1.Introdução
De maneira geral, realizar pesquisas com foco na identificação de particularidades associadas aos processos interacionais efetivados através da mediação das tecnologias da informação e comunicação (TICs) requer, do pesquisador, destreza e habilidade de explorar, de maneira estimulante, diversas possibilidades metodológicas, visando ajudá-lo na compreensão acerca das especificidades do fenômeno. Contudo, é preciso considerar que, dadas as características próprias dos ambientes digitais, a investigação nestes espaços não deixa de ser desafiadora também, uma vez que adaptações, transposições e reconfigurações dos procedimentos de condução da pesquisa acabam se mostrando comumente necessárias. Dentre as particularidades dos ambientes digitais que influenciam na composição da dinâmica dos processos interacionais, destacamos a interatividade (que é influenciada por condicionantes técnicos e ações de algoritmos) e a estrutura temporal (que pressupõe uma conexão constante e acessibilidade a várias mídias simultaneamente). Há ainda novas configurações de pistas sociais (que são percebidas através de recursos oferecidos pelas ambiências), de armazenamento (que viabiliza o resgate de informações em qualquer momento), de alcance das audiências (que foge ao controle do usuário) e de mobilidade (que viabiliza a ocorrência de interações em qualquer tempo e em qualquer lugar) (Amaral & Nunes, 2017; Baym, 2010; Constantino, 2018; Marwick & Boyd, 2011; Turkle, 2018). Os ambientes digitais são vistos por diversos estudiosos da área como espaços que podem gerar contribuições importantes para os mais diversos campos do saber (Birnbaum, 2004; Goslin & Mason, 2015; Shaughnessy, Zechmeister & Zechmeister, 2012), já que favorecem a observação das relações entre tecnologia, meios de comunicação e interações sociais, como explicado por Molina (2013). Para tal, Fragoso, Recuero e Amaral (2011) salientam a necessidade de adaptação dos métodos tradicionais em pesquisas no âmbito das ciências sociais para que as particularidades que envolvem os contextos digitais sejam também consideradas. Sendo assim, os caminhos mais seguros para que o pesquisador possa realizar investigações em ambientes digitais conduzem a uma descrição criteriosa do desenho metodológico empregado, uma vez que esses espaços implicam em escolhas cuidadosas de estratégias para coleta e análise de dados. Neste sentido, é esperado que as informações colhidas possam ser interpretadas de modo a levar em consideração as particularidades envolvidas (Fragoso, Recuero & Amaral, 2011; Oliveira et al, 2017). Uma das estratégias utilizadas para analisar dados em ambientes digitais é a observação. Trata-se de um método que surge nas pesquisas em ciências sociais como alternativa para suprir as demandas exigidas por um período marcado pelos avanços tecnológicos derivados da revolução industrial ocorrida no final do século XIX e início do século XX. A modalidade não participante define um meio de sanar as limitações e restrições que os pesquisadores encontravam ao se inserirem em um lócus de pesquisa, fornecendo maior rigor à análise e aos resultados coletados. A possibilidade de ver e rever repetidamente o fenômeno, que é inclusive ampliada e facilitada em ambientes digitais, propicia ao pesquisador identificar padrões de interação que fornecem uma base mais robusta para o rigor empírico necessário (Marietto, 2018). Diante destes aspectos, a nossa questão de investigação adotada foi: como estruturar matrizes de referências para observações não participantes associadas a registros de diários de campos que têm como objetivo investigar os processos interacionais de apresentação de si na plataforma digital Instagram? A partir dela, os recursos das matrizes foram criados e aplicados na pesquisa “Apresentação de Si de Adolescentes Obesas na Plataforma Digital Instagram”, e suas utilizações nos permitiram refletir sobre as necessárias adaptações, discussões, alinhamentos e compreensões acerca de como empregar métodos que não apenas possam auxiliar na obtenção dos objetivos pretendidos, como também possam ser formulados de modo a considerar os recursos e condicionantes técnicos que integram a plataforma escolhida.
