sua relação de interdependência com a globalização (reflectida no desempenho económico do país).

Palavras-chave: Política externa brasileira, Estados Unidos, América do Sul, integração regional

 

Brazil: international relations with the United States and South America

ABSTRACT

This article analyses Brazilian foreign policy focusing on relations with the United States of America and South America. It develops the three pillars of the new foreign policy of Brazil: democracy (where national interests become more transparent and new actors emerge in the international relations of Brazil), regional integration (that starts with Mercosul, follows with the new processes of physical integration and ends, currently, with Unasul) and its relation of interdependence with globalization (reflected in the economic outputs of the country).

Keywords: Brazilian foreign policy, United States, South America, regional integration

 

RELAÇÕES GLOBAIS

Conhece-se o Brasil pelas palavras inscritas em seu hino nacional: «deitado eterna-mente em berço esplêndido, ao som do mar e à luz do céu profundo». A realidade do mundo mudou e revela-se em outro tom de inserção internacional para o Brasil. Entramos no século XXI em ritmo de maior dinamismo e amplitude, mas guardando ainda, infelizmente, fortes traços de atraso social (principalmente na educação) e gargalos (e custos) de infra-estrutura. Durante a década de 1990 a política externa brasileira se diferencia das políticas vizinhas, como a da Argentina e do Chile, bem como de suas inclinações ou distanciamentos dos interesses dos Estados Unidos. O Brasil passa a adotar idéias próprias sobre as mudanças no cenário internacional, resultantes do fim da Guerra Fria e da intensa globalização. Três são os pilares da nova política externa brasileira: a democracia reconquistada, a integração regional e sua relação de interdependência com a globalização.

Primeiramente, com a democratização do país os interesses nacionais tornam-se transparentes, novos atores surgem no cenário dos negócios internacionais brasileiros e passamos a administrar ampla diversidade de temas. Segundo, pelo processo de integração regional, que começa com o Mercosul e segue com os novos processos de integração física (serviços de comunicação, transportes e energia) e agora com o foro político da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Terceiro, o Brasil vai alcançar significativos desempenhos econômicos, principalmente, ao passar pela atual crise financeira mundial, sem maiores percalços ao contrário da União Européia, do Japão e dos Estados Unidos.

 

NOVO MAPA DA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

A política externa projeta identidades culturais, aspirações econômicas, poder e capacidades nacionais, tanto as mais tradicionais (tamanho de território, demografia, recursos naturais e humanos, cultura e nível educacional e PIB) como as atuais (Ciência e Tecnologia e Pesquisa & Desenvolvimento & Inovação). Nesse caso, a política externa brasileira – que completa quase dois séculos de atividades – sempre se projetou de acordo com princípios e valores de sua sociedade, que permanecem por toda a vida histórica do país: A Política Externa Brasileira prescreve a não-intervenção em assuntos soberanos de outros países, a resolução de conflitos por meio pacíficos e a autodeterminação dos povos.

No mundo das interdependências, os planos internos e externos tornam-se inseparáveis, através do conhecimento em torno das revoluções tecnológicas, que definem, em larga medida, a avaliação do poder internacional. Da mesma forma como os parâmetros de avaliação mudaram de acordo com os novos contornos da globalização e com a crescente diluição das fronteiras nacionais, os atores de inserção de um país também se modificam. No Brasil, a competência constitucional do Itamaraty e seu legado histórico e profissional prevalecem. Com o fim da Guerra Fria e do regime militar autoritário, o mundo se insere dentro do país, e o país começa a dar sinais de caminhar em direção ao mundo: é a relação do inserido e do inserado, dinâmica e com mão dupla. Esse processo faz com que a política externa seja também conjugada com novos atores em várias dimensões (ordens, foros, agendas, etc.). São ministérios que defendem interesses setoriais e específicos, como o Ministério da Fazenda, o da Indústria e Comércio, o da Agricultura, o da Ciência e Tecnologia, etc., além de agências e empresas públicas (como Petrobras, Embrapa, Fio Cruz, etc.). Os atores do regime federalista trinário, que, além da União, tem os 27 estados e mais de 5500 municípios desempenham ações e políticas federativas que reforçam a inserção brasileira nos negócios internacionais. Aumenta a participação do mundo corporativo na esfera internacional: confederações, federações, conselhos, associações, sindicatos patronais e centrais sindicais, que representam interesses da indústria, do comércio e dos serviços na nova inserção internacional do Brasil. Nas últimas décadas, multinacionais brasileiras (públicas e privadas) atuam com sua diplomacia empresarial e servem como peças no intricado jogo da inserção internacional do país.

