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e-Pública: Revista Eletrónica de Direito Público

versão On-line ISSN 2183-184X

e-Pública vol.5 no.2 Lisboa jul. 2018

 

DESTAQUE

Situação e Desafios da Protecção dos Direitos Fundamentais na União Europeia

Restrictive measures and the fight against terrorism in the European Union: recent lessons from the court of justice of the EU

 

Rui Manuel Moura Ramos1  

Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa,
Pátio da Universidade
3004-528 Coimbra-Portugal
E-mail: rmmramos@fd.uc.pt

RESUMO

O artigo analisa a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia enquanto um dos três vetores do sistema de proteção dos direitos fundamentais acolhido nos Tratados e resultante do artigo 6.º do Tratado da União Europeia resultante do Tratado de Lisboa no contexto da evolução jurisprudencial da sua proteção. Em particular, analisa o seu âmbito de aplicação, a eficácia horizontal das suas disposições, os termos da aplicabilidade dos direitos sociais reconhecidos na Carta. Por outro, discute também a adesão da União Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o Parecer n.º 2/13 do Tribunal de Justiça da União Europeia. 

 

Palavras-Chave: União Europeia - Direitos Fundamentais - Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia - Convenção Europeia dos Direitos do Homem

 

ABSTRACT

The article analyzes the Charter of Fundamental Rights of the European Union as one of the three vectors of the system of protection of fundamental rights, as set out in the Treaties and resulting from Article 6 of the Treaty on European Union resulting from the Treaty of Lisbon in the context of the evolution of its case-law. protection. In particular, it analyzes its scope, the horizontal effectiveness of its provisions, the terms of the applicability of the social rights recognized in the Charter. It also discusses the accession of the European Union to the European Convention on Human Rights and Opinion No 2/13 of the Court of Justice of the European Union.

 

Keywords: European Union - Fundamental Rights - Charter of Fundamental Rights of the European Union - European Convention on Human Rights

 

Restrictive measures and the fight against terrorism in the European Union: recent lessons from the court of justice of the EU

1 . A reflexão que nos convoca coloca-se sob a égide da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia1 e ocorre decorridos três lustros após a proclamação da sua versão originária2. Entretanto, como se sabe, o texto viria a sobre algumas adaptações na véspera da assinatura do Tratado de Lisboa3, sendo que este acto de revisão, sem incorporar formalmente a Carta no direito primário da União, lhe viria a atribuir “o mesmo valor jurídico que os Tratados”4 (artigo 6.º, n.º 1, do TUE), precisando em particular que o que nela se dispõe “de forma alguma (…) pode alargar as competências da União, tal como definidas nos Tratados” (artigo 6.º, n.º 1).

A Carta é, porém, mau grado a sua importância, apenas um dos três vectores do sistema de protecção dos direitos fundamentais acolhido nos Tratados. A ela há que acrescentar, com um estatuto particular, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos5, a que a União manifesta a vontade de aderir (artigo 6.º, n.º 2 – também “sem alteração das competências da União, tal como previstas nos Tratados”), sendo que “do direito da União fazem parte, com o estatuto de princípios gerais, os direitos fundamentais tal como os garante a CEDH e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros” (artigo 6.º, n.º 3).

Este sistema constituiu-se a bem dizer por estratos, e essa construção não está verdadeiramente terminada, não dispensando ademais um trabalho de síntese, coordenação, e racionalização6.

2. O sistema resulta, como é sabido, de uma construção pretoriana, do que de algum modo podemos ver como uma forma de activismo judiciário7. Assim, é por uma série de decisões judiciais iniciada pelo que constituiu uma falsa partida, no caso Storck8, em que o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias9 excluiu a possibilidade de considerar, como parâmetros de validade dos actos comunitários, normas nacionais qualquer que fosse a sua natureza, inclusivamente de carácter constitucional, que a protecção dos direitos fundamentais se viria a impor no âmbito do direito da União.

Dez anos depois, com os acórdãos Stauder10 e Internationales Handelsgesellschaft11, o Tribunal afirmaria que o respeito pelos direitos fundamentais constituía um requisito de legitimidade dos actos comunitários, na medida em que constituía parte integrante dos princípios gerais de direito comunitário cujo respeito lhe cabe assegurar. Em particular nesta última decisão, consideraria que «a salvaguarda desses direitos, ainda que inspirada nas tradições constitucionais comuns aos Estados-membros, deve ser assegurada no âmbito da estrutura e dos objectivos da Comunidade»12, reconhecendo posteriormente, no acórdão Nold13, a possibilidade de recorrer aos tratados internacionais sobre direitos humanos para construir um sistema não escrito de protecção dos direitos fundamentais, tendo sublinhado nos acórdãos Rutili14 e Hauer15 o especial papel que, a esse respeito, deve ser reconhecido à CEDH16.

3. Os princípios assim elaborados no plano jurisprudencial vieram, como se sabe, a ser incorporados nos Tratados. Na verdade, depois de uma Declaração Comum das três instituições que, embora sem carácter vinculativo, se referiria aos direitos garantidos pelas Constituições dos Estados-Membros e pela CEDH, o princípio da protecção dos direitos fundamentais encontraria eco no preâmbulo do Acto Único Europeu, passando com o Tratado de Maastricht a constar do Tratado da União Europeia (artigo F, parágrafo 2), o que seria reafirmado pelo Tratado de Amesterdão (tendo a disposição passado a constar do artigo 6.º, parágrafo 2)17.

4. Entretanto, a possibilidade de adesão formal das Comunidades Europeias à CEDH seria considerada pelas instituições18, vindo a ser inviabilizada por um primeiro parecer do TJCE19, que consideraria que «no estado actual do direito comunitário, a Comunidade não tem competência para aderir à CEDH». O Tribunal considerou, neste contexto, que «a adesão à Convenção implicaria uma alteração substancial do actual regime comunitário de protecção dos direitos do homem, na medida em que teria como resultado a inserção da Comunidade num sistema institucional internacional distinto, bem como a integração do conjunto das disposições da Convenção na ordem jurídica comunitária»20, tendo acrescentado que «uma tal alteração do regime de protecção dos direitos do homem na Comunidade, cujas implicações institucionais seriam igualmente fundamentais tanto para a Comunidade como para os Estados-Membros, teria relevância constitucional e ultrapassaria, pois, pela sua natureza, os limites do artigo 235.º. Só poderia ser realizada pela via de uma modificação do Tratado»21.

5. E, a partir de 2000, a União Europeia passaria a dispor de uma Carta dos Direitos Fundamentais, que apesar de desprovida de carácter vinculativo, em breve passaria a ser objecto de invocação pela jurisprudência.

6. Seria o novo artigo 6.º do TUE resultante do Tratado de Lisboa que consagraria o sistema tripartido de fontes em matéria de protecção dos direitos fundamentais. De acordo com esta disposição, o papel essencial parece reservado à Carta, ora equiparada ao direito primário, frisando-se, no parágrafo 3 do n.º 1 daquele artigo, que «os direitos, as liberdades e os princípios22 consagrados na Carta devem ser interpretados de acordo com as disposições gerais constantes do Título VII da Carta que regem a sua interpretação e aplicação e tendo na devida conta as anotações a que a Carta faz referência, que indicam as fontes dessas disposições».

Um dos problemas abordados por este texto é o dos termos da sua aplicação23. De acordo com o artigo 51.º, n.º 1, da Carta, «as [suas] disposições (…) têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União, na observância do princípio da subsidiariedade, bem como os Estados-Membros, apenas quando apliquem o direito da União». Independentemente da querela sobre o sentido a atribuir a esta expressão, parece poder retirar-se da jurisprudência que a Carta apenas será de aplicar a situações jurídicas nacionais que se insiram no campo de aplicação do direito da União24, o que não se verificaria quando a conexão da situação com o direito da União resultasse apenas da aplicação das disposições da Carta eventualmente vulneradas. Ao contrário, e como já se sublinhou, a medida nacional contestada deverá apresentar uma conexão suficiente com uma regra de direito da União, e esta norma de direito da União não pode ser o direito fundamental que se assume ter sido violado25.

Mais problemático será saber o que é necessário para se poder falar da suficiência de uma tal conexão. Se parece claro que ela existe quando os Estados-Membros actuem enquanto agentes da União, ou seja, quando se limitem a executar normas desta26, a jurisprudência viria a fixar-se posteriormente numa fórmula algo diversa, bastando-se com a circunstância de a regulamentação nacional se situar «no âmbito do direito comunitário» ou entrar «no campo de aplicação» deste27. Se num primeiro momento o Tribunal se orientara por uma abordagem de tipo formalista, exigindo que a disposição nacional em questão tivesse «por objectivo dar aplicação a uma disposição do direito comunitário», não prosseguisse objectivos diversos dos do direito comunitário nem tivesse carácter geral, e não se inserisse num domínio que fosse da competência dos Estados-Membros28, a evolução subsequente consagraria uma posição de tipo funcional, em que a circunstância de as normas internas não apresentarem uma ligação directa com a actuação do direito da União não seria obstáculo à aplicação da Carta29.

