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Relações Internacionais (R:I)

versión impresa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.79 Lisboa set. 2023  Epub 31-Dic-2023

https://doi.org/10.23906/ri2023.79a07 

Artigo

O fair trade norte-americano nas guerras comerciais: Os casos dos conflitos nipo- e sino-americanos

US fair trade in trade wars: the cases of the US-Japan and US-China conflicts

Débora L. Nascentes1 

1 Cidade Universitária Avenida Professor Lúcio Martins Rodrigues, Tv. 4 e 5, S/N - Butantã, São Paulo - SP, 05508-020, Brasil | dlnascentes@gmail.com


Resumo

As guerras comerciais envolvem mais do que questões estritamente de cunho econômico, permeando também outras esferas, como política, segurança e desenvolvimento. Apesar do debate especializado ter se expandido com o recente entrave sino-americano, pouco se fala sobre as particularidades de uma guerra comercial e como elas são legitimadas. Através de dois estudos de caso, Estados Unidos vs Japão e Estados Unidos vs China, este artigo pretende suprir tal lacuna. Os dois casos destacam-se pela sua relevância e magnitude, dado os respectivos contextos históricos em que aconteceram. Foi possível observar que a lógica do fair trade é a principal fonte de legitimação das guerras comerciais norte-americanas.

Palavras-chave: guerras comerciais norte-americanas; fair trade, China, Japão

Abstract

Trade wars involve more than strictly economic issues, it also pemeates other spheres, such as politics, security, and development. Despite the advances in the specialized debate due to the recent Sino-American conflict, little is said about the particularities of a trade war and how it is grounded. Based in two case studies, US vs Japan and US vs China, the present article presents some elements that can fill this gap. These two cases were chosen for their relevance and magnitude, given the respective historical contexts in which they took place. Thus, it was possible to observe that the fair trade logic is the central source of legitimation of the American trade wars.

Keywords: United States trade wars, fair trade; China, Japan

Introdução

A guerra comercial entre Estados Unidos e China não foi o primeiro conflito iniciado por Washington nos últimos anos. Desde meados da década de 1970, foram avaliados 90 casos sob a Seção 301, dentre os quais seis escalonaram a um conflito comercial de alta intensidade. O primeiro deles, com o Japão, deu-se, sucintamente, devido à ascensão japonesa em meados do século XX, quando o país se tornou uma potência exportadora, principalmente no setor automobilístico, inundando o mercado interno norte-americano, que, por sua vez, reagiu através de reta- liações. Já os demais conflitos comerciais desse período não alcançaram tamanha repercussão, salvo apenas a recente guerra comercial sino-americana, na qual Washington impôs sanções a Pequim, que, por sua vez, as retaliou, escalonando o conflito através de sanções de igual medida e igual valor até seu arrefecimento, em janeiro de 2020, quando se firmou o Acordo de Fase Um entre as duas nações.

Nesse sentido, o objetivo do presente artigo é trazer o debate da legitimação das guerras comerciais para a situação concreta do Japão e da China, dada a grande relevância, magnitude e simbiose desses atores com os Estados Unidos, em seus respectivos contextos históricos. Como critério metodológico, a pesquisa vale-se de uma análise qualitativa e se assenta numa pesquisa bibliográfica e documental, completada com dois estudos de caso. Assim, na primeira seção, faremos um resgate da literatura que aborda a temática das guerras comerciais à luz da lente teórica realista e, em seguida, explicaremos o que são as instituições de fair trade para expor, nas duas seções seguintes, como elas foram mobilizadas nos casos nipo- e sino-americanos. Como argumentamos, os casos nipo- e sino-americanos são simbólicos à medida que trazem importantes elementos de análise, destacadamente a lógica do fair trade, que permite os Estados Unidos reta- liar outros países por não serem recíprocos, uma vez averiguado que houve a adoção de medidas injustas de comércio.