 

 

A política externa brasileira, embora tenha permanecido sob a égide dos mesmos princípios inaugurais, desde a Independência aos dias atuais, passou por mudanças significativas nas últimas décadas do século XX e no início do século XXI. Essa dupla inserção possibilitou a nova tônica da Diplomacia de Negócios desenvolvida pelo Governo Lula desde 20022. Na nova inserção, mais dinâmica e até mesmo mais altiva – o que não exclui sintomas de dificuldades e até derrotas – observa-se o país assumindo mais riscos, com base na confiabilidade econômica de seus recursos naturais, industriais e de serviços, em sua maior interação dos agentes públicos e privados, bem como em sua estabilidade política democrática.

As grandes iniciativas da política externa brasileira trazem a noção de que agora o país está preparado para ser ator mais relevante, e mais atento, em busca de seus benefícios internacionais. Essa é a condição de estabelecer políticas que traduzem interesses estratégicos. Abandona-se a condição de estar satisfeito com o seu espaço e mercado internos para lançar-se à conquista de novas oportunidades internacionais: é o trajeto que vai da tradição indispensável de qualquer Estado ter sua política externa, para a conjunção de fatores e políticas estratégicas fundadoras de uma desafiante política internacional. O Brasil caminha para eliminar a percepção enraizada que tem de si próprio, de um acanhamento secular, agradando muitos e incomodando poucos. Esse movimento, se não de todo o país, torna-se cada vez mais o de amplos e dinâmicos setores com expectativas de colher os frutos – algumas vezes amargos –da internacionalização.

O Brasil é chamado – e parece decidido a participar – para ser um ator relevante, de global player para global actor. Deixar de ser um país carona para assumir posições de responsabilidades e mesmo de liderança. Isso se deve ao conhecido compromisso do Brasil com os princípios da ONU, em termos de promoção da paz e da segurança internacional, assim como a posição brasileira contrária à corrida armamentista e à proliferação das armas de destruição em massa.

Após a reinstalação do regime democrático, o país aderiu a todos os mecanismos e regimes internacionais e regionais de não proliferação e passou a ser ator importante na dimensão da segurança internacional3. Alguns fatores colaboraram para que o país assumisse com maior vigor suas responsabilidades: (i) poder e liderança regional; (ii) peso relativo, mas com significativo destaque, na arena internacional; e (iii) política externa mais transparente e democrática, além de ser mais representativa da própria sociedade, ao mesmo tempo que o Congresso participa e decide mais sobre os destinos do país.

Na questão nuclear, o Brasil pretende, desde a afirmação em sua Carta Magna, assumir o papel de potência emergente para fins exclusivamente pacíficos: conforme artigo 21.º da Constituição de 1988, claramente opta seu programa nuclear para fins pacíficos, proibindo qualquer desenvolvimento de arma nuclear. Um marco de grande significado é a relação de confiança mútua criada entre Brasil e Argentina na questão bilateral de integração e verificação de seus programas de energia nuclear para fins pacíficos. Para administrar essa política bilateral de confiança mútua foi criada (1991) a Agência Brasileiro-Argentina de Controle de Materiais Nucleares (Abacc), de natureza jurídica internacional e composta por técnicos argentinos e brasileiros: aqueles fiscalizam instalações e materiais nucleares do Brasil e os técnicos brasileiros verificam tudo o que é nuclear na Argentina. Até mesmo instalações militares passam pela verificação da Abacc, altamente competente. Isso não ocorre em nenhum lugar do mundo! Com o Acordo Quatripartite, assinado entre Brasil, Argentina, a própria Abacc e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) completa-se esse ciclo de confiança mútua, sob a inspeção da própria AIEA e controle do Tratado de Não Proliferação (TNP). A Abacc construiu, nas últimas décadas, um índice de verificação de fazer inveja até mesmo à AIEA. É um modelo que pode servir para todas as regiões – como se referiu o dirigente da AIEA, ElBaradei – em que a energia nuclear será questão política da área da proliferação atômica.