Esta linha de orientação seria confirmada, mais recentemente, no acórdão Fransson, proferido no processo C-617/10, em que o TJUE admitiria a protecção dos direitos fundamentais perante situações reguladas pelo direito da União (ponto 19), abrangidas por ele (ponto 21), ou conexionadas com ele (ponto 24)30. Mas se pode assim dizer-se que, para a jurisprudência, se afigura bastante que a medida nacional controvertida apresente uma conexão com uma disposição de direito da União, não sendo necessário que ela tenha sido especificamente adoptada para dar actuação a obrigações criadas pelo direito da União31, não é menos verdade que o TJUE se não pronunciou ainda claramente sobre a ligação que, para efeitos de aplicação da Carta, deverá existir entre a situação jurídica nacional e o direito da União32.

E não menos perplexidades suscita a questão da eficácia horizontal da Carta, a propósito da qual, depois de ter afirmado que« num litígio entre particulares, cabe ao órgão jurisdicional nacional garantir a observância do princípio da não discriminação em razão da idade, como concretizado pela Directiva 2000/78, devendo afastar, quando necessário, as disposições contrárias da legislação nacional, independentemente de exercer a faculdade de que dispõe de submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia um pedido de decisão prejudicial sobre a interpretação deste princípio»33, viria a estabelecer, no caso AMS (processo 176/12), um distinguo em relação a esta situação, ao salientar que «quando se conclua que uma disposição nacional de transposição da directiva 2002/14/CE (…), que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia, é incompatível com o direito da União, o artigo 27.º da Carta deve ser interpretado no sentido de que não pode ser invocado num litígio entre particulares a fim de não ser aplicada essa disposição nacional»34 (ponto 51)35.

7. Igualmente controvertida é a questão dos termos da aplicabilidade dos direitos sociais reconhecidos na Carta36. A este propósito, e para além do direito à informação e consulta dos trabalhadores na empresa a que se reporta o artigo 27.º37, do direito de negociação e acção colectiva consagrado no artigo 28.º38, do direito a condições de trabalho justas e equitativas, afirmado no artigo 31.º e invocado nos dois acórdãos paralelos a que acima nos referimos39, importa referir ainda o direito à segurança social e à assistência social, acolhido no artigo 34.º, e no âmbito do qual se afirmou recentemente uma jurisprudência que temos por restritiva40.

Muito embora a Carta se refira ao reconhecimento destes direitos, muitas vezes, «nos casos e nas condições previstos pelo direito da União e pelas legislações e práticas nacionais»41, importa saber em que termos a fundamentalidade42 que lhes é agora reconhecida terá consequências nos termos do seu reconhecimento.

8. Até ao presente apenas tivemos em conta a Carta, enquanto fonte da protecção dos direitos fundamentais reconhecidos pela ordem jurídica da União. Mas, como referimos, o citado artigo 6.º do TUE refere-se, no n.º 2, à CEDH, à qual a União manifesta a vontade de aderir, precisando-se também que «essa adesão não altera as competências da União, tal como definidas nos Tratados». Ultrapassa-se desta forma a questão de competência em que o já mencionado Parecer n.º 2/94 se baseara para negar a possibilidade de adesão das Comunidades à Convenção. Neste contexto, seria aliás aditado ao Tratado de Lisboa um novo Protocolo43 que sublinha que o acordo que a concretizasse deveria incluir cláusulas que preservassem as características próprias da União e do direito da União (artigo 1.º), assegurando igualmente que «a adesão (…) não afecte as (…) competências [da União] nem as atribuições das suas instituições» (artigo 2.º), colocando-se assim o acento tónico na questão da compatibilidade do acordo com a União e o seu direito, e não já na competência da União para o celebrar.

Aquela questão viria a ser por sua vez posta de novo ao TJUE que, face ao projecto entretanto negociado, afirmaria, no seu Parecer 2/1344, que o Acordo Projectado45 era incompatível com o direito primário, não permitia preservar as características específicas da União e do seu direito46, sendo susceptível de lesar tais características e a autonomia deste direito, e de afectar o artigo 344.º do TFUE47.

A adesão querida pelo “constituinte” da União encontra-se assim num limbo, em que uma visão absolutista da autonomia da União e do seu direito parece negar a possibilidade de um controlo externo sobre os termos em que nela se leva a cabo a protecção dos direitos fundamentais, no fundo a verdadeira novidade que a adesão perspectivada era susceptível de trazer. E esta circunstância parece não poder ser esquecida quando se analisam os termos e consequências da resposta negativa do Parecer48, que como que parecem esquecer ser precisamente esta novidade que constituía um prius capaz de justificar, nas condições de 2007, a reafirmação da vontade (agora formulada num plano constitucional) de adesão da União à CEDH.

Na verdade, os direitos garantidos pela CEDH (e por aqueles dos seus Protocolos que houvessem sido ratificados por todos os Estados-Membros)49 já se encontram recebidos no sistema global de protecção dos direitos fundamentais vigente na União, ou enquanto princípios gerais, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do TUE50, ou através da recepção material, de carácter parcial embora, daqueles desses direitos que são elencados na Carta51, e que, nos termos do disposto no citado n.º 1 do artigo 6.º (tendo “o mesmo valor jurídico que os Tratados”), passaram a integrar o direito primário52. Na verdade, o terceiro parágrafo do n.º 1 do artigo 6.º preceitua que «os direitos, as liberdades e os princípios consagrados na Carta devem ser interpretados de acordo com as disposições gerais constantes do Título VII da Carta que regem a sua interpretação e aplicação e tendo na devida conta as anotações a que a Carta faz referência», sendo que o n.º 3 do artigo 52.º, inserido neste título, acrescenta que «na medida em que a presente Carta contenha direitos correspondentes aos direitos garantidos pela Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, o sentido e o âmbito desses direitos são iguais aos conferidos por essa Convenção»53.

O que significa que esses direitos constantes da CEDH54, independentemente do valor que a este instrumento seja reconhecido na ordem jurídica da União e de uma (eventual?) futura adesão desta última àquele texto, são actualmente parte integrante do direito primário da União, gozando por isso mesmo da posição que lhe é inerente55 (desde logo, em termos de prevalência da sua aplicação sobre o direito estatal, agora como decorrente do próprio direito da União e não já como resultante de um autónomo posicionamento da ordem jurídica dos Estados-Membros)56.

E é este actual posicionamento da CEDH no quadro do direito da União e, em particular, do seu sistema de protecção de direitos fundamentais, que produz, per se , uma alteração do relacionamento entre as duas jurisdições (Estrasburgo e Luxemburgo) no quadro da interpretação daqueles direitos, com o inerente reconhecimento da vinculação, por parte da União, ao pertinente case-law do primeiro daqueles tribunais57. Nesta medida, como já se escreveu58, «a autonomia da ordenação dos direitos fundamentais da União apenas persiste na medida em que o TJUE puder identificar standards superiores ou adicionais aos contidos nos direitos correspondentes da Convenção».

O que se afigura não ter sido devidamente considerado pelo TJUE na análise que levou a cabo no Parecer 2/13 sobre a autonomia do direito da União Europeia.

9. Para além da Carta e da Convenção, cuja perspectivada adesão fica por ora em suspenso, o artigo 6.º do TUE continua, no seu n.º 3, a reconhecer que «do direito da União fazem parte, enquanto princípios gerais, os direitos fundamentais tal como os garante a CEDH e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros». Se os desenvolvimentos anteriormente referidos podem tornar menos relevante o recurso à CEDH como fonte daqueles princípios gerais, o mesmo talvez se não deva dizer das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, uma vez que é reforçada a atenção dada pelo Tratado às identidades nacionais respectivas. Assim, o n.º 2 do artigo 4.º do TUE sublinha que a União respeita essa identidade nacional, «reflectida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um dos Estados-Membros, incluindo no que se refere à autonomia local e regional». E este respeito, igualmente acentuado no preâmbulo do mesmo Tratado59, pode legitimar a manutenção de distintos standards de direitos fundamentais nos Estados-Membros60.

