1. Introdução
Ao orbitamos múltiplas eras que coadunam em acontecimentos e impactos diferentes para os diversos agentes sociais, com ênfase para a era tecnológica que exacerba os sentidos que uma marca, produto, território, organização, espaço físico, serviço ou pessoa pode desencadear, refletindo em um processo de pertencimento e apropriação, nos deparamos com a percepção de que as pesquisas qualitativas, sobretudo as pesquisas empíricas ou pesquisas de campo, como também são denominadas, têm se modificado em sua operacionalização e, para tanto, tem se apropriado das tecnologias para se valer e efetivamente acontecer.
Como exemplo, podemos pensar no que se tem feito nas pesquisas de caráter etnográfico. Desenvolvidas originalmente por Franz Boas e Bronislaw Malinowski - especialmente o segundo, esse tipo de pesquisa foi completamente alterado com a popularização das ações das redes sociais digitais, que transformaram a pesquisa etnográfica em pesquisa etnográfica digital ou Netnográfica, como define Soares & Stengel (2021).
Essa mudança de cenário, de repertório e de processo, alterou a relação do pesquisador com o objeto da pesquisa e, em última instância, alterou também a relação com a própria pesquisa. Em estudos realizados por Tuzzo et al. (2023) sobre a dialogicidade da pesquisa qualitativa em relação à pesquisa quantitativa, já havia indicações, mesmo que de modo superficial, da necessidade de se aprofundar os estudos sobre a dialogicidade da pesquisa qualitativa, não apenas em relação a outras modalidades de pesquisa, mas, sobretudo, na relação do pesquisador com o objeto e com a pesquisa propriamente dita, cuja aproximação se daria pelos sentidos humanos.
Do ponto de vista da metodologia, este artigo tem na pesquisa qualitativa sua base de desenvolvimento e privilegia aspectos bibliográficos em sua construção. Tendo como objetivo discutir a dialogicidade da pesquisa qualitativa com os sentidos humanos - audição, olfato, paladar, visão e tato e como os sentidos podem ser compreendidos como categorias fundamentais em um desenho metodológico aplicada às pesquisas qualitativas de modo empírico.
Em outros termos, busca-se discutir como os sentidos humanos têm sido resgatados, ou pelo menos deveriam, no intuito de proporcionar a compreensão e a identificação de realidades, muitas vezes negligenciadas em função do uso exacerbado das tecnologias em detrimento do contato humano; do olhar presencial; sem que com esse olhar, tenhamos uma posição contrária ao uso das tecnologias como mecanismos auxiliares no processo de pesquisa, sobretudo, nos processos de organização e análises de dados. Inclusive reconhecendo que a tecnologia é necessária, inevitável e tem se tornado aliada importante na construção do conhecimento científico.
Para isso, busca responder à pergunta central: Podem os sentidos humanos serem compreendidos como categorias fundamentais em metodologias aplicadas às pesquisas qualitativas de modo empírico?
2. A dialogicidade da pesquisa
Tomamos como referência inicial a obra emblemática de Ivana Marková (2006) Dialogicality and Social Representations - The Dynamics of Mind (Dialogicidade e representações sociais: as dinâmicas da mente), cuja abordagem inquieta a todos, quando a autora expressa sua preocupação, no conjunto da obra, especialmente com o trabalho do pesquisador e o quanto o seu trabalho pode ser influenciado (ou não) pela cultura e pelas tradições da sociedade; pelas nuances do mundo social.
Tuzzo e Braga (2016, 2022) já alertavam sobre a importância de se compreender o mundo social, para que fosse possível dialogar, opinar, defender e construir a vida em todos os sentidos. Os autores arriscavam dizer à época que nunca foi tão importante colaborar com a construção da cidadania e que cabe à pesquisa, sobretudo, empírica, esse papel; que a pesquisa, de modo organizado, pode revelar aspectos importantes da existência humana e das coisas do mundo.
Neste sentido, coloca-se em questão como construir esse “novo” mundo, esses novos olhares, se omitimos, negligenciamos aspectos fundantes do seu funcionamento? Aspectos perceptíveis apenas no modo presencial, onde apenas os sentidos humanos são capazes de identificar, compreender e analisar.