Conceitos, Teoria e História

O tema das guerras comerciais é pouco explorado pela literatura específica e cujo conceito é amplo, plural e multifacetado. Ka Zeng11 e Conybeare2, por exemplo, defendem que as guerras comerciais são um conflito comercial sustentado, cuja intensidade e grau de retaliação interativa aumentam gradualmente. Destarte, segundo os autores, para um conflito comercial ser caracterizado como uma guerra comercial é necessário haver ao menos uma rodada de retaliação mútua. Conybeare, porém, vai além das definições de Ka Zeng e traz algumas especificidades próprias ao definir esse conceito. Segundo o autor, as guerras comerciais podem ser interpretadas como sendo conflitos em que os Estados interagem, negociam e retaliam, principalmente sobre objetivos econômicos, e em que os meios utilizados são restrições ao livre fluxo de bens e serviços. Além disso, ele defende que a estrutura do comércio é fulcral para se avaliar quão crível e provável a eclosão de uma guerra comercial pode vir a ser. Nesse sentido, ele divide as estruturas do comércio entre competitivas e complementares. Nessas, ele afirma que os custos de interromper uma guerra comercial são mais graves do que naquelas, pois a «complementaridade comercial implica na baixa elasticidade da demanda pelos produtos uns dos outros»33, e altos custos para sustentar tal embate.

Bayard e Elliott, por sua vez, trabalham com a hipótese de que quanto maior for o défice comercial bilateral dos Estados Unidos com um país, maior será a pressão política do Congresso e do setor privado para atacar agressivamente suas barreiras comerciais4. Diversos autores, como Uriu e Chong e Li, seguem, direta ou indiretamente, essa lógica de Bayard e Elliott para tecer suas análises, porém eles entendem que o tamanho do défice comercial não é o principal fator desencadeador de ações assertivas e retaliatórias5. Isso se dá, entre outros fatores, porque muito poucas guerras comerciais são suficientemente puras para serem destituídas de quaisquer objetivos políticos, de modo que, empiricamente, percebe-se que a grande maioria delas possuem tanto objetivos políticos quanto econômicos.

Tais concepções, ainda que diferentes entre si, portam princípios e conceitos da teoria realista, com uma clara influência da leitura de Tucídides6. Segundo ele, todos os Esta- dos devem se adaptar à realidade natural do poder desigual - em termos de poder e capacidade de domínio e defesa - e agir de forma condizente perante a essa realidade. Isso implica, portanto, em um padrão de justiça que depende da igualdade de poder para coagir, ou seja, não se refere a um tratamento igual para todos, porque os Estados são de fato desiguais. Em vez disso, trata-se de reconhecer sua força ou fraqueza relativa, de conhecer seu lugar adequado e de se adaptar à realidade natural do poder desigual. Em outras palavras, «os fortes fazem o que têm poder de fazer e os fracos aceitam o que têm de aceitar»7.

Mearsheimer, por sua vez, afirma que os Estados Unidos buscam a hegemonia objetivando dominar o sistema inteiro, pois só assim poderiam ter a garantia de que nenhum outro Estado (ou combinação de Estados) seria capaz de lhes colocar em xeque e/ou pensar em lhes declarar guerra8. No entanto, ainda segundo Mearsheimer, o planeta é grande demais para uma hegemonia global, de modo que os Estados só podem se tornar hegemônicos em sua própria região. Há, todavia, a possibilidade de existir apenas uma potência regionalmente hegemônica, sendo-lhe possível evitar a emergência e existência de um competidor, e é justamente isso que os Estados Unidos estão tentando garantir. Isso porque um competidor poderia tentar interferir na sua esfera de influência e controle.