10. À natural complexidade do sistema de protecção dos direitos fundamentais que acabámos de evocar acrescem presentemente alguns desafios que não facilitam os termos em que a sua actuação tem lugar. Um deles resulta da circunstância de aqueles direitos que mais recentemente, através do catálogo da Carta lograram expressa consagração no sistema global de protecção dos direitos fundamentais da União [os contidos nos capítulos desta relativos à igualdade (III) e à solidariedade (IV)]61 serem chamados a ser aplicados em tempos de crise62 e de maior escassez de recursos. Está aqui em causa, por um lado, a eventual menor densificação que há-de ser reconhecida a direitos de natureza social, assim como a maior dificuldade da sua efectivação num tempo em que a preocupação com a sustentabilidade dos diversos subsistemas sociais reduz sensivelmente a margem de escolhas do legislador. O que, não deixando de provocar um aprofundamento dos termos em que a própria solidariedade deve ser compreendida63, também contribuiu quer para alguma menor abertura do pretório à consideração de situações de alegada restrição de direitos64, quer para a consagração de soluções de carácter algo restritivo65.

11. Depois, parece também não poder esquecer-se que a aplicação de alguns destes direitos ocorre presentemente num contexto de ameaças globais que suscitam respostas que nem sempre harmonizam da forma mais feliz a protecção dos direitos das pessoas e a salvaguarda dos interesses gerais, em face, designadamente, de ameaças globais como o terrorismo66. Se a protecção dos direitos fundamentais no quadro da cooperação policial e judiciária em matéria penal evidenciara já delicados problemas67, as medidas que mais recentemente foram tomadas como resposta àquela ameaça, como os termos em que esta última se tem materializado, antecipam uma crescente necessidade de procurar balancear direitos e interesses, em diferentes domínios, desde logo o da protecção dos dados pessoais68 em que a intrusão na vida pessoal tem vindo a ser justificada pelo combate à ameaça terrorista69 – uma situação a que os tempos mais recentes vieram dar redobrada visibilidade70.

12. Por último, um outro problema não deixa de ver a sua relevância acrescida nos tempos que vivemos: o da universalidade dos direitos reconhecidos por este sistema, ou seja, do seu âmbito pessoal de aplicação. A questão que a este propósito se coloca é a do reconhecimento71 destes direitos aos não detentores da cidadania da União, isto é, aos nacionais de Estados terceiros72. E, para além disso, e uma vez aceite o princípio desse reconhecimento, o da indagação de quais os direitos fundamentais de que gozam, e em que termos, para além dos estrangeiros legalmente residentes no território da União, os estrangeiros em situação irregular73, os refugiados 74 e os requerentes de asilo – assim se refazendo um caminho já explorado pela jurisprudência constitucional de diversos Estados-Membros.

13. O breve ponto de situação que procurámos apresentar, de forma sumária embora, sobre a actual situação da protecção dos direitos fundamentais na União Europeia evidencia claramente quer a complexidade desta temática quer a sua relevância, justificando assim a atenção que mereceu aos organizadores desta conferência. Embora discutidas desde há muito entre os Autores que se têm ocupado destas matérias, as questões que enunciámos estão longe de se poderem dizer estabilizadas, sendo por isso de esperar que as comunicações que se seguem tragam novos e diversos olhares sobre os diversos temas que integram o nosso programa. Resta-nos pois antecipar o maior sucesso aos trabalhos que ora se iniciam, renovando as nossas felicitações à organização pela variedade dos aspectos aos quais se dirige a discussão que vamos empreender e que, sem esgotar o objecto possível da reflexão sobre a problemática que aqui nos congregou, constitui um revelador seguro da pluralidade de aspectos que ela envolve e dos termos em que se tem processado o seu desenvolvimento.

 

NOTAS

1 O presente estudo foi realizado no âmbito do projecto UID/DIR04643/2013 «Desafios sociais, incerteza e direito», desenvolvido pelo Instituto Jurídico da Faculdade e Direito de Coimbra, de que o autor é investigador integrado. De ora em diante, simplesmente, “a Carta”. Sobre este texto, cfr. Diritto, Diritti, Giurisdizione. La Carta dei diritti fondamentali dell’Unione Europea (a cura di Roberto Toniatti), Padova, 2002, Cedam, Estudios sobre la Carta de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea (bajo la cooordinación de Carlos Ruiz Miguel), 2004, Universidade de Santiago de Compostela e, entre nós, Moura Ramos, «A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a protecção dos direitos fundamentais», in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares (Studia Iuridica, 61. Ad Honorem –1), 2002, Coimbra Editora, p. 963-989 (980-987), António Goucha Soares, A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A protecção dos direitos fundamentais no ordenamento comunitário, Coimbra, 2002, Coimbra Editora, e Maria Luísa Duarte, «A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Natureza e meios de tutela», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, v. II, Coimbra, 2006, Coimbra Editora, p. 255-289. Para comentários gerais, vejam-se Araceli Mangas Martin (Dir.), Carta de Los Derechos Fundamentales de la Unión Europea. Comentario articulo por articulo, Bilbao, 2008, Fundación BBVA, The EU Charter of Fundamental Rights. A Commentary (Edited by Steve Peers/Tamara Harvey/Jeff Kenner/Angela Ward), Oxford, 2014, Hart,e, entre nós, Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia Comentada (coord.: Alessandra Silveira/Mariana Canotilho), Coimbra, 2013, Almedina.

2 A 7 de Dezembro de 2000, em Nice. Para um ponto de situação da questão que nos ocupa, referido ao momento de proclamação da Carta, cfr. Fabrice Picod, «Les Sources», in Réalités et perspectives du droit communautaire des droits fondamentaux [Frédéric Sudre/Henri Labayle (dir.)], Bruxelles, 2000, Bruylant, p. 125-185.

3 A 12 de Dezembro de 2007.

4 Por “Tratados” entenderemos o Tratado da União Europeia (de ora em diante, TUE) e o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (de ora em diante, TFUE), que, nos termos do n.º 3 do artigo 1.º daquele texto, “têm o mesmo valor jurídico”.

5 De ora em diante, “a Convenção” ou “a CEDH”. Sobre este texto e o sistema em que se insere, cfr. Maria Luísa Duarte, «A Convenção Europeia dos Direitos do Homem. A matriz europeia de garantia dos direitos fundamentais», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, v. II (cit. supra, nota 1), p. 165-190, Alejandro Saiz Arnaiz, «El Convenio de Roma, el Tribunal Europeo de Derechos Humanos y la cultura común de los derechos fondamentales en Europa», in Hacia una Corte de Justicia Latinoamericana, Valencia, 2009, AMELA, p. 25-48, Jens Meyer-Ladewig, «The European Court of Human Rights as European Constitutional Court», in Liber Amicorum Peter Leuprecht, Bruxelles, 2012, Bruylant, p. 183-210, e, mais recentemente, Silvia Sonelli, «La CEDU nel quadro di una tutela multilivello dei diritti e il suo impatto sul diritto italiano: Direttrici di un dibattito», in La Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo e l’Ordinamento Italiano. Problematiche attuali e prospettive per il futuro (a cura di Silvia Sonelli), Torino, 2015, G. Giappichelli Editore, p. 1-27.

6 Em sentido próximo, também Santiago Muñoz Machado, «Los três niveles de garantias de los derechos fundamentales en la Unión Europea: Problemas de articulación», 19 Revista de Derecho Comunitario Europeo (enero-abril 2015), N.º 50, p. 195-230. Saliente-se que esta necessidade de articulação se não limita ao plano substantivo, estendendo-se, no âmbito processual, ao relacionamento entre a questão prejudicial do actual artigo 267.º do TFUE e as questões de inconstitucionalidade que os Tribunais Constitucionais dos Estados-Membros são chamados a decidir. A este respeito, cfr. o acórdão de 22 de Junho de 2010, Melki, nos processos apensos C-188/10 e 189/10, Colectânea, p. I-5667, e, na doutrina, Diana-Urania Galetta, «Autonomia procedurale e dialogo costruttivo fra giudici alla luce della sentenza Melki», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/11, p. 223-244, P. Cruz Villalón/J. L. Requejo Pagés, «La relación entre la cuestión prejudicial y la cuestión de inconstitucionalidad», 19 Revista de Derecho Comunitario Europeo (enero-abril 2015), N.º 50, p. 173-194, M. de Visser, «Juggling centralised constitutional review and EU primacy in the domestic enforcement of the Charter: A. v. B.», Common Market Law Review, 52 (October 2015), N.º 5, p. 1201-1246, e, entre nós, J. N. Cunha Rodrigues, «Fiscalização constitucional e reenvio. A questão da prioridade», in Estudos em Homenagem a António Barbosa de Melo, Coimbra, 2013, Almedina, p. 321-333. Perspectivando as dificuldades que o sistema apresenta, quando considerado do ponto de vista do particular, cfr. Maria Luísa Duarte, «O Direito da União Europeia e o Direito Europeu dos Direitos do Homem. Uma defesa do “triângulo judicial europeu”», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, v. II (cit. supra, nota 1), p. 205-236, e «Justice constitutionnelle, justice ordinaire, justice supranationale: À qui revient la protection des droits fondamentaux en Europe?», ibidem, p. 237-253.