2. Lócus e Estruturação do Estudo Apresentação de Si de Adolescentes Obesas na Plataforma Digital Instagram
O estudo teve como objetivo principal analisar o processo de apresentação de si realizado por adolescentes obesas na plataforma digital Instagram. Dentre as plataformas digitais, a escolha pelo Instagram justificou-se pelo fato desta ser a mais relevante dentre aquelas que possuem o foco na imagem, além do amplo uso por jovens brasileiros, conforme apontam pesquisas como Juventudes e Conexões (2019), da Fundação Telefônica Vivo, e TIC Kids Online (2019), do Comitê Gestor da Internet no Brasil. O Instagram foi fundado em 2010 por Kevin Systrom e Mike Krieger, com o intuito de viabilizar o compartilhamento de imagens (dentro de uma estética próxima das fotos instantâneas), bem como de ampliar a conexão e a interação entre os usuários, aproximando-os de suas preferências (tanto de pessoas quanto de coisas), oferecendo uma série de recursos para auxiliá-los nesse processo. Dentre os recursos oferecidos pelo Instagram, destacamos aqueles que mais facilitam e promovem a interação entre os usuários: os feeds, os stories e os comentários. O primeiro consiste no espaço que reúne as publicações realizadas, o segundo refere-se ao local que abriga o tipo de conteúdo efêmero, que desaparece no período de 24 horas, e o último pode ser visto nas atividades expostas nos feeds, e resume- se na manifestação expressa de outros usuários sobre algo associado às publicações efetivadas, havendo necessidade de permissão dos detentores dos perfis para realizá-los. Como as interações sociais realizadas no Instagram foram o principal foco de análise do estudo mencionado, o mesmo foi estruturado de modo a obter a maior quantidade de informações sobre um dos elementos que as compõem, o processo social de apresentação de si (self-presentation). Este processo foi escolhido devido à importância das percepções do(s) interagente(s) na composição das dinâmicas interacionais, o que costuma motivar os indivíduos a criarem uma impressão específica que lhes ajude a alcançarem seus objetivos. Sendo assim, os mecanismos de controle de como se é percebido pelo(s) interagente(s) mostram-se como um dos elementos fundamentais no processo da apresentação de si (Leary, 1995). Tal como em ambientes não mediados por tecnologias digitais, o desejo de ser bem percebido pelo outro interagente influencia o processo de apresentação de si ocorrido em contextos digitais (Krämer & Haferkamp, 2011; Ribeiro & Silva, 2013; Seidman, 2013; Zillich & Riesmeyer, 2021). Entretanto, espaços como o Instagram oferecem aos usuários interessantes ferramentas e estratégias para realizarem suas apresentações de si. Neste sentido, destacam-se, por exemplo, a facilidade de utilização de recursos que permitem formatar edições nas imagens, aumentar a visibilidade de um texto, incrementar um conteúdo com filtros, sons, desenhos, entre outros. Em contrapartida, as particularidades características da plataforma também podem ser consideradas como desafios para o indivíduo que se apresenta, uma vez que suas ações tendem a ser permanentes, buscáveis, replicáveis ou a possuir longo alcance, inclusive por pessoas que não necessariamente acessaram os conteúdos diretamente (Boyd, 2007). O estudo se interessou por compreender o processo de apresentação de si em um contexto repleto de características específicas que tanto potencializam quanto desafiam o indivíduo que se apresenta, e que, no caso do Instagram, possui a produção e circulação de imagens como foco principal. Em ambientes digitais, a imagem pode ser considerada uma importante estratégia não verbal de apresentação de si, assim como a aparência física em diferentes espaços. Levando-se estes aspectos em consideração, o estudo analisou as apresentações de si realizadas por adolescentes obesas, ou seja, por adolescentes que diferem do padrão hegemônico normativo, o que as coloca em uma posição que dificulta a formação de impressões positivas por parte do(s) interagente(s). Para alcançar os objetivos esperados, oito adolescentes brasileiras e usuárias do Instagram (que realizam postagens de forma frequente) foram escolhidas após convite divulgado por profissionais da saúde e da educação para participar do estudo. Os métodos escolhidos foram as observações não participantes auxiliadas pelos registros em diário de campo. Deste modo, a coleta de dados teve como ponto de partida a construção de matrizes de referência, considerando: os ambientes passíveis de observação de atividades constituintes do processo de apresentação de si, as ferramentas oferecidas pela plataforma que representam interações sociais entre os usuários, e a constituição do público que compõe os seguidores das participantes. Salientamos que o projeto de pesquisa foi submetido e aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos1, sendo que todas as pessoas envolvidas, além de terem tido suas identidades preservadas, obtiveram informações e esclarecimentos acerca da pesquisa e concederam permissão para que suas atividades pudessem ser observadas através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