Aqui o diálogo entre tipos clássicos de pesquisa (qualitativa e quantitativa) conforme defendido pelos autores, parece óbvio, pois se tornou obrigatório, necessário. O que se defende nesse artigo é o diálogo entre a pesquisa, o objeto e os sentidos humanos utilizados, que aqui se caracterizam como instrumentos desse diálogo. Em outros termos defende-se a utilização dos sentidos, não apenas como instrumentos naturais do pesquisador em um processo aplicado à pesquisa, mas, sobretudo, como categorias de uma metodologia dos sentidos.
Sodré (2006) ao interpretar a forma macluhiana com a profecia da era do sensível, revela uma lógica sensível e coloca no centro a sensibilidade, e ao fazê-lo, resgata a importância dos sentidos humanos. Prova desta interpretação foi constatada por Tuzzo (2016) em sua pesquisa sobre a leitura de jornais impressos.
Tuzzo (2016) constata que os motivos da continuidade de leitura de jornal impresso em uma sociedade digital, apontam que as questões sensoriais são responsáveis por uma manutenção de hábitos e de sentidos que extrapolam o próprio consumo de notícias, o que justifica, em tese, que, apesar das diversas preconizações de que o jornal impresso (e as publicações impressas de um modo geral) acabariam… não acabaram! Mas é fato que estão em processo de adaptação constante. Um dos exemplos é a leitura de jornais on-line e, sobre isso, a inclusão do som de virar as páginas semelhantes ao jornal físico que foi incorporado aos dispositivos móveis, a fim de que esse recurso sonoro seja mantido com as novas tecnologias.
Aqui, a pesquisa revela não apenas a importância dos sentidos humanos no que diz respeito à leitura de jornais, como revela que resultados como estes não seriam possíveis do ponto de vista da pesquisa se ela (a pesquisa) não fosse empírica e realizada utilizando os sentidos.
Revela ainda que os mesmos sentidos têm sido resgatados e privilegiados no comportamento humano no que diz respeito ao consumo de produtos midiáticos, por exemplo. Seria possível afirmar que estamos na Era dos Sentidos?
Em outras palavras, cabe à pesquisa caminhar em várias direções e colocar o objeto no centro deste diálogo, e, para tanto, privilegiando os sentidos humanos como um ferramental importante neste processo.
Ao colocar a pesquisa nesta perspectiva, de eleger os sentidos como um ferramental imprescindível no processo de pesquisa, não descartamos, nem tampouco descredenciamos outras possibilidades, como a própria pesquisa em redes sociais, o que facilita e permite o diálogo intermediado pelos meios, como define Thompson (2018) ao construir seu tratado teórico sobre a interação mediada on-line e o papel das redes sociais digitais.
Todavia, nos interessa de modo particular a utilização dos sentidos como categorias de um desenho metodológico aplicado à pesquisa qualitativa.
Afinal, como afirma Linhares (2021), a complexidade dos problemas sociais e a crítica à redução racionalista do positivismo e da ciência moderna traz à tona reflexões sobre a capacidade do modelo de ciência moderna resolver os problemas da sociedade contemporânea com os mesmos procedimentos metodológicos propostos pelo racionalismo cartesiano.
3. Os sentidos humanos e a pesquisa qualitativa
Um fotógrafo-artista me disse uma vez: veja que o pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar. Falou mais: que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balança, nem com barômetro etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.
Sobre Importâncias - Manoel de Barros (2006).
A poesia acima, destacada nesse artigo, possui uma função ilustrativa, do quanto os sentidos podem ser despertados por diferentes formas, mas também representa aqui a função de nos mostrar que, muitas vezes, são os detalhes que transmitem uma mensagem e que esta mensagem pode ser compreendida pelo recepctor (pesquisador) de forma distinta, respeitando os valores e as paixões de cada ser humano.
Assim, Manoel de Barros, como é próprio dos poetas e das poesias, sintetiza em poucas linhas o papel do investigador, mostrando que é no encantamento, neste artigo referenciado pelos sentidos humanos, que muitas vezes está a expressão e o significado daquilo que o investigado quer transmitir.