7 Sobre este tema, cfr. Antonio Saggio, «L’activisme judiciaire dans l’espace communautaire: son rôle dans l’intégration européenne et ses limites», in O Direito Comunitário e a Construção Europeia (Studia Iuridica, 38. Colloquia – 1), Coimbra, 1999, Coimbra Editora, p. 83-92.

8 Acórdão de 4 de Fevereiro de 1959, Storck/Alta Autoridade da CECA, processo 1/58, Colectânea, p. 296-306, ponto 4, a). De acordo com o Tribunal, esta jurisdição «só tem que garantir o respeito do direito na interpretação e aplicação do Tratado e dos regulamentos de execução; regra geral, não deve pronunciar-se sobre as normas de direito interno; em consequência, não pode examinar a acusação segundo a qual, ao adoptar a sua decisão, a Alta Autoridade violou princípios do direito constitucional alemão».

9 De ora em diante “TJCE”, ou “TJUE”.

10 Acórdão de 12 de Novembro de 1969, processo 29/69, Colectânea, p. 158-162, ponto 7.

11 Acórdão de 17 de Dezembro de 1970, processo 11/70, Colectânea, p. 627-634, ponto 20.

12 Ponto 4.

13 Acórdão de 14 de Maio de 1974, Nold, processo 4/73, Colectânea, p. 285-292, ponto 13. No dizer do Tribunal, «os instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem, em que os Estados-membros colaboraram ou a que aderiram, podem igualmente dar indicações que é conveniente tomar em consideração no âmbito do direito comunitário».

14 Acórdão de 28 de Outubro de 1975, Rutili, processo 36/75, Colectânea, p. 417-427, ponto 32.

15 Acórdão de 13 de Dezembro de 1979, Hauer, processo 44/79.

16 Sobre esta evolução jurisprudencial, mais desenvolvidamente, cfr. Bruno de Witte, «The past and future role of the European Court of Justice in the protection of human rights», in The EU and Human Rights (Edited by Philip Alston, with Mara Bustelo and James Heenan), Oxford, 1999, Oxford University Press, p. 859-897, Moura Ramos, «A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a protecção dos direitos fundamentais», in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares (cit. supra, nota 1), p. 967-971, e Cruz Vilaça, «A protecção dos direitos fundamentais na ordem jurídica comunitária», ibidem, p. 415-433. Em especial sobre o papel da CEDH no sistema comunitário de protecção dos direitos fundamentais, cfr. Maria Luísa Duarte, «O modelo europeu de protecção dos direitos fundamentais – Dualidade e convergência», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, v. II (cit. supra, nota 1), p. 191-203.

17 Para os termos desta disposição, cfr. a análise de Bruno Nascimbene, «Tutela dei diritti fondamentali e competenza della Corte di Giustizia nel Trattato di Amsterdam», in Scritti in onore de Giuseppe Federico Mancini, v. II – Diritto dell’Unione Europea, Milano, 1998, Giuffrè, p. 683-694. E, sobre o sistema dela resultante, cfr. Koen Lenaerts, «Le respect des droits fondamentaux en tant que príncipe constitutionnel de l’Union Européenne», in Mélanges en hommage à Michel Waelbroeck, volume I, Bruxelles, 1999, Bruylant, p. 423-457.

18 Sobre os trabalhos então empreendidos, cfr. Moura Ramos, «L'adhésion de la Communauté à la Convention Européenne des Droits de l'Homme. Rapport National - Portugal», Revista de Direito e Economia, v. 16-19 (1990-1993), p. 753-766.

19 Parecer n.º 2/94, de 28 de Março de 1996, Colectânea, p. I-1759-1790. Sobre esta decisão, cfr. as visões contrastantes de Gil Carlos Rodriguez Iglesias, «La Protección de los derechos fundamentales en la Unión Europea», in Scritti in onore de Giuseppe Federico Mancini (cit. supra, nota 17), p. 831-845 (839-845), Claudio Zanghi, «Un’altra ctitica al Parere 2/94 della Corte sull’adesione della Comunità alla Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo», ibidem, p. 1101-1120, e, entre nós, Miguel Gorjão-Henriques, «O Parecer n.º 2/94, de 28.03.1996 e a competência da Comunidade Europeia para aderir à Convenção Europeia dos Direitos do Homem», Temas de Integração, 3.º vol. (2.º semestre de 1998), N.º 6, p. 169-175. Considerando a questão no contexto mais amplo do relacionamento dos tribunais de Estrasburgo e do Luxemburgo, cfr. Antonio Tizzano, «Les Cours Européennes et l’adhésion de l’Union à la CEDH», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/11, p. 29-57.

20 Ponto 34.

21 Ponto 35. Manifestando algum cepticismo face à adesão formal que desta forma fora inviabilizada, veja-se, entre nós, Maria Luísa Duarte, «A União Europeia e os direitos fundamentais. Métodos de Protecção», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, Coimbra, 2000, Coimbra Editora, p. 11-35 (33-35).

22 Sobre a distinção entre direitos e princípios, cfr. o n.º 5 do artigo 52.º da Carta e a anotação respectiva, e, na doutrina, recentemente, D. Guomundsóttir, «A renewed emphasis on the Charter’s distinction between rights and principles: Is a doctrine of judicial restraint more appropriate?», Common Market Law Review, 52 (June 2015), N.º 3, p. 685-720.

23 Para uma abordagem global, cfr. Marta Requejo Isidro, «La Carta de Derechos Fundamentales de la Unión Europea: âmbito de aplicación», inEstudios sobre la Carta de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea (cit. supra, nota 1), p. 211-246; e, no quadro da sua aplicação jurisprudencial, cfr. A. Rosas/H. Kaila, «L’application de la Charte des droits fondamentaux de l’Union Européenne par la Cour de Justice: un premier bilan», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/11, p. 1-28.

24 O que explicaria a postura (de incompetência) do Tribunal sempre que se demonstre que uma determinada situação não se insira no âmbito de aplicação deste direito, de tal modo que as disposições da Carta eventualmente pertinentes não seriam consideradas suficientes para garantir, por si só, tal competência. Neste sentido, cfr., por exemplo, os acórdãos proferidos nos processos C-128/12 (Sindicato dos Bancários do Norte) e C-264/12 (Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros), em que se questionava a conformidade com o artigo 31.º da Carta das disposições da lei do orçamento português para 2011 que previam restrições salariais. Neles, o TJUE, depois de recordar que as exigências que decorrem da protecção dos direitos fundamentais vinculam os Estados-Membros sempre que estes sejam chamados a aplicar o direito da União (ponto 10 do primeiro daqueles acórdãos) e que as disposições da Carta têm por destinatários «os Estados-Membros, apenas quando apliquem o direito da União», e que, por forçado artigo 6.º, n.º 1, TUE, que atribui valor vinculativo à Carta, esta não cria nenhuma competência nova para a União e não altera as competências desta (ponto 11), conclui pela incompetência do Tribunal por a decisão de reenvio não conter nenhum elemento concreto que permita considerar que a referida lei se destina a aplicar o direito da União (pontos 12 e 19, respectivamente). Sob uma distinta qualificação, o Tribunal também entendeu, no caso Pringle (C-370/12) que os Estados-Membros não aplicam o direito da União, na acepção do artigo 51.º, n.º 1, da Carta, quando criam um mecanismo de estabilidade como o MEE, para cuja criação os Tratados não atribuem nenhuma competência específica à União, pelo que o direito à tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 47.º da Carta se não oporia à celebração daquele Tratado (ponto 180).

25 Cfr. Enzo Cannizzaro, «Diritti “diretti” e diritti “indiretti”: I diretti fondamentali tra Unione, CEDU e Costituzione italiana», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/12, p. 23-42, e Marco Gestri/Stefano Silingardi, «La Tutela dei Diritti Fondamentali in Europa dopo il Trattato di Lisbona», in La Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo e l’Ordinamento Italiano. Problematiche attuali e prospettive per il futuro (cit. supra, nota 5), p. 29-94 (45). Sobre o case-law do Tribunal do Luxemburgo, a este propósito, cfr. Jean-Paul Jacqué, «La Cour de Justice face à l’article 51 de la Charte des Droits Fondamentaux. Timidité ou perspectives d’ouverture?», in Scrutinizing Internal and External Dimensions of European Law. Liber amicorum Paul Demaret [Inge Govaere & Dominik Hanf], v. I, Bruxelles, 2013, Peter Lang, p. 211-228.