3.Matriz de Referência para Observações Não Participantes em Processos de Apresentação de Si no Instagram
Os caminhos metodológicos para as observações não participantes em processos de apresentação de si no Instagram cumpriram as seguintes etapas:
Etapa 1 - Construção de Tópicos e Subtópicos Teóricos a Serem Observados
Os primeiros elementos da observação não participante emergiram dos dados teóricos selecionados a partir da literatura (Arkin, 1981; Leary, 1995; Schlenker, 2012, dentre outros). Como o estudo se propôs a analisar a apresentação de si, foram tomados como tópicos os elementos que constituem esse processo: os tipos, as funções e as estratégias. Leary (1995) menciona dois tipos de apresentação de si, que se tornaram subtópicos em nossa proposta: as que são calculadas e as secundárias. As primeiras, que requerem intencionalidade e algum tipo de preparo por parte de quem realiza, podem ser facilmente observadas em todos os espaços interacionais oferecidos pelo Instagram, sendo as postagens nos feeds possivelmente os exemplos mais claros de apresentações de si planejadas. As segundas, que pressupõem impressões nas quais o indivíduo não gostaria de que seus interagentes formassem, podem ser percebidas mais frequentemente em postagens alheias nas quais o usuário foi marcado por um outro alguém. Entretanto, há uma limitação para que o observador possa ter acesso a esse conteúdo, uma vez que as imagens que estarão disponíveis são aquelas provenientes de perfis públicos ou que também estejam na lista de seguidores do pesquisador. Em relação às funções da apresentação de si, a literatura (Schlenker, 2002; Leary, 1995) aponta cinco possibilidades, consideradas como subtópicos: influência interpessoal, realce da construção da identidade pessoal, manutenção da autoestima, promoção de emoções positivas e exercício de poder. Tais parâmetros podem ser apenas inferidos por parte do pesquisador a partir das legendas que os usuários atribuem às apresentações de si e às reações dos interagentes que são passíveis de observação: curtidas, repostagens e, principalmente, através do conteúdo dos comentários deixados. O último tópico teórico diz respeito às estratégias de apresentação de si mapeadas por Leary (1995), tendo como subtópicos as estratégias verbais e não verbais, as associações sociais, a conformidade e complacência, os aspectos do ambiente físico e os comportamentos sociais. Fez-se necessária a transposição destes elementos para o contexto digital, uma vez que os mesmos foram propostos originariamente pelo autor para análise de situações vivenciadas em espaços não mediados por tecnologias digitais. Neste sentido, as estratégias verbais corresponderiam principalmente aos textos escritos pelos usuários sobre suas apresentações de si, como por exemplo, as informações dos bios, ou as informações explicitadas nos vídeos disponíveis nos stories. Já as não verbais podem ser compreendidas como as imagens postadas, enquanto as associações sociais, os aspectos do ambiente físico e os comportamentos sociais são elementos que, por permearem as apresentações de si dos usuários em todos os espaços disponíveis, são também passíveis de observação em algum grau por parte do pesquisador. Mesmo que não possam ser observadas de forma direta, elementos que sugerem conformidade e complacência nas apresentações de si também podem vistos, já que há uma consciência e expectativa do retorno social positivo esperado com as atividades realizadas, e para obtê-lo, as mesmas acabam contemplando normas e convenções sociais. Apesar de Leary (1995) considerar, além dos três destacados (os tipos, as funções e as estratégias), a presença de um quarto tópico (os monitoramentos), optamos por não incluí-lo na matriz de referência pela impossibilidade de observação, uma vez que os seguidores não conseguem ter acesso aos mecanismos que permitem ao usuário monitorar a maior parte de suas apresentações de si no Instagram, sendo o fato de um perfil ser disponível ou passível de autorização para ser acessado o único dado observável nessa perspectiva, o que restringiria significativamente os graus de monitoramento descritos na literatura.