Não está necessariamente na palavra escrita ou pronunciada, mas no sorriso, no gesto, na lágrima, no toque, mas também pode estar na necessidade de se ver o que se pensa e de se ouvir o que se vê!
Pesquisas realizadas por Martins et al. (2021), apresentam resultados positivos com uma metodologia de pesquisa baseada em ver o que se pensa.
Na técnica, os investigadores solicitam que pacientes em terapia com psicólogos não só descrevam suas inquietações, mas solicitam que escrevam essas inquietações em papeis tipo post-it e montem uma representação visual para que possam ver o problema. Assim, o paciente deve escrever seu nome no centro de uma esfera de inquietações e colar post-its em volta para que veja os problemas, mais do que sentir os problemas ou pensar sobre eles.
A representação visual, segundo a pesquisa, resignifica a própria relação que o ser humano tem com suas experiências e seus sentimentos.
A mercadologia moderna, assim como a Psicologia, já entendeu a importância dos sentidos, como o clube de assinaturas de livros, comum no século passado, chamado de "clube do livro" e que ganha força com pessoas que passam a pagar uma mensalidade para receberem um presente em casa, uma caixa com um livro, cuidadosamente selecionado por um curador, marcadores de livro e outros mimos feitos para colecionadores ou apaixonados pela leitura em papel. Aqui a visão e o tato são privilegiados e a própria periodicidade da entrega pode aumentar a euforia com relação ao livro.
No estudo da marca Abercrombie & Fitch, 97% dos inquiridos afirmaram que o aroma influencia o seu sentimento de pertença à marca e que existe uma forte associação aroma-marca, comprovando o impacto do marketing olfativo como uma estratégia eficaz, no que diz respeito a uma comunicação eficiente e memorável sobre os seus valores e personalidade. (Brito e Duarte, 2023).
Nesta linha de pensamento, a marca de roupas Ambrô - Brasil, que desponta no mercado de vendas de roupas online, lançou o perfume Ambrô Deo Colônia, tendo como apelo de vendas a ideia de que agora os consumidores teriam um novo jeito de estar com a Ambrô todos os dias.
No Instagram da marca (useambro), o perfume foi lançado com o seguinte apelo de vendas: “Perfume Ambrô. Uma nova era se inicia; Ambrô Beauty, um novo jeitinho de estar sempre com você […] o aroma que está fazendo a cabeça das ambrô lovers”.
A BMW ao desenvolver o seu modelo elétrico teve atenção para o aspecto de um dos grandes apelos dos amantes da marca, ou seja, o som do motor, item perdido na versão de carros elétricos. A experiência que o motor a combustão proporciona com o aroma, a vibração e o som do motor é uma preocupação na versão elétrica.
Assim, para que a experiência do som não fosse comprometida, alterando uma das características da marca, a BMW buscou reproduzir sons de forma sintética e com um caráter próprio. Para isso chamou o compositor Hans Zimmer para desenvolver o aspecto sensorial do carro elétrico (Autopapo - Uol, 2021).
Deste modo, assim como a Mercadologia e a Psicologia, também a pesquisa tem ficado atenta à importância dos sentidos. As facilidades oferecidas pela rede mundial de computadores não dão conta dos detalhes percebidos pelos sentidos. Assim, o ouvir, o olhar, o sentir, o cheirar e o degustar ainda são privilégios dos sentidos humanos; reações não contempladas pela inteligência artificial que, no máximo, consegue ressignificá-los.
Sá (2005), em seu texto “Os sentidos na pesquisa acadêmica”, de modo absolutamente inspirador, nos alerta que nada que existe do lado de fora do nosso corpo, no mundo social, entra gratuitamente e de modo direto em nossa mente. Tudo é mediado pelos sentidos e pelo cérebro. Aqui os canais e redes sociais digitais passam a ser coadjuvantes. O protagonismo é o sensorial.
O autor (SÁ, 2005, p. 179), ainda se inquieta e nos inquieta ao questionar: “Visão, tato, paladar, olfato e audição podem nos ajudar a desmontar a engrenagem da máquina cartesiana de fazer ciência social. Será que estamos fazendo uso adequado dos sentidos na atividade acadêmica?”.