26 Assim, no caso Wachauf (5/88) o Tribunal referir-se-ia à «implementação das regulamentações comunitárias» (ponto 19).

27 No acórdão ERT (260/89), o TJCE daria aquele requisito por preenchido por a regulamentação nacional em causa ser susceptível de entravar o exercício da livre prestação de serviços (pontos 42 e 43).

28 No acórdão Annibaldi (C-309/96), pontos 21-23. Tratava-se no caso, de uma regulamentação nacional que criava um parque natural e arqueológico a fim de proteger e valorizar o ambiente e o património cultural do território em questão (ponto 24). O TJUE retomaria esta linha de orientação no caso Iida (processo C-40711), parecendo exigir que a legislação nacional em causa tivesse por objectivo executar uma disposição do direito da União, e indagando ainda qual o carácter dessa legislação e se a mesma prossegue outros objectivos que não sejam os abrangidos pelo direito da União, ainda que seja susceptível de o afectar indirectamente, bem como se existe uma regulamentação da União específica na matéria ou susceptível de o afectar (ponto 79).

29 Assim, os acórdãos proferidos nos casos McB (C-400/10) e DEB (C-279/09). Na mesma linha, o Tribunal admitiria (no caso N.S., C-493/10 e C-411/10) a aplicação da Carta em situações em que as autoridades dos Estados-Membros exercitavam poderes discricionários em que haviam sido investidas pelo direito da União (ponto 68), e admitiria depois (no caso Vinkov, C-27/11) que a regulamentação nacional em questão constituísse uma medida de aplicação do direito da União ou apresentasse outros elementos de ligação a este último (ponto 59).

30 Aqui divergindo expressamente da posição do Advogado-Geral Cruz Villalón que sustentara, nas suas conclusões, não serem de equiparar, aos casos em que a normação estatal se fundamenta directamente no direito da União, aqueles em que o direito estatal é posto ao serviço dos objectivos estabelecidos pelo direito da União (pontos 60 e 64). No seu entender, tal apenas sucederia quando o direito da União constituísse a causa da intervenção normativa nacional, que seria assim directamente motivada por aquele.

31 Assim se exprimem Marco Gestri/Stefano Silingardi, «La Tutela dei Diritti Fondamentali in Europa dopo il Trattato di Lisbona» (cit. supra, nota 25), p. 54. Mas sublinhe-se que noutros acórdãos (recentemente, Ymeraga, no processo C-87/12) o TJUE parece regressar à jurisprudência mais restritiva dos acórdãos Annibaldi e Iida (cit. supra, nota 28), ao sublinhar que seria necessário verificar,entre outros elementos, se a legislação nacional em causa tem por objectivo executar uma disposição do direito da União, qual o carácter dessa legislação e se a mesma prossegue outros objectivos que não sejam os abrangidos pelo direito da União, ainda que seja susceptível de o afectar indirectamente, bem como se existe uma regulamentação da União específica na matéria ou susceptível de o afectar (ponto 41).

32 Sobre o ponto, cfr., por último, M. Dougan, «Judicial review of Member State actions under the general principles and the Charter: Defining the “Scope of Union law”», Common Market Law Review, 52 (October 2015), N.º 5, p. 1201-1246.

33 No acórdão proferido no processo C-555/07, Kucukdeveci. Sobre o ponto, cfr. Vera Krzeminski, The Kücükdeveci Judgment. A Horizontal Direct Effect for Directives?, University of Leiden, 2010, e Mirjam de Mol, «Kücükdeveci: Mangold Revisited – Horizontal Direct Effect of a General Principle of EU Law: Court of Justice of the European Union (Grand Chamber) Judgment of 19 January 2010, Case C-555/07, Seda Kücükdeveci v. Swedex GmbH & Co. KG», 6 European Constitutional Law Review (June 2010), Issue 2, p. 293-308.

34 O Tribunal excluiu a possibilidade de atribuir eficácia horizontal ao direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa, garantido no artigo 27.º da Carta, frisando (ponto 47) que as circunstâncias da causa no processo principal eram distintas das que estão na origem do acórdão Kücükdeveci, na medida em que o princípio da não discriminação em razão da idade, em causa neste último processo, consagrado no artigo 21.º, n.º 1, da Carta, bastava, por si só, para conferir aos particulares um direito subjectivo que pode ser invocado enquanto tal. Sobre o ponto, cfr. N. Lazzerini, «(Some of) the fundamental rights grantred by the Charter may be a source of obligations for private parties: MAS», Common Market Law Review, 51 (june 2014), N.º 3, p. 907-934,         [ Links ] e Lucia Millán Moro, «Eficacia directa versus Primacia», Common Market Law Review, 51 (june 2014), N.º 3, p. 1029-1045.         [ Links ]

35 Sobre esta problemática, cfr. Chris Hilson, «Rights and principles in EU Law: A distinction without foundation?», 2 Maastricht Journal of European and Comparative Law (2008), p. 193-215, e, por último, D. Guomundsóttir, «A renewed emphasis on the Charter’s distinction between rights and principles: Is a doctrine of judicial restraint more appropriate?» (cit. supra, nota 22), que vê naquele aresto a confirmação de que os princípios da Carta não são horizontalmente invocáveis, e Eleni Franziou, «The horizontal effect of the Charter of Fundamental Rights of the EU: Rediscovering the reasons for horizontality», 21 European Law Journal. Review of European Law in Context (September 2015), Issue 5, p. 657-679.

36 Veja-se o seu Título IV – Solidariedade, artigos 27.º a 38.º.

37 Cfr. a situação referida na nota 34.

38 Cfr. os acórdãos de 11 de Dezembro de 2007, Viking, C- 438/05, Colectânea, p. I-10806-10840, e de 18 de Dezembro de 2007, Laval, C-341/05, Colectânea, p. I-11845-11894. E, a este respeito, em sentido discrepante, cfr. Rebecca Zahn, «The Viking and Laval Cases in the Context of European Enlargement», 3 Web Journal of Current Legal Issues (2008), Paolo Mengozzi, «I conflitti di leggi, le norme di applicazione necessaria in materia di rapport di lavoro e la libertà di circolazione dei servizi nela Comunità Europea», in Nuovi Strumenti del Diritto Internazionale Privato. Liber Fausto Pocar, Milano, 2009, Giuffrè Editore, p. 701-722, Christoph U. Schmid, «From effet utile to effet neolibéral. A critique of the new methodological expansionism of the European Court of Justice», inConflict of Laws and Laws of Conflict in Europe and Beyond. Patterns of Supranational and Transnational Juridification [Rainer Nickel (ed)], Antwerp, 2010, Intersentia, p. 295-314, e, por último, Mark Freedland/Jeremias Prassl, Viking, Laval and Beyond, Oxford, 2014, Hart Publishing.

39 Cfr. supra, na nota 24.

40 Cfr. os acórdãos de 11 de Novembro de 2014, Dano, C-333/13, e 15 de Setembro de 2015, Alimanovic, C-67/14 (ainda não publicados na Colectânea). A este propósito, cfr. H. Verschueren, «Preventing “benefit tourism” in the EU: A narrow or broad interpretation of the possibilities offered by the ECJ in Dano?», Common Market Law Review, 52 (April 2015), N.º 2, p. 363-390, e, entre nós, Sofia Oliveira Pais, «Current Challenges: Freedom of movement and acess of economically inactive Union citizens to social benefits», in EU Citizenship. Challenges and Opportunities (coordenação Sofia Oliveira Pais), Porto, 2015, Universidade Católica Editora, p. 19-42 (32-37).Veja-se a tomada em consideração daquele primeiro acórdão nos acórdãos n.º 141/2015, de 25 de Fevereiro, e n.º 296/2015, de 25 de Maio, do Tribunal Constitucional Português, que, tendo-se referido àquele artigo 34.º concluiu, sem formulação de qualquer questão prejudicial, que «não há qualquer dúvida que o direito da União Europeia tolera um regime diferenciado entre cidadãos da União Europeia e cidadãos nacionais do Estado-Membro de acolhimento, no que respeita a prestações de um regime não contributivo que garante um mínimo de meios de subsistência» (n.º 16 do segundo dos arestos citados) (in www.tribunalconstitucional.pt).