Etapa 2 - Construção de Tópicos e Subtópicos Empíricos a Serem Observados
Os demais tópicos que compõem a matriz de referência para observações não participantes no Instagram emergiram de dados empíricos. Há um tópico para que sejam observados os espaços disponíveis para as apresentações de si na plataforma, no qual ramificam-se os seguintes subtópicos: feeds, stories, bios e comentários. Por se tratar de um contexto em constante atualização, mesmo que não tenham sido considerados na pesquisa, uma vez que não existiam no Instagram quando a mesma foi realizada, acrescentamos os espaços reels e destaques (stories que podem ser salvos de forma permanente) nesta seção, por compreender que neles o observador pode obter dados importantes para analisar as interações decorrentes das apresentações de si e seus componentes. Já o acréscimo do subtópico marcados indica as apresentações de si do usuário consideradas relevantes para outro alguém, configurando um local que abrigará aquelas apresentações que são secundárias. Sugerimos também um tópico que permite ao pesquisador considerar os recursos de edição passíveis de observação nas apresentações de si. Desse modo, os subtópicos englobam os recursos de edição de imagens (uso de filtros, de alterações nos conteúdos observáveis, na coloração etc.), recursos de áudio (mais facilmente observados nos stories e nos reels), e os recursos textuais (tamanho das letras, fontes e cores escolhidas, presença ou não de animação no texto e conteúdo do que foi escrito). Em concordância com alguns estudos (Hong, Jahng, Lee & Wise, 2020; Papacharissi, 2002), julgamos que estes elementos carregam dados importantes para as análises das respectivas apresentações de si dos usuários. Acrescentamos ainda outros recursos, para que sejam considerados as demais possibilidades oferecidas pelo Instagram: localização, música, enquetes, perguntas, contagem regressiva, termômetro e testes, por exemplo. Um dos principais meios para que possamos observar a eficácia de determinada apresentação de si se dá pelo efeito social que ela pode causar. Sendo assim, o tópico feedbacks sociais gerados pela apresentação de si permite ao pesquisador agrupá-los entre elogios, críticas, curtidas e comentários, além do acréscimo das repostagens de publicações que tragam determinada apresentação de si do usuário e que sejam realizadas por outrem. Outro elemento que poderá subsidiar a pesquisa acerca das interações no Instagram é a análise de para quem se destina a apresentação de si na plataforma. Os alvos podem ser: amigos do mesmo sexo, amigos do sexo oposto, familiares ou indefinido. Os comentários e curtidas costumam ser os principais meios para que esse ponto possa ser melhor observado. Por fim, os aportes nos quais se ancoram as apresentações de si nos ajudam não apenas a categorizá-las, como também a compreendê-las inclusive em suas motivações e funções. Neste caso, tanto os comentários quanto as informações disponibilizadas pelo próprio usuário nos ajudam a demarcar se esses aportes seriam positivos, negativos ou ambíguos. Mesmo compreendendo que podem demonstrar preferências dos usuários, e desse modo, serem meios de apresentação de si, optamos por não incluir o IGTV 2 na matriz de referência, que faz parte do perfil do indivíduo, pela percepção de que os vídeos contidos ali não nos permitem uma análise mais detalhada das repercussões sociais trazidas pela escolha de incluí-los, já que, ao abrirmos, somos direcionados para comentários e exibições gerais que o mesmo obteve, e não da pessoa que o destacou. A Figura 1 ilustra a matriz de referência proposta:
4. Matrizes de Referências para Registros em Diário de Campo associados às observações não participantes em Processos de Apresentação de Si no Instagram
O diário de campo é um recurso metodológico frequentemente utilizado em pesquisas narrativas e em observações tanto participantes, quanto não participantes. Historicamente, os diários de campo eram vistos como um material não científico e uma ameaça à neutralidade. Com o passar do tempo, passaram a ser admitidos como uma prática que contribui significativamente para as pesquisas realizadas. Sendo assim, o diário de campo é uma ferramenta que possibilita registrar não apenas aspectos do objeto, do fenômeno observado ou mesmo da influência do meio (lócus), como também as impressões e as perspectivas subjetivas do pesquisador (Fajer, Araújo & Waismann, 2017; Lourau, 1993; Medrado, Spink & Mello, 2014; Ribeiro et al, 2016; Tonin et al., 2018). A adoção dessa estratégia em uma pesquisa cujo lócus configura-se em um ambiente digital se deu pelo caráter dinâmico da plataforma Instagram, que possui modificações frequentes que acabam influenciando as interações sociais ocorridas ali. Foram considerados nos registros as particularidades próprias dos espaços digitais, bem como a influência dos recursos oferecidos pela plataforma para as interações sociais e apresentações de si observadas. Para além de uma utilização meramente descritiva, o diário de campo como suporte à matriz de referência para observações não participantes no Instagram deve carregar também, de acordo com nossa proposta, um caráter reflexivo e analítico, o que auxiliará o pesquisador a organizar e a analisar seus dados posteriormente (Vasconcellos e Franisco, 2015). Para o caso da pesquisa efetuada, a escolha por esta estratégia nos assegurou que nem as apresentações