No campo do meio ambiente, desde a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente – a Rio 92 –, o país redefiniu sua participação na esfera multilateral dos regimes ambientais. Ainda preserva percepção crítica de quem irá pagar pelos danos causados ao meio ambiente e pelas mudanças climáticas. Assume seu papel e responsabilidade num mundo que se pretende mais sustentável e percebe que terá de assumir custos em termos de desmatamento e das queimadas na Amazônia. Também as novas relações que o Brasil inaugura com os países emergentes (G20), sua política de relações Sul-Sul (como o Fórum Índia, Brasil e África do Sul – IBAS) e sua atuação junto aos BRIC(Brasil, Rússia, Índia e China) são destaques dessa nova e abrangente inserção internacional do país.

 

RELAÇÕES ESTRATÉGICAS REGIONAIS: AMÉRICA DO SUL

A prioridade da política externa tem sido e deve continuar a ser a região sul-americana, mas também alcança a América Latina e o Caribe, sem falar dos próprios Estados Unidos. Inicialmente, o Mercosul, desde a sua criação em 1991, tem sido o foco da política externa brasileira. No momento, o Mercosul parece ser um barco ancorado para conserto: dificuldades macroeconômicas, diferenças de políticas comerciais e falta de visão compartilhada, transnacional, parecem ser alguns dos muitos empecilhos para um processo de integração regional, com base no Mercosul. O Brasil, devido às suas dimensões territoriais e econômicas, causa certo mal-estar entre seus vizinhos, mas na medida em que viabiliza e toma a integração regional como um dos pilares da sua política externa, ganha confiabilidade e desenvolve um ambiente favorável, o que permite a resolução de possíveis conflitos, com seu poder moderador regional.

Nesse processo de integração regional surgiu em 2004, a Unasul – União de Nações Sul-Americanas, constituída pelos 12 países da América do Sul 4. Prioriza o diálogo político, a inclusão social e cultural, o financiamento e a cooperação em infra-estrutura e meio ambiente, além de segurança regional. A cooperação em infra-estrutura, através da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) tem como metas imediatas a construção do corredor bioceânico, que ligará países da costa do Pacífico (Chile e Peru) com o Brasil e Argentina, e a facilitação da circulação de cidadãos sul-americanos, com a extinção de visto.

A Unasul denota o grau de compromisso regional como espaço de articulação política, em busca de governança regional. Nesses desdobramentos e contextualização entre as nações sul-americanas foi possível pensar em um instrumento para gerenciar a ordem de segurança regional, que, em sua história, não possui exemplos expressivos de regionalismo de segurança.

Embora a região não apresente conflitos militares, o ritmo de rearmamento em alguns países e a participação de potências extra-regionais5 na agenda de segurança fez-se pensar em um acordo de confiança mútua. Daí a necessidade da criação do Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS) proposto em 2008, com a participação dos ministros da Defesa de Argentina, Uruguai, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana, Suriname e Venezuela. No CDS, destacam-se quatro áreas fundamentais: a criação de informação e comunicação sobre compra de armamentos; consulta mútua sobre tratados e acordos de defesa com potências regionais; administração de crise e resolução de conflitos; e atuação da região em operações de paz.

Nesse contexto multipolar, torna-se necessário e importante a integração entre as nações sul-americanas com autonomia de gerência e interesse comum acerca da manutenção da paz. O CDS é percebido como parte de uma decisão importante do Brasil, que até há pouco tempo não dispunha de simpatias por mecanismos colegiados na área de segurança e defesa na região. É uma mudança considerável ao enfatizar a América do Sul como uma estratégia de inserção internacional. Destaca-se o papel ativo do Brasil no desenvolvimento de questões de defesa e segurança regional e a busca da resolução de conflitos. O Brasil enfatiza o diálogo entre vizinhos. Especialistas comentam que o Brasil também usará o CDS como exemplo de confiança regional em sua busca do assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU).

Atualmente, um dos temas recorrentes na diplomacia da América Latina é a reintegração de Honduras à Organização dos Estados Americanos (OEA). O país está suspenso da Organização desde a deposição do Presidente Manuel Zelaya em Junho de 2009. Inicialmente, todos os membros da OEA reprovaram o golpe que fere a Carta Democrática da Organização dos Estados Americanos. Passado algum tempo foram realizadas eleições, mas nem o Brasil nem a OEA reconheceram o Governo do então Presidente Porfírio Lobo. Há expectativas para o fim da punição, pois Honduras mantém o apoio dos Estados Unidos e, recentemente, de seis dos sete países que compõem o Sistema da Integração Centroamericana (SICA)6. O Brasil, ainda que tenha razão por princípio democrático, após receber Manuel Zelaya em sua embaixada entrou em outro campo político realista e tornou-se isolado em sua posição, as eleições foram realizadas, e o Governo tomou posse.