41 Esta menção apenas não consta dos artigos 29.º (direito de acesso aos serviços de emprego), 31.º (condições de trabalho justas e equitativas), 32.º (proibição do trabalho infantil e protecção dos jovens no trabalho), 33.º (vida familiar e vida profissional), 37.º (protecção do ambiente) e 38.º (defesa dos consumidores), sendo expressamente formulada a propósito dos artigos 30.º (protecção em caso de despedimento sem justa causa), 34.º (segurança social e assistência social), 35.º (protecção da saúde) e 36.º (acesso a serviços de interesse económico geral).

42 Sobre esta categoria, por último, Gomes Canotilho, «Para uma revisão da dogmática da jusfundamentalidade», in Estudos em Homenagem a António Barbosa de Melo (cit. supra, nota 6), p. 533-554

43 Relativo ao n.º 2 do artigo 6.º do Tratado da União Europeia respeitante à adesão da União à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (n.º 8).

44 De 18 de Dezembro de 2014 (ainda não publicado na Colectânea). Para uma análise crítica, vejam-se, por exemplo, o Editorial Comment («The EU’s Accession to the ECHR – a “NO” from the ECJ»), Common Market Law Review, 52 (February 2015), N.º 1, p. 1-16, as análises de Florence Benoit-Rohmer, «L’adhésion à la Convention européenne des droits de l’homme, un travail de Pénélope? À propos de l’avis 2/13 de la Cour de Justice», RTDEur. (juillet-septembre 2015), p. 593-611, e Ricardo Alonso Garcia, Análisis crítico del veto judicial de la UE al CEDH en el Dictamen 2/13, de 18 de diciembre de 2014, Working Papers on European Law and Regional Integration, n.º 26 (2015).

45 Para uma análise, cfr. Paul Gragl, «A giant leap for european human rights: The Final Agreement on the European Unions’Accession to the European Convention on Human Rights», Common Market Law Review, 51 (2014), N.º 1, p. 13-58, J. Martín y Perez de Nanclares, «Cita con la ambición: El Tribunal de Justicia ante el desafio de la adhesión de la Unión al CEDU», 18 Revista de Derecho Comunitario Europeo (mayo-agosto 2014), 48, p. 379-399, e Vassiliki Kosta/Nikos Skoutaris/Vassilis Tzevelekos, The EU Acession to ECHR, Oxford, 2014, Hart Publishing.

46 Designadamente pelos termos em que se encontravam consagradas as modalidades de funcionamento quer do mecanismo do co-responsável quer do processo de apreciação prévia pelo Tribunal de Justiça, e de não ter em conta as características específicas do direito da União relativo à fiscalização jurisdicional dos actos, acções ou omissões em matéria de Política Externa e de Segurança Comum (PESC).

47 Pelo qual, recorde-se, os Estados-Membros se comprometem a «não submeter qualquer diferendo relativo à interpretação ou aplicação dos Tratados a um modo de resolução diverso dos que neles estão previstos».

48 Que, como é sabido, se afastou da proposta mais matizada para que tendia a tomada de posição da Advogada-Geral Juliane Kokott apresentada a 13 de Junho de 2014 (ainda não publicada na Colectânea).

49 E elencados nos artigos 2.º a 18.º daquele texto.

50 Nos mesmos termos que os que resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros (ibidem).

51 É o caso, designadamente, dos artigos 2.º (direito à vida), 4.º (proibição da tortura e dos tratos ou penas desumanos ou degradantes), 5.º, n.ºs 1 e 2 (proibição da escravidão e do trabalho forçado), 6.º (direito à liberdade e à segurança), 7.º (respeito pela vida privada e familiar), 10.º, n.º 1 (liberdade de pensamento, de consciência e de religião), 11.º (liberdade de expressão e de informação), 17.º (direito de propriedade), 19.º, n.º 1 (protecção em caso de expulsão), 19.º, n.º 2 (protecção em caso de afastamento, expulsão ou extradição), 48.º (presunção de inocência e direitos de defesa), e 49.º, n.ºs 1 e 2 (princípios da legalidade e da proporcionalidade dos delitos e das penas), que correspondem, respectivamente, aos artigos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 8.º, 9.º, e 10.º, da Convenção, 1.º do Protocolo Adicional, 4.º do Protocolo n.º 4, 3.º (na interpretação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, de ora em diante “TEDH”), 6.º, n.º 2 e n.º 3, e 7.º da Convenção. Note-se que esta tabela de correspondência consta da Anotação ao artigo 52.º da Carta, e que estas Anotações, nos termos do n.º 7 do seu artigo 52.º como do quinto considerandum do seu preâmbulo e do parágrafo 3 do n.º 1 do artigo 6.º do TUE, devem ser tidas em conta, na interpretação e aplicação da Carta, pelos órgãos jurisdicionais da União e dos Estados-Membros. Adicionalmente, a mesma anotação refere ainda que outros artigos da Carta têm o mesmo sentido, ainda que com um âmbito mais alargado, de algumas disposições da CEDH: é o caso dos artigos 9.º (direito de contrair casamento e constituir família), 12.º, n.º 1 (liberdade de reunião e associação), 14.º, n.º 1, e n.º 3 (direito à educação), 47.º, n.ºs 2 e 3 (direito à acção e a um tribunal imparcial), e 50.º (direito a não ser julgado ou punido penalmente mais do que uma vez pelo mesmo delito), que correspondem aos artigos 12.º e 11.º, da CEDH, 2.º do Protocolo Adicional, 6.º, n.º 1, da CEDH, e 4.º do Protocolo n.º 7.Note-se que a anotação a que nos temos vindo a referir clarifica que «a referência à CEDH visa tanto a Convenção como os respectivos protocolos», precisando ademais que «o sentido e o âmbito dos direitos garantidos são determinados não só pelos textos desses instrumentos mas também pela jurisprudência do TEDH e do TJUE», sendo possível à União garantir «uma protecção mais ampla» que «nunca poderá ser inferior ao nível garantido pela CEDH».

52 Desenvolvidamente neste sentido, cfr. Wolfgang Weiss, «Human rights in the EU: Rethinking the role of the European Convention on Human Rights after Lisbon», 7 European Constitutional Law Review (2011), p. 64-95 (69-70).

53 Sem que isso obste «a que o direito da União confira uma protecção mais ampla», acrescenta-se na disposição citada em texto.

54 E que, como o refere Wolfgang Weiss (op. cit. supra, nota 52) correspondem a metade das cinquenta disposições substantivas da Carta (p. 69).         [ Links ]

55 Assim Wolfgang Weiss, «Human rights in the EU: Rethinking the role of the European Convention on Human Rights after Lisbon» (cit. supra, nota 52), p. 71-72.         [ Links ]

56 Cfr. o artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, e a interpretação entre nós corrente sobre o lugar hierárquico do direito convencional recebido na ordem interna. A este último propósito, cfr. Moura Ramos, «A Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Sua posição face ao ordenamento jurídico português», Documentação e Direito Comparado, n.º 5 (1981), p. 93-195 (129-149).O que implica uma reconsideração, por esta via, do relacionamento entre a CEDH e os sistemas nacionais. A este respeito, cfr. a análise de Christoph U. Schmid, «The relationship between the European Convention on Human Rights and national legal systems: A reconstruction based on multi-level governance theory», inLa Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo e l’Ordinamento Italiano. Problematiche attuali e prospettive per il futuro (cit. supra, nota 5), p. 163-182.

57 Sobre esta problemática, cfr. Dean Spielmann, «Human rights case law in the Strasbourg and Luxembourg Courts: Conflicts, inconsistencies and complementarities», in The EU and Human Rights (cit. supra, nota 16), p. 757-780, Vincenzo Sciarabba, Tra Fonti e Corti. Diritti e principi fondamentali in Europa: profili costituzionali e comparati degli sviluppi sovranazionali, Padova, 2008, Cedam, Lech Garlicki, «Cooperation of courts: The role of supranational jurisdictions in Europe», 6 International Journal of Constitutional Law (July/October 2008), N.ºs 3 & 4, p. 509-530, Bruno Genevois, «La convention européenne des droits de l’homme et la Charte des droits fondamentaux de l’Union européenne: complementarité ou concurrence?», 26 Revue Française de Droit Administratif (mai-juin 2010), p. 437-444, e Cedric Ryngaert, «Oscillating between embracing and avoiding Bosphorus: the European Court on Human Rights on Member States responsibility for acts of international organizations and the case of the European Union», 39 European Law Review (2014), N.º 2, p. 176-192. Sobre o relacionamento entre as duas instâncias jurisdicionais, numa perspectiva mais geral, cfr. Denys Simon, «Des influences réciproques entre CJCE et CEDH: “je t’aime, moi non plus?”», in Pouvoirs, n.º 96 (Les Cours Européennes. Luxembourg et Strasbourg), p. 31-49, Angela Del Vecchio, Giurisdizione Internazionale e Globalizzazione. I tribunali internazionali tra glogallizzazione e frammentazione, Milano, 2003, Giuffrè, Neil Walker, «Beyond boundary disputes and basic grids: mapping the global disorder of normative orders», 6 International Journal of Constitutional Law (July/October 2008), N.ºs 3 & 4, p. 373-396, Michel Rosenfeld, «Rethinking constitutional ordering in an era of legal and ideological pluralism», ibidem, p. 415-455, e Giuseppe de Vergottini, Oltre il dialogo tra le Corti. Giudici, diritto straniero, comparazione, Bologna, 2010, Il Mulino.