Especificamente sobre a guerra, Tucídides afirma que sua causa é o medo de um concorrente se tornar mais poderoso. Essa ideia de um Estado representar uma ameaça ao poder de outro, não só faz parte das análises de diversos teóricos das Relações Internacionais, mas também é mobilizada por uma ampla gama de autores que analisam a política comercial norte-americana9. Na concepção de Wallin e Åström, por exemplo, quanto mais crível uma ameaça for, maior pode vir a ser a intensidade de um conflito. Deste modo, quanto maior for a propensão de se atingir os níveis mais altos (ou executivos) - não ficando apenas no nível burocrático de governo -, maior será a intensidade de um conflito ou guerra comercial.

No entanto, esses postulados, apesar de conterem elementos fulcrais para a compreensão de uma guerra comercial, não se mostram, per se, suficientes para entender como as guerras comerciais se legitimam quando iniciadas pelos Estados Unidos. Esse tipo de enfoque, por sua vez, deixa de explorar um campo rico e pouco pesquisado nas Relações Internacionais, uma vez que muitos dos autores que dissertam sobre o tema, abordam as causas específicas de cada conflito, mas não articulam ou combinam os dados e informações entre os casos existentes, elencando como os Estados Unidos sustentam uma guerra comercial10.

É tendo isso em vista que, então, recorremos à análise de dois casos específicos, o primeiro entre os Estados Unidos e o Japão, e, o segundo, entre os Estados Unidos e a China, para explorá-los à luz da lógica do fair trade, pois acreditamos que, como resposta propedêutica prévia a este problema de pesquisa, as instituições de fair trade norte-americanas são cruciais para se compreender a operacionalização das guerras comerciais por eles empreendidas.

O fair trade é um conceito cuja definição é tipicamente norte-americana, plural e que, ao longo da história, esteve sujeito a alterações. Como demonstrado por Mendonça, o Fair Trade (em letras maiúsculas) refere-se às instituições de fair trade, como a Seção 301, a Super 301 e a Special 30111. Em resumo, a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 concedeu ao United States Trade Representative (USTR) uma série de responsabilidades e autoridades para investigar e tomar medidas para fazer cumprir os direitos dos Estados Unidos sobre acordos comerciais e responder a certas práticas comerciais de governos estrangeiros12. Já a Super 301, garantiu capacidade mandatária conferida ao USTR, incluindo assuntos como direitos trabalhistas e oportunidades de mercados no critério de práticas desleais de comércio, tornando o processo muito mais veloz13. Por fim, a Special 301 promoveu uma afirmação «mais agressiva de direitos de propriedade intelectual, além de estabelecer novos prazos para a ação em casos que envolvam o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), resolução de litígios ou propriedade intelectual»14. Não obstante, para se compreender melhor a lógica do fair trade faz-se fulcral abordar a história e a política comercial dos Estados Unidos, bem como a consolidação dessa lógica no decorrer tempo, pois «[n]ão é possível entender os acontecimentos do final da década de 1980, especialmente as instituições do fair trade, limitando-nos ao estudo de um período apenas [...] sem entender as complexas relações entre as forças da mudança e os limites estruturais»15.

À vista disso, em uma breve recapitulação dos principais fatos e eventos que marcaram a política de comércio internacional dos Estados Unidos, há três eras distintas na história da política dos Estados Unidos em que se pode identificar a precedência de cada um dos principais objetivos da política comercial norte-americana, também em tríade, rotulados por Douglas Irwin como «os três Rs», a saber: receita (revenue), restrição (restriction) e reciprocidade (reciprocity)16. Em suma, a receita se refere às taxas alfandegárias como fonte de receita para financiar as operações do governo; a restrição como sendo as restrições das importações para proteger os produtores domésticos da concorrência estrangeira e; a reciprocidade sendo atribuída aos acordos de reciprocidade com outras nações para promover as exportações norte-americanas.