Complementamos questionando: Será que estamos fazendo uso adequado dos sentidos na realização da pesquisa?
Tudo leva a crer que não! Migramos muito rapidamente para o mundo tecnológico e muitas vezes terceirizamos à tecnologia nossas curiosidades e interesses. Ficamos à mercê da interpretação que a tecnologia nos oferece. A exemplo do que fazem os algoritmos quando despretensiosamente navegamos nas redes sociais digitais.
E retomamos a questão central desse artigo: Podem os sentidos serem compreendidos como categorias fundamentais em metodologias aplicadas às pesquisas qualitativas de modo empírico?
E pensamos que sim, que os sentidos não podem ser negligenciados na pesquisa qualitativa, tanto na busca, quanto na interpretação dos dados, interferindo em todo processo de construção da pesquisa.
Tomamos, como ponto de partida na construção dos sentidos como categorias, a visão. Ao criarmos visões de mundo a partir daquilo que vemos, colocamos a visão no centro do debate e atribuímos à ela (à visão), a centralidade da nossa capacidade de compreender os fenômenos do mundo, já que visão e cognição são atividades centrais na atividade científica.
O tato na pesquisa acadêmica são os olhos nas pontas dos dedos. Aqui visão e tato se confundem no ato de reconhecer o mundo. Por outro lado, o olfato nos apresenta os aromas do mundo social.
O ‘olfato’ pode propiciar ao pesquisador ‘sentir o cheiro’ daquilo que é importante, mas que não está ao alcance da ‘visão’ ou possa ser ‘tateado’ - o que há, de fato, por trás da ação, o simbólico, o que realmente pode explicar a interação humana e apenas foi ‘deixado no ar’ [...]. (SÁ, 2005, p. 178).
O olfato ao se unir à visão e ao tato, possibilita, no processo de pesquisa, mais do que um cheiro bom, mas desperta aquilo que já acontece na vida, ou seja, alimentar-se pelos aromas, pela visão, e não apenas pelo paladar. Assim também é na pesquisa.
Por fim, na pesquisa, o escutar significa captar aquilo que está para além do dito e pode estar escondido nas entrelinhas do discurso, do texto, das falas dos interlocutores. Como diz Sá (2005, p. 179): Visão, tato, paladar, olfato e audição podem nos ajudar a “desmontar a engrenagem” da máquina cartesiana de fazer ciência [...]. Será que estamos fazendo uso adequado dos “sentidos” na atividade [...] de pesquisa?
4. Metodologia dos sentidos
Desenvolvido a partir da perspectiva qualitativa, este artigo elegeu a pesquisa do tipo bibliográfica em sua construção, além de exemplos de organizações que já adotam a relação sensorial para seus produtos e relacionamento com os públicos. Assim, buscou construir uma proposta metodológica também de caráter qualitativo com o objetivo de incorporar os sentidos como categorias de análise no processo de pesquisa qualitativa de modo empírico, no campo. Importante salientar que o presente estudo contempla uma proposta em fase de exploração, ou como diz Silva et al. (2018), uma proposta que coloca o pesquisador em contato com o mundo, abrindo possibilidades de pesquisa.
Ao elaborar o desenho metodológico que se pretende, o fizemos em fases, permitindo ser utilizado na íntegra ou em partes. Ficando a critério do pesquisador ou mesmo da pesquisa.