 

ENCONTROS E DESENCONTROS: BRASIL VS ESTADOS UNIDOS

Desde o barão do Rio Branco, o Brasil mantém com os Estados Unidos uma «aliança não escrita». Essa peculiaridade significa que cada um, mais poderoso ou menos poderoso, respeita as áreas de influência do outro – regional do Brasil e global dos Estados Unidos. Historicamente os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer a República brasileira. Ao longo do século XX revezaram-se atitudes de apoio dos Estados Unidos às iniciativas do Brasil, bem como houve ingerências por parte dos Estados Unidos nos assuntos brasileiros, sendo a maior delas o apoio dado ao golpe militar de 1964. Essa aproximação ou distanciamento foi freqüente na história das relações políticas e diplomáticas entre os dois países.

Vejamos, por exemplo, o que ocorreu durante a diplomacia pendular no Governo de Getúlio Vargas. Getúlio inclinava-se a dar apoio ora aos Estados Unidos, ora à Alemanha. Somente após os Acordos de Washington, assinados pelos governos do Brasil e dos Estados Unidos, a situação mudou e o Brasil passou a ser parceiro dos Aliados. Como resultado os Estados Unidos patrocinaram a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CNS) que forneceu aço para os Aliados durante a II Guerra Mundial. A CNS veio a ser fundamental no processo de industrialização do país, tornando-se a maior indústria siderúrgica brasileira. Em troca, o Brasil cedeu a Base Aérea de Natal para a defesa do Norte da África para os Aliados. Foi a partir daí que as relações entre os dois países aumentaram. Do ponto de vista militar, o Brasil importou a doutrina da Segurança Nacional, com a aproximação militar da Força Expedicionária Brasileira (FEB) com os militares norte-americanos do War College.

Vejamos outros exemplos desse balanço de convergência e divergência entre Estados Unidos e Brasil. No caso, trata-se do contencioso comercial em que os Estados Unidos tentam fugir das regulações internacionais quanto aos produtores de algodão. Entenda-se: o algodão é um dos maiores componentes do gigante setor agrícola de ambos os países. O Brasil, que tentava ganhar sua posição na Organização Mundial do Comércio (OMC), acabou negociando, através de um Memorando de Entendimento, com os Estados Unidos e adiou por dois anos a retaliação de US$829 milhões, autorizada pela OMC. A posição do setor privado e a do Governo brasileiro é a de defender o acordo que obriga os Estados Unidos a adequar seus programas de subsídios e commodities às normas internacionais do comércio.

Também no caso da política brasileira em relação à sua vontade de ter o assento no CSNU sofre interrogação por parte dos Estados Unidos: não há qualquer comentário positivo ou negativo diante das pressões e pretensões do Brasil em relação ao assento do CSNU, embora tenha já recebido o apoio de inúmeros estados da Europa, da Ásia e da África. Este assunto é tipicamente de natureza política de paz e segurança internacional onde Brasil e Estados Unidos não têm propriamente uma posição comum, por exemplo, vis-à-vis à política pró-desarmamento compreensivo e completo e ao uso da tecnologia nuclear, em que o TNP é ainda visto no Brasil com ressalvas, a tal ponto de não termos assinado o Protocolo Adicional do TNP, exigência que os Estados Unidos cobram sempre do Brasil.

No entanto, apesar dessas diferenças na área da paz e segurança internacional, Brasil e Estados Unidos decidiram assinar, em Abril de 2010, o Acordo de Cooperação Bilateral na área da defesa. Tal acordo confere um marco jurídico como base para definir futuros projetos de cooperação, como troca de tecnologia, equipamentos e facilidades para o treinamento entre as duas Forças Armadas. No acordo, não há previsão de base militar com apoio logístico dos Estados Unidos em território brasileiro. Tal medida situa-se no âmbito da desconfiança que o Brasil teve em relação às sete bases de apoio logístico militar norte-americano em território da Colômbia, a que o Brasil, na Unasul, procurou criar objeções.