No que diz respeito às três eras, a primeira vai desde o estabelecimento do governo federal até a Guerra Civil, quando a receita era o principal objetivo da política comercial norte-americana. Entre 1790 e 1860, a receita - apesar de não ser a única consideração - «era um fator-chave na definição dos direitos de importação, pois gerava cerca de 90% da receita do governo federal»17. Já na segunda era, que engloba o período compreendido entre a Guerra Civil até a Grande Depressão, a restrição das importações para proteger os produtores nacionais era o principal objetivo da política comercial. Durante este período, as tarifas protecionistas foram uma questão importante na política nacional, apesar de serem alvo de controvérsias. Por fim, a última era abarca o período posterior à Grande Depressão, quando os acordos comerciais recíprocos para reduzir as barreiras tarifárias e não tarifárias ao comércio desempenharam um papel de imensa prioridade. A reciprocidade, então, passou a ser o principal objetivo da política comercial, com o objetivo de abrir mercados externos para as exportações dos Estados Unidos.

Isso posto, a partir de 1945, a reciprocidade passa a ser um elemento de destaque na política comercial norte-americana, a despeito de ser um de seus componentes desde a independência do país. Assim, desde 1945 até meados da década de 1970, a política comercial norte-americana deve ser compreendida dentro da lógica da Guerra Fria, que influenciou as ações de Washington para com seus aliados18. Nesse período, denominado por Mendonça de «sistema antigo», aceitava-se a abertura unilateral (reciprocidade assimétrica19) em prol da manutenção da Aliança Atlântica20.

No entanto, é importante ter-se em mente que após 1934, quando a Lei de Acordos Comerciais Recíprocos é instituída, o Congresso delegou ao Presidente dos Estados Unidos o poder de fazer acordos recíprocos para reduzir tarifas, permitindo que a liderança norte-americana no sistema comercial internacional fosse então exercida pelo Presidente21. Esse marco legislativo, segundo Irwin, «mudou o locus da formulação de políticas comerciais do Legislativo para o Executivo e marcou o início de uma nova era»22, em que a ideia de livre-comércio unilateral, ou reciprocidade difusa23, ganhou cada vez mais força no cenário político norte-americano, dando conotações liberais - em termos comerciais - à reciprocidade24. No entanto, a adoção de tal reciprocidade implicou em efeitos colaterais para os Estados Unidos, como o agravamento do balanço de pagamentos.

Nesse ínterim, criou-se o sistema GATT-OMC. Esse sistema estabeleceu regras, premissas e diretrizes que nortearam o sistema econômico internacional como um todo. Em um breve retrospecto, pode-se afirmar que o GATT era originalmente um acordo de objetivos limitados, mas que se converteu em uma organização sui generis que tinha como uma de suas principais características a predominância da lógica dos Estados que o integravam25. Além disso, o GATT - estabelecido dentro de um projeto de poder que tinha como um dos seus pilares o livre-comércio - teve forte patrocínio dos Estados Unidos, que inclusive evitavam práticas restritivas de comércio e toleravam violações de seus aliados a princípios clássicos, como a cláusula da nação mais favorecida. Tais ações, por sua vez, colaboraram para o aumento do seu défice comercial, bem como para o aumento das «tensões entre as políticas de segurança, principais promotoras de instituições de comércio que garantiam aberturas unilaterais, e [das] políticas econômicas, principais promotoras das ideias revisionistas da reciprocidade assimétrica»26.

Esse cenário, marcado por uma sucessão de crises e eventos que impactaram duramente os Estados Unidos - como o fim do sistema de Bretton Woods, o défice no balanço de pagamentos, a crise do dólar, os dois choques do petróleo e a consequente estagflação - fomentou teorias acerca da hegemonia norte-americana (ou seu declínio). A então denominada teoria da estabilidade hegemônica27 ganhou uma crescente relevância e, apesar das diferentes versões que possui, seu argumento básico é que a distribuição de poder entre os Estados é o principal determinante do caráter do sistema econômico internacional28. Outro aspecto básico da teoria é, segundo Kindleberger, a necessidade de um «estabilizador» (hegemon29) para manter a economia mundial estabilizada, ou seja, único país que provesse o sistema mundial de alguns «bens públicos» indispensáveis para o seu funcionamento30.