4.1 Fases da Metodologia dos Sentidos
Fase 1 - Identificação do objeto: aqui o pesquisador define o seu objeto de pesquisa, tendo o cuidado de que este objeto ocorra no campo social, permitindo o contato com a equipe de pesquisadores;
Fase 2 - Qualificação da pesquisa: qualificar a pesquisa é validar o seu objeto e garantir o acesso ao mesmo de modo empírico. Por se tratar de uma metodologia que privilegia os sentidos humanos como categorias, a pesquisa se qualifica como qualitativa;
Fase 3 - Nesta fase o pesquisador tem ao seu dispor um cardápio de possibilidades de métodos de coleta. Reconhecemos a validade de todos, mas privilegiamos aqueles que colocarão o pesquisador em contato com o objeto e seus interlocutores, como por exemplo: observação participante; observação não participante; diário de campo; grupos focais; entrevistas estruturadas; entrevistas semiestruturadas e não estruturadas;
Fase 4 - Escolha das categorias: as categorias do método são definidas a priori e poderão ser utilizadas na íntegra ou apenas parte delas: audição, visão, tato, olfato e paladar. As escolhas das categorias são orientadas em função dos objetivos da pesquisa e do problema de pesquisa previamente elaborado e, sobretudo, daquilo que cada categoria pode oferecer quando da coleta de dados;
Fase 5 - Organização das Categorias e Análise: Todos os discursos obtidos na coleta devem ser organizados de modo categorial, ou seja, associado a cada categoria, permitindo uma estruturação do texto coletado em categorias. A partir desta organização, procede-se às análises, observando o que cada categoria revela em termos discursivos e qual o papel de cada sentido/categoria no que se refere ao problema da pesquisa. Abaixo são descritas as categorias desta fase 5:
- Categoria 5.1 - Audição: Diz respeito à audição como sentido prioritário na sua obtenção e ou na sua divulgação, como por exemplo - ouviu dizer; disse e não escutou; repetiu várias vezes; não ouvia muito bem; muito barulho etc.
- Categoria 5.2 - Paladar: Se refere à capacidade de expressão daquilo que o paladar revela, como por exemplo: degustou; experimentou muitas vezes; comeu; alimentou; fome etc.
- Categoria 5.3 - Tato: Diz respeito ao toque. Ao ato de se aproximar, encostar, tocar, apontar, indicar.
- Categoria 5.4 - Olfato: Se relaciona aos cheiros e tudo aquilo que ele representa, como por exemplo - Muito cheiro, sem cheiro, com cheiro. Cheiros diferentes; mau cheiro, cheiro bom, ausência de cheiro; cheiro e lembranças, memória olfativa.
- Categoria 5.5 - Visão: Se relaciona com imagens, desenhos, formas geométricas, vídeos, fotografias, figuras e toda forma de representação para e pelo olhar.
Fase 6 - Na última fase se privilegia o entendimento daquilo que foi sumarizado nas categorias disponíveis e se coloca em diálogo estes resultados com as teorias disponíveis, lembrando que o uso de todas as categorias (ou não) é definido pelo pesquisador em diálogo com o objeto da pesquisa.
Abaixo apresentamos o Mapa da Metodologia dos Sentidos, com a representação do fluxo de aplicação e utilização da Metodologia dos Sentidos.
5. Considerações finais
Sá (2005), afirma que o cérebro não se apresenta ao mundo de forma passiva, mas interpreta a realidade do ponto de vista de quem observa. Para o autor, todo estímulo externo entra indiretamente na mente após ser mediado pelos sentidos.
Concordamos com o autor que os sentidos são capazes de alterar uma percepção e, por consequência, a forma como a pesquisa qualitativa, sobretudo pelas metodologias de coleta que envolvem imagens, sons, conversas e observações, poderá ser desenvolvida, impactando, é claro, nos próprios resultados.
Não se trata de pensar em uma ação humana que interfere nos resultados por problemas de coleta, mas na ação humana que interfere nos resultados pelos sentidos, por aquilo que é próprio da interpretação, que neste artigo colocamos como os sentidos na interação e impacto nas pesquisas.
Se retomamos a questão central desse artigo: Podem os sentidos serem compreendidos como categorias fundamentais em metodologias aplicadas às pesquisas qualitativas de modo empírico?
Pensaremos que sim, que os sentidos podem ser categorizados e que podem ser complementares às pesquisas com várias coletas de dados, mas também como processo de coleta e interpretação primários, levando o pesquisador a observar os fenômenos sociais a partir dos sentidos humanos.
Afinal, como afirma Fernando Pessoa (1946), somos capazes de ouvir também com os olhos:
O Guardador de Rebanhos
Sou um guardador de rebanhos,
O rebanho é os meus pensamentos e os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
e com as mãos e os pés e com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la e comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor me sinto triste de gozá-lo tanto, e me deito ao comprido na erva, e fecho os olhos quentes,
sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
sei a verdade e sou feliz.