58 Cfr. Wolfgang Weiss, «Human rights in the EU: Rethinking the role of the European Convention on Human Rights after Lisbon» (cit. supra, nota 52), p. 92.         [ Links ]

59 O sexto considerandum fala, efectivamente, em «aprofundar a solidariedade entre os seus povos, respeitando a sua história, cultura e tradições». Sobre este respeito pela identidade nacional, cfr., entre nós, Maria Luísa Duarte, «A Constituição Europeia e os direitos de soberania dos Estados-Membros – Elementos de um aparente paradoxo», in Estudos de Direito da União e das Comunidades Europeias, v. II (cit. supra, nota 1), p. 405-435 (414-421).

60 O que o TJUE de algum modo reconheceria no acórdão Omega (acórdão de 14 de Outubro de 2004, C-36/02, Colectânea, p. I-9609), ao aceitar que «a medida restritiva adoptada pelas autoridades de um Estado-Membro [não tenha de corresponder] (…) a uma concepção partilhada pela totalidade dos Estados-Membros no que respeita às modalidades de protecção do direito fundamental ou do interesse legítimo em causa», acrescentando que anteriores referências, na sua jurisprudência, a uma concepção comum não pretendiam «formular um critério geral para a apreciação da proporcionalidade de qualquer medida nacional que restrinja o exercício de uma actividade económica» (ponto 37). Para uma análise da jurisprudência pertinente, cfr. G. di Federico, «Identifying national identities in the case-law of the Court of Justice of the European Union», Il Diritto dell’Unione Europea, 4/14, p. 769-802.

61 Ainda que anteriormente elencados em documentos de valor jurídico menos efectivo, como a Carta comunitária dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

62 Sobre o ponto, cfr. Isabel Lirola Delgado, «Derecho de residência de los ciudadanos de la Unión y prestaciones sociales en tiempos de crisis: Hacia un planteamiento casuístico y ambíguo de la solidariedad entre los Estados miembros?», 18 Revista de Derecho Comunitario Europeo (septiembre-diciembre 2014), 49, p. 733-766. Para uma consideração mais alargada, cfr, recentemente, Catarina Santos Botelho, Os Direitos Sociais em tempos de crise – Ou revisitar as normas programáticas, Coimbra, 2015, Almedina.

63 Saliente-se, a propósito, a inclusão, naquela noção, da nota da intergeracionalidade. Sobre esta dimensão, entre nós, João Carlos Loureiro, «Fiat constitutio, pereat mundus? Neojoaquimismo, constitucionalismo e escassez», 70 Revista Portuguesa de Filosofia (2014), p. 231-260 (251-257), e Susana Tavares da Silva, «O problema da justiça intergeracional em jeito de comentário ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 187/2013», in Cadernos de Justiça Tributária, n.º 00 (Abr.-Jun. 2013), p. 6-18.

64 Cfr., por exemplo, as situações referidas supra, na nota 24.

65 Vejam-se os arestos citados supra, na nota 40.

66 Para uma visão geral, cfr. Miryam Rodríguez-Izquierdo Serrano, «El terrrorismo en la evolución del espacio de libertad, seguridad y justicia», 14 Revista de Derecho Comunitario Europeo (mayo-agosto 2010), 36, p. 531-559,         [ Links ] e Ben Chigara, «On the jurisprudential significance of the emergent state practice concerning foreign nationals merely suspected of involvement with terrorist offences», 16 Maastricht Journal of European and Comparative Law (2009), 3, p. 315-339.         [ Links ]

67 Sobre as medidas restritivas a este propósito adoptadas, cfr. C. Eckes, «EU restritive measures against natural and legal persons: Fom counterterrorist to third country sanctions», Common Market Law Review, 51 (june 2014), N.º 3, p. 869-906,         [ Links ] e, em particular, a jurisprudência Kadhi [acórdãos de 21 de Setembro de 2005, processo T-306/01, Colectânea, p. II-3533, de 3 de Setembro de 2008, processos apensos C-402/05 P e 415/05 P, Colectânea, p. I-6531, de 30 de Setembro de 2010, processo T-85/09, Colectânea, p. II-5177, e de 18 de Julho de 2013, processos C-584/10 P, C-593/10 P e C-595/10 P, ainda não publicado na Colectânea – a seu respeito, cfr. Panagiotis Tridimas, «Terrorism and the ECJ: Empowerment and Democracy in the EC legal order», 34 European Law Review (2009), p. 103-126, Conor Gearty, «In Praise of Awkwardness: Kadi in the CJEU», 10 European Constitutional Law Review (2014), p. 15-27, A. Cuyvers, «”Give me one good reason”: The unified standard of review for sanctions after Kadi II», Common Market Law Review, 51 (december 2014), N.º 6, p. 1579-1788, e, entre nós, Maria Luísa Duarte, «O Tribunal de Justiça da União Europeia e o controlo indirecto das decisões do Conselho de Segurança. Sobre os critérios relevantes de conciliação prática entre a luta contra o terrorismo internacional e a protecção dos direitos fundamentais», 13 Thémis (2013), n.ºs 24/25, p. 49-76]. Num âmbito mais geral, veja-se a análise de Vico Valentino, «La Giustizia penale convenzionale e l’oltranzismo dei controlimiti. Dall’euro-entusiasmo della prima ora all’ermeneutica della sorveglianza», in La Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo e l’Ordinamento Italiano. Problematiche attuali e prospettive per il futuro (cit. supra, nota 5), p. 253-279. Atente-se, por outro lado, na controvérsia suscitada pela Decisão-Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros, e às várias decisões dos Tribunais Constitucionais dos Estados-Membros que sobre ela ou a respectiva transposição se pronunciaram. Sobre o ponto, cfr., para uma visão geral, Dorota Leczykiewicz, «Constitutional conflicts and the third pillar», 33 European Law Review (april 2008), p. 230-242, e Sara Iglesias Sánchez, «La jurisprudência constitucional comparada sobre la orden europea de detención y entrega, y la naturaleza jurídica de los actos del Tercer Pilar», 14 Revista de Derecho Comunitario Europeo (enero-abril 2010), 35, p. 169-192, e, em particular para as questões postas pelas jurisdições constitucionais dos Estados-membros, cfr., sobre o caso italiano (inicialmente processos 102-103/2008), Luísa Marin, «The European arrest warrant and domestic legal orders. Tensions between mutual recognition and fundamental rights: The Italian case», 15 Maastricht Journal of European and Comparative Law (2008), 4, p. 473-492, Marco Dani, «Tracking judicial dialogue: The scope for preliminary rulings from the Italian Constitutional Court», 16 Maastricht Journal of European and Comparative Law (2009), 2, p. 149-170, C. Amalfitano, «Il mandato d’arresto europeo nuovamente al vaglio della Consulta», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/11, p. 183-199, E. Pagano, «Le posizioni della Corte di giustizia e della Corte costituzionale sulla non corretta trasposizione della decisione quadro sul mandato d’arresto», Il Diritto dell’Unione Europea, 1/12, p. 83-105, e Oreste Pollicino, «From partial to full dialogue with Luxembourg: The last cooperative step of the Italian Constitutional Court», 10 European Constitutional Law Review (2014), p. 143-153; para o caso espanhol (acórdão de 26 de Fevereiro de 2013, Melloni, processo C-399/11, Colectânea, p. I-107), vejam-se Fernando Castillo de la Torre/Petra Nemeckova, «Cronica de Jurisprudencia del Tribunal de Justicia de la Unión Europea. Enero-abril 2013», 17 Revista de Derecho Comunitario Europeo (mayo-agosto 2013), 45, p. 779-830 (779-783), Nik De Boer, «Addressing rights divergences under the Charter: Melloni», Case note on Case C-399/11», 50 Common Market Law Review (2013), p. 1083-1103, Beatriz Garcia Sanchez, «Homogeneidad o estandar mínimo de protección de los derechos fundamentales en la Unión Europea», 17 Revista de Derecho Comunitario Europeo (septiembre-diciembre 2013), 46, p. 1137-1156, e Leonard F. M. Besselink, «The parameters of constitutional conflict after Melloni», 29 European Law Review (August 2014), p. 531-552; e, para o caso francês, François-Xavier Millet, «How much lenience for how much cooperation? On the first preliminary reference of the French Constitutional Council to the Court of Justice», 51 Common Market Law Review (2014), p. 195-218, Jérome Roux, «Premier renvoi préjudiciel du Conseil Constitutionnel à la Cour de Justice et conjonction de dialogues des juges autour du mandat d’arrêt européen», RTDEur. (juillet-septembre 2013), p. 531-557, e Arthur Dyevre, «If you can’t beat them, join them. The French Constitutional Court first reference to the Court of Justice (Jeremy F. v. Premier Ministre, 4 April 2013)», 10 European Constitutional Law Review (2014), p. 154-161). [Diferentemente, como se sabe, as relações entre o Bundesverfassungsgericht e o TJUE têm tido por objecto questões de outra natureza – assim o acórdão de 16 de Junho de 2015, Gauweiler, C-62/14, ainda não publicado na Colectânea: sobre este aresto, cfr. Asteris Pliakos, «Le premier renvoi préjudiciel de la Cour constitutionnelle allemande à la CJUE: un pas en avant, deux pas en arrière?», Revue de l’Union Européenne, N.º 584 (janvier 2015), p. 41-50, Dariusz Adamski, «Economic constitution of the euro area after the Gauweiler preliminary ruling», Common Market Law Review, 52 (2015), 6, p. 1451-1490,         [ Links ] e Michelle Everson, «An exercise in legal honesty: Rewriting the Court of Justice and the Bundesverfassungsgericht», 21 European Law Journal (2015), 4, p. 474-499;         [ Links ] e sobre a problemática a que nos referimos acima, na nossa ordem jurídica, cfr. Pedro Caeiro/Sónia Fidalgo, «O mandato de detenção europeu na experiência portuguesa: tópicos da primeira década», in Temas de Extradição e Entrega (coordenador: Pedro Caeiro), Coimbra, 2015, Almedina, p. 159-194.] Ainda sobre a problemática das relações entre estas jurisdições, cfr. V. Skouris, «Les rapports entre la Cour de Justice et les jurisdictions constitutionnelles nationales», Il Diritto dell’Unione Europea, 4/2009, p. 775-787, e Maria Rosaria Donnarruma, «Il processo di “costitutionalizzazione” della Unione Europea e la tensione dialettica tra la giurisprudenza della Corte di Giustizia e le giurisprudenze delle Corte Costituzionali», 20 Rivista Italiana di Diritto Pubblico Comunitario (2010), p. 407-449; e para as dificuldades de um diálogo similar com o Tribunal de Estrasburgo, cfr. Francesco Viganò, «Convenzione Europea dei Dirittti dell’Uomo e resistenze nazionalistiiche. Corte Costituzionale italiana e Corte Europea. Tra “Guerra” e “Dialogo”. Qualche osservazione dall’angolo visuale di un penalista», in La Convenzione Europea dei Diritti dell’Uomo e l’Ordinamento Italiano. Problematiche attuali e prospettive per il futuro (cit. supra, nota 5), p. 207-251.