Apesar das críticas e inconsistências teóricas e históricas de que a teoria da estabilidade hegemônica é alvo, ela é uma teoria munida de elementos insignes para se analisar questões referentes à hegemonia e ao papel do hegemon. Ademais, como colocado por Robert Keohane, se a teoria da estabilidade hegemônica fosse «totalmente errada, não haveria motivo para esperar que o desaparecimento da hegemonia fizesse qualquer diferença real nas perspectivas de cooperação», de igual maneira, «se a teoria fosse inteiramente correta, não haveria esperança para regimes internacionais pós-hegemônicos»31.

A despeito das críticas teóricas e das inconsistências históricas, a preocupação inicial de Kindleberger e Gilpin tornou-se o denominador comum de uma extensa literatura - sobretudo nos Estados Unidos - acerca da «crise da hegemonia norte-americana»32. Essa questão, colocada pela primeira vez em meados da década de 1970, foi asseverada com a ascensão japonesa. Segundo Gilpin, a mudança contínua no locus do núcleo da economia mundial do Atlântico para o Pacífico e a crescente integração das economias americanas e japonesas, que se tornaram ligadas a um grau que é sem precedentes para as nações soberanas, foram acontecimentos que tinham potencial de «influenciar a evolução da economia política internacional nas décadas subsequentes»33.

Isso, somado ao aumento da interdependência econômica internacional e ao fato de muitos norte-americanos terem uma visão de que o campo em que o jogo comercial é disputado como injustamente inclinado contra eles, resultou em uma maior ênfase no uso da alavancagem comercial unilateral de Washington para «nivelar o jogo»34. Foi nesse contexto que, na década de 1980, institucionalizou-se uma nova concepção de política comercial nos Estados Unidos. Tratava-se das políticas comerciais unilaterais contra os principais competidores econômicos de Washington, as denominadas políticas de fair trade. Esse movimento constitui a passagem do sistema GATT-OMC para o unilateralismo agressivo. O unilateralismo agressivo, por sua vez, «não é sinônimo de reciprocidade específica e, ao mesmo tempo, não é incompatível com a reciprocidade difusa»35. Em outras palavras, o unilateralismo agressivo não rompe com os princípios que vigoravam até então,

«pelo contrário, o intensifica por meio de ameaças feitas unilateralmente»36.

Destarte, a principal ferramenta do unilateralismo agressivo seria, segundo Bayard e Elliot, a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974. A lei afirma que «enquanto os Estados Unidos não [estiverem] em posição de ditar a política econômica no mundo, os Estados Unidos estão em posição de liderar o mundo e é de interesse nacional assim fazer»37. Tal concepção tornou-se «pedra angular» do unilateralismo agressivo38. Não obstante, é importante destacar que segundo esse texto de lei, o protecionismo norte-americano é legitimado apenas se as políticas de abertura não funcionarem.

Todavia, a Seção 301 é apenas uma das ferramentas entre diversas outras disponíveis aos formuladores de políticas comerciais dos Estados Unidos para abrirem os mercados. Dentre as outras ferramentas ao dispor de Washington, pode-se destacar a Omnibus Trade and Competitiveness Act de 1988, considerada um marco na política comercial dos Estados Unidos por representar a fase mais agressiva das políticas de fair trade, especialmente em razão da criação da Super 301 e da Special 30139.

Outro ponto importante de se destacar, presente no texto de lei é o fato de que:

«o protecionismo[40] norte-americano é legitimado apenas se as políticas de abertura não funcionarem. Esta é, na verdade, outra característica das instituições de fair trade, onde se protege a economia norte-americana por meio da abertura dos países concorrentes. Em outros termos, o “Reciprocal Non discriminatory Treatment” era um dos pilares do Unilateralismo Agressivo norte-americano»41.

