Doente do sexo feminino, com 67 anos de idade, recorre ao Serviço de Urgência por lombalgia bilateral com irradiação abdominal, anorexia e edema dos membros inferiores.
O quadro tem início no mês anterior, após internamento por desidratação secundária a diarreia crónica iatrogénica. A venografia por tomografia computorizada (TC) (Fig. 1) revela extensa trombose do eixo iliocava e de ambas as veias renais. Após investigação etiológica, admite-se a desidratação grave recente como fator desencadeante.
A doente tem alta clínica após evolução favorável sob anticoagulação, mantendo seguimento em ambulatório.
Um ano mais tarde, ainda sob anticoagulação oral, é internada por quadro de dor abdominal, anorexia, fadiga e sensação de peso nos membros inferiores, com três semanas de evolução. A venografia por TC (Fig. 2) não mostra sinais de trombose venosa profunda (TVP). Contudo, documenta-se estenose contínua do eixo iliocava, interpretada como sequelar à trombose prévia, assim como desenvolvimento de colaterais venosos ao longo da parede abdominal anterior. Após terapêutica sintomática, a doente tem alta clínica, acabando por perder o seguimento.
A trombose da veia cava inferior é uma forma rara de TVP, constituindo um desafio diagnóstico pela sua apresentação inespecífica.1 Impõe-se a exclusão de doença neoproliferativa subjacente, responsável por 37,4% dos casos,2 bem como de trauma abdominal, lesão vascular iatrogénica, anomalias congénitas, e dos clássicos fatores desencadeantes de TVP.1,3-5 O diagnóstico é imagiológico, sendo que a venografia por TC é considerada o método de eleição, sobretudo em contexto de urgência.4 O protocolo de aquisição inclui uma fase venosa sistémica (cerca de 100-120 segundos após a administração endovenosa de contraste) que, perante a suspeita de trombose tumoral, poderá ser precedida pelas fases pré-contraste e arterial dominante. Desta forma, a venografia por TC permite caracterizar o trombo como simples ou tumoral, definir a sua extensão, e ainda excluir potenciais fatores desencadeantes.4,5 Mesmo após terapêutica otimizada, os doentes poderão desenvolver alterações sequelares, como estenose pós-trombótica e membranas intra-cava. Para além da morbilidade associada, a estase e a turbulência de fluxo perpetuam o risco trombótico, pelo que o controlo evolutivo imagiológico é essencial.3
Em casos de estenose sintomática, poderá considerar-se angioplastia com balão e colocação de stent.1,6