68 Sobre o ponto, cfr. F. Ferretti, «Data protection and the legitimate interest of data controllers: Much ado about nothing or the winter of rights?», Common Market Law Review, 51 (june 2014), N.º 3, p. 843-868,         [ Links ] O. Lynskey, «The Data Retention Directive is incompatible with the rights to privacy and data protection and is invalid in its entirety: Digital Rights Ireland», Common Market Law Review, 51 (december 2014), N.º 6, p. 1789-1812,         [ Links ] Maria Isabel Gonzalez Pascual, «El TJUE como garante de los derechos en la UE trás la sentencia Digital Rights Ireland», 18 Revista de Derecho Comunitario Europeo (septiembre-diciembre 2014), 49, p. 943-971,         [ Links ] e Gloria González Fuster, The Emergence of Personal Data Protection as a Fundamental Right of the EU, Vienna, 2014, Springer.

69 Veja-se a decisão do Bundesverfassungsgericht de 24 de Abril de 2013, a propósito da organização, no plano da União, de um ficheiro de luta antiterrorista [a propósito, cfr. Olivier Joop, «Jurisprudences nationales intéressant le droit de l’Union européenne», RTDEur. (janvier-mars 2014), p. 225-248 (228-232)].

70 Visibilidade que se reflectiu, inter alia, na problemática das fronteiras da União e do seu regime. Cfr., a propósito, Nuno Piçarra, «A crise nas fronteiras (dos Estados-membros) da União Europeia: Causas e soluções», in A crise e o Direito [Jorge Bacelar Gouveia/Nuno Piçarra (coordenadores)], Lisboa, 2013, Almedina, p. 137-178. E, para a caracterização da situação inicial a este propósito, veja-se Bruno Nascimbene, «Lo “spazio Schengen”: Libertà di circolazione e controlli alle frontiere esterne», in Divenire Sociale e Adeguamento del Diritto. Studi in Onore di Francesco Capotorti, II – Diritto dell’Unione Europea, Diritto Internazionale Privato, Diritto Pubblico, Milano, 1999, Giuffrè, p. 307-318.

71 Reconhecimento que não inclui, naturalmente, os direitos incluídos no Título V da Carta (Cidadania), artigos 39.º a 46.º.

72 Sobre o estatuto desta categoria de pessoas em face do direito da União, cfr. Gregor Noll/Jens Vedsted-Hansen, «Non-Communitarians: Refugee and Asylum Policies», in The EU and Human Rights (cit. supra, nota 16), p. 359-410, Blanca Vilá Costa, «The quest for a consistent set of rules governing the status of non-Community nationals», ibidem, p. 411-446, e, entre nós, Àlvaro Castro Oliveira, Third Country Nationals and European Union Law, Florença, 1996, Instituto Universitário Europeu, «A Segurança Social de Nacionais de Países Terceiros residentes na União Europeia: o Direito, a Igualdade e a Utopia (comentário de Jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. A propósito do acórdão de 15/1/1998, Henia c. Bélgica, Processo C-113/97)», 2 Temas de Integração (1997), n.º 4, p. 125-137, «The Position of Resident Third Country Nationals: Is it too early to grant them Union Citizenship?», in AAVV, European Citizenship: An Institutional Challenge (edited by Massimo La Torre), The Hague, 1998, Kluwer Law International, p. 185-199, e «Immigrants from Third Countries under EC External Agreements: The Need for Improvement», 4 European Foreign Affairs Review (1999), p. 215-233 e Miguel Gorjão Henriques, «A Europa e o ‘Estrangeiro’: Talo(s) ou Cristo?», 3 Temas de Integraç?o (1998), n.º 6, pp. 23-50.

73 Cfr. o conjunto de estudos inseridos em Managing Migration Flows and Preventing Illegal Immigration. Schengen – Justice and Home Affairs Colloquium (Edited by Cláudia Faria), Maastricht, 2002, European Public Administration Institute, e, mais recentemente, François Crépeau/Bethany Hastie, «The case for “firewall” protections for irregular migrants. Safeguarding fundamental rights», 17 European Journal of Migration and Law (2015), p. 157-183, P. De Bruycker/S. Mananashvili, «Audi alteram partem in immigration detention procedures, between the ECJ, the ECtHR and Member States: G & R», Common Market Law Review, 52 (april 2015), N.º 2, p. 569-590, e D. Acosta Arcarazo, «The Charter, detention and possible regularization of migrants in an irregular situation under the Return Directive: Mahdi», Common Market Law Review, 52 (october 2015), N.º 5, p. 1361-1378.

74 Sobre o ponto, cfr. Eleanor Drywood, «Who’s in and who’s out? The Court’s emerging case-law on the definition of a refugee», Common Market Law Review, 51 (august 2014), N.º 4, p. 1093-1124, e, para uma abordagem mais geral, Who is a Refugee? A Comparative Case Law Study [Jean-Yves Carlier/Dirk Vanheule/Klaus Huumann/Carlos Peña Galiano (Eds.)], The Hague, 1997, Kluwer Law International. *Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e Investigador no Instituto Jurídico da mesma Faculdade. Membro do Institut de Droit International. Presidente Emérito do Tribunal Constitucional de Portugal. Antigo Juiz do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (hoje, Tribunal Geral da União Europeia).