Em resumo, pode-se dizer que, com a implementação da Super 301, a posição adotada pelos Estados Unidos no que se refere à política comercial sofreu mudanças importantes, quando o país começou a exigir com veemência que seus parceiros comerciais eliminassem barreiras às suas exportações, por meio da utilização de ameaças de retaliação. Além disso, o cenário de disputa internacional passa a incluir novos temas, de modo a englobar todas as exportações norte-americanas42.

No que diz respeito à eficácia da Seção 301, ela foi razoavelmente bem-sucedida desde 1985 em alcançar os objetivos norte-americanos de abrir os mercados externos43. Já o unilateralismo agressivo teve uma modesta contribuição positiva em mover o sistema econômico global em direção a reformas significativas. Os autores sublinham, ainda, que o uso mais agressivo da Seção 301 não resultou em uma retaliação frequente por parte de Washington, como muitos críticos acreditavam que fosse acontecer.

O contencioso nipo-americano

A ascensão japonesa na década de 1970 associada à ideia de que o Japão era um país cuja economia se encontrava «fechada» para os Estados Unidos, tornou Tóquio alvo de esforços norte-americanos em busca de um comércio justo e «aberto». Esses esforços, em grande parte, deram-se dentro da lógica do unilateralismo agressivo, cuja expressão máxima se deu com as instituições de fair trade. Em um breve retrospecto, este conflito44 ocorreu em um contexto em que o Japão colocou a hegemonia norte-americana em xeque, quando se assistia no cenário internacional ao fim da conversibilidade do dólar em ouro; à decadência do sistema de Bretton Woods; a uma desaceleração dramática da taxa de crescimento da produtividade nos Estados Unidos e na Europa Ocidental; a dois choques do petróleo, que atingiram vigorosamente a economia norte-americana que, por sua vez, enfrentou um período de estagflação, marcado pelo desemprego e por défices no balanço de pagamentos, em especial com o Japão.

A combinação desses eventos não só contribuiu para a intensificação de teses declinistas, mas também proporcionou o «acirramento das críticas às políticas comerciais de cunho liberal adotadas até então, agregando força às demandas protecionistas, que não demoraram a entrar na agenda do Congresso»45. Com efeito, os Estados Unidos se respaldaram nas instituições de fair trade, nomeadamente na Seção 301 e na Super 301, para exigir que Tóquio agisse de forma recíproca para com eles, do contrário, retaliações seriam impostas ao país asiático. Assim, na década de 1970, temos o início de um dos casos mais marcantes dos conflitos nipo-americanos, em que as principais empresas privadas do setor automobilístico norte-americano recorreram ao Congresso para restringir as importações japonesas. Em resposta a esses apelos, um projeto de lei de quotas foi apresentado ao Congresso em janeiro de 1981, levando o recém-empossado Presidente, Ronald Reagan, a negociar restrições voluntárias à exportação46 (ver, na sigla em inglês) com o Japão47.

É importante lembrar que, nesse período, a indústria automobilística era a principal área de vitalidade econômica e geração de empregos nos Estados Unidos e que ela passava por uma situação difícil, dada a crescente entrada das importações japonesas no mercado interno norte-americano. Isso se deu, em grande parte, porque os consumidores norte-americanos passaram a demandar carros japoneses em maior quantidade por serem menores e mais econômicos, algo importante em um momento de alta do petróleo48. Assim, como a demanda mudou drasticamente para modelos pequenos com alta quilometragem e as montadoras americanas não estavam preparadas para essa mudança, suas vendas caíram e as importações - três quartos das quais vinham do Japão - expandiram-se para atender à nova demanda49.