Também a experiência adotada pelo Comando Militar do Brasil da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah), despertou o grande interesse dos militares norte-americanos em aprender com o Brasil não apenas a manutenção da ordem pública, mas a ampliação da visão de segurança para promover o desenvolvimento.

 

CONCLUSÃO

O Brasil é um país com uma história e uma cultura sui generis, encravado nesse enorme território ao meio de terras hispano-americanas, falando a sua língua portuguesa, com sentimento de ver o mundo através de sua ótica e pensamento próprios. O legado político-diplomático que estamos construindo, quer em relação à América do Sul, quer em relação ao poder dos Estados Unidos, sempre vem com marcas e características conquistadas por esse legado diplomático de transformar fronteiras – fontes de conflitos – em cooperação. Estabelecemos relações amistosas com os estados vizinhos e com os Estados Unidos, com tamanho e poder desigual, sob formas de convivência, ora aproximando-se ora se afastando, sem, contudo, romper relações diplomáticas, políticas, culturais, econômicas e comerciais. Este ensaio é nada mais que um raio-X da construção de um Estado e de uma sociedade que se movem – às vezes com passos moderados, algum tempo atrás, com passos lentos e, hoje, com uma dinâmica mais veloz e ativa e até mesmo altiva – em direção ao mundo de que deseja fazer parte, com os ganhos e perdas.

 

NOTAS

* O presente artigo resulta da comunicação proferida nos XVII Cursos Internacionais de Cascais realizados entre 21 e 26 de Junho de 2010 no Centro Cultural de Cascais, e organizados pela Câmara Municipal de Cascais e pelo IPRI – UNL.        [ Links ]

1 A estudante Monah Marins, do curso de graduação de Relações Internacionais, IH/UCAM, foi colaboradora ativa em pesquisa e na configuração do texto. Os meus sinceros agradecimentos.

2 Diplomacia de negócios ou diplomacia empresarial é aquela voltada para a atuação do mundo corporativo empresarial, em conjunto com a diplomacia governamental, diante dos novos desafios do mercado global como nas negociações do comércio multilateral e nos fluxos do capital, da tecnologia e dos serviços. Ver o trabalho de TROYJO, Marcos Prado – Manifesto da Diplomacia Empresarial e Outros Escritos (São Paulo: Editora Lex, 2005). Ver também o dossiê «O Brasil de Lula – retrospectiva 2003-2005 e perspectiva para 2006» (Política Internacional. N.º 29, Novembro de 2005, Lisboa: Centro Interdisciplinar de Estudos Económicos), e ver artigo do autor «Política externa do Governo Lula: continuidade e mudanças», pp. 17-32.        [ Links ]

3 O Brasil assinou e ratificou o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares (CTBT), com atuação na Comissão Preparatória da futura organização do Tratado, a OCTB e passou a integrar o Grupo de Supridores Nucleares (Nuclear Suppliers Group, NSG/GSN) que coordena as políticas de exportação de bens e equipamentos nucleares e está associado à Coalizão da Nova Agenda (México, Egito, África do Sul, Suécia, Nova Zelândia, Irlanda e Eslovênia), com base na Declaração em Direção a Um Mundo Livre de Armas Nucleares: Nova Agenda. O país é membro originário da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ), 1997, que prevê a eliminação de toda classe de armas e foi presidida por diplomata brasileiro. Integrante desde 1973 da Convenção para a Proibição de Armas Biológicas e faz parte do Regime de Controle de Tecnologias de Mísseis (MTCR). Cf. BRIGAGÃO, Clóvis, e RODRIGUES, Gilberto – Política Externa Brasileira: da Independência aos Novos Desafios do Séc. XXI. São Paulo: Moderna, 2006.        [ Links ]

4 III Reunião de Chefes de Estado e de Governo da América do Sul, realizada em Cuzco, Peru, com o nome de «Comunidade Sul-americana de Nações». Em 2007, durante a I Cúpula Energética Sul-Americana decidiu-se adotar o nome de Unasul.

5 A presença dos Estados Unidos em bases militares na Colômbia, bem como grandes contratos com presença de tropas, no caso da Rússia-Venezuela e a implantação da parceria entre Brasil e França, para construção de base para o submarino de propulsão nuclear mostram a interdependência ou a ingerência de potências extra-regionais dentro da América do Sul.

6 In Correio Brasiliense, 21 de Julho de 2010.