de si observadas, nem nossas impressões a respeito fossem perdidas, dada a velocidade, o dinamismo e a quantidade de informações da plataforma. Desta forma, também nos foi possível ter mais segurança para organizar as ideias, questões e inquietações suscitadas a partir do contato com as apresentações de si dos perfis selecionados de modo mais assertivo. Em concordância com alguns autores (Bogdan & Biklen, 1994; Marietto, 2018; Oliveira, 2014; dentre outros), sugerimos uma organização em três momentos: (1) Registro de Notas Descritivas, (2) Registro de Notas Reflexivas e (3) Registro de Notas Metodológicas. No primeiro momento, Registro de Notas Descritivas, o foco deve estar voltado puramente para o que é observado. Para isso, exige-se do pesquisador a atenção às categorias de observação e sensibilidade às particularidades que envolvem tanto o ambiente e a plataforma, quanto as sutilezas e os códigos específicos contidos no conteúdo exposto, sendo necessário, portanto, uma sistematização e estruturação deste primeiro momento. Assim, propomos a utilização de um checklist que contemple os aspectos que devem ser observados para a elaboração das Notas Descritivas (ver figura 2):
O segundo momento, referente ao Registro de Notas Reflexivas, compõe as reflexões do pesquisador quanto à prática observada, mediante a reflexão das informações adquiridas com o que está disponível no perfil do usuário, destacando potencialidades e fragilidades que permeiam o fenômeno ao qual se pretende investigar. O objetivo é assegurar a manutenção do rigor na coleta e na capacidade do pesquisador para interpretar e relacionar os conceitos e teorias científicas às informações coletadas (Benedet et. al., 2019). A figura 3 sugere um modelo para este momento:
Por fim, para nortear a condução dos escritos em diário de campo, sugerimos, em um terceiro momento, o Registro de Notas Metodológicas, notas que correspondem a reflexões e apontamentos relativos ao método escolhido. Este tipo de notas auxilia o pesquisador tanto a analisar os procedimentos e estratégias utilizados e as decisões tomadas na pesquisa, quanto a detectar o que pode ser melhorado na próxima observação, assegurando, desta forma, maiores profundidade e qualidade nas informações coletadas (Benedet et al., 2019). A figura 4 propõe um meio de organização dos pontos metodológicos:
O diário de campo nos permite, assim, expressar as primeiras impressões, percepções, emoções e questionamentos diante da sequência de observações de apresentações de si. Na pesquisa efetuada, o diário de campo provocou um constante processo de análise, que nos permitiu avaliar nossas implicações e planejar os passos seguintes.
5.Considerações Finais
As plataformas digitais como o Instagram podem ser compreendidas como ambientes que viabilizam a ocorrência de diversas dinâmicas interacionais. É relativamente recente o interesse das ciências em lançar um olhar mais apurado para estes contextos com um foco relacional e não apenas como simples espaços promotores de vícios ou de alienação das relações face a face. Para que o conhecimento acerca da manifestação dos elementos sociais nestes espaços possa ser expandido, a observação não participante se mostra um recurso interessante, e que é facilitado pela própria dinâmica dos ambientes digitais, já que não há a presença física do pesquisador influenciando diretamente nas interações. Entretanto, compreendemos que os condicionantes ali presentes e que viabilizam as trocas sociais podem representar um desafio para o pesquisador, já que restringem seu lócus ao que lhe é permitido pelo usuário. Diante dessas questões, a escolha metodológica pela observação não participante para analisar esse processo específico da apresentação de si se mostrou fundamental para a condução dos procedimentos. No estudo mencionado, obtivemos resultados que apontam interessantes dinâmicas de apresentação de si específicas para o público da pesquisa, e passíveis de uma análise mais detalhada e robusta por conta da utilização das matrizes. Através delas, nos foi possível pensar sobre um tipo de dinâmica interacional particular, vivenciada em um espaço que oferece amplas possibilidades e potencialidades para o exercício da mesma. Através da observação não participante, os dados obtidos puderam ser analisados de modo prático, ilustrativo e avaliativo, ampliando, através dos registros realizados no diário de campo, de forma significativa as possibilidades de tratá-los. Deste modo, compreendemos que o dinamismo e a diversidade dos dados obtidos pela utilização das matrizes de referência ampliam as possibilidades de análise para o pesquisador, propiciando também a vivência de certa liberdade para efetuar seus estudos sob à luz do aporte teórico que melhor abarcar o fenômeno a ser investigado. Por fim, sugerimos a realização de estudos adicionais que possam utilizar as matrizes de referências propostas na análise de outros processos interacionais (além do processo da apresentação de si) e em outros ambientes (além da plataforma do Instagram3). Deste modo, acreditamos ser possível ampliar o conhecimento não apenas sobre os diversos processos de interações sociais envolvidos, como também sobre as especificidades dos ambientes e dos respectivos recursos disponibilizados como variáveis intervenientes importantes na composição das trocas, dos usos e das apropriações sociais efetivadas pelos usuários.