Nos anos seguintes, o Japão e os Estados Unidos passam por árduas negociações, de modo que, em agosto de 1987, os dois governos concordaram em uma série de iniciativas destinadas a amenizar o conflito de peças de automóveis, cujo principal resultado foi o estabelecimento de um sistema de coleta de dados para monitorar as compras de peças feitas nos Estados Unidos por fabricantes japoneses e suas subsidiárias norte-americanas50. Em junho de 1991, o Comitê Consultivo de Peças de Automóveis, um órgão da indústria criado para aconselhar o Departamento de Comércio sobre o comércio de peças de automóveis no Japão, apresentou pela primeira vez à Administração Bush um consenso, recomendando uma investigação de dumping e um caso nos termos da Seção 301 contra a indústria japonesa51.

«[N]a primavera de 1995, com a chegada do prazo da Seção 301, essa disputa chegou à beira do que a imprensa rotulou de “guerra comercial”, com os Estados Unidos iniciando sanções multibilionárias contra as importações de automóveis de luxo japoneses, e ambos os lados preparando casos para levar à recém-criada OMC. Em junho, os dois lados chegaram a um acordo singular: os Estados Unidos proclamaram metas específicas para compras japonesas de automóveis e peças importadas (com base nas metas da indústria privada japonesa) e o Ministro de Comércio Internacional e Indústria do Japão, Ryutaro Hashimoto, desassociou formalmente seu governo desses números. Ambos os lados declararam vitória e o conflito comercial Estados Unidos-Japão diminuiu rapidamente»52.

Para além da questão automotiva, os valores das taxas de câmbio são de suma importância nesse contexto. Segundo Bayard e Elliott, «a forte valorização do dólar foi uma das principais causas da explosão dos défices comerciais de mercadorias dos Estados Unidos em meados da década de 1980»53. A Administração Reagan inicialmente respondeu às crescentes pressões comerciais com proteção ad hoc à importação para algumas indústrias concorrentes de importação, como a de automóveis. Porém, «nem a Administração nem o Congresso estavam dispostos a enfrentar as fontes subjacentes do desequilíbrio comercial»54.

No entanto, era necessário adotar alguma medida frente aos desajustes cambiais. Assim, em setembro de 1985, foi dado o primeiro passo para tentar solucionar tais problemas com a Conferência de Plaza. No mesmo ano, aprovou-se no Congresso norte-americano uma condenação do Japão classificando-o como unfair trader, condenação essa «celebremente eternizada nas palavras do senador Lloyd Bentsen: «We are in a trade war, and we are losing it»55.

Com o Acordo de Plaza, teve-se um dólar fraco e um iene forte, implicando em uma forte recessão do iene por cerca de um ano, após a assinatura do acordo56. Nesse sentido, o declínio do dólar de 1985 a 1987 trouxe, segundo Destler, o alívio necessário, econômica e politicamente, para os Estados Unidos, gerando expectativas de que o défice comercial logo começaria a diminuir. Além disso, as negociações iene-dólar proporcionaram ao Tesouro norte-americano conhecimento substancial sobre os mercados financeiros japoneses.

Seguindo o Acordo Plaza e a valorização do iene, o investimento japonês na região disparou, levando a uma conduta norte-americana mais agressiva. Por conseguinte, a Casa Branca e o Congresso implementaram, nos anos seguintes, medidas ainda mais duras em relação à economia japonesa, onde podemos destacar o Semiconductor Agreement. Assinado em 1986, o Semiconductor Agreement fixava preços mínimos para produtos tecnológicos japoneses (principalmente chips) nos mercados mundiais de forma a permitir que as empresas tecnologicamente desenvolvidas nos Estados Unidos recuperassem parte da quota de mercado que haviam perdido para as suas homólogas japonesas.

É importante destacar que houve uma importante coalizão doméstica de firmas privadas e oficiais públicas que influenciaram na tomada de decisão do governo. No caso dos semicondutores, a Semiconductor Industry Association (SIA), uma associação comercial e grupo de lóbi que representava a indústria de semicondutores dos Estados Unidos, entrou, em junho de 1985, com uma petição da Seção 301 contra o Japão por sua estrutura de mercado de exclusão57. Pouco depois, outras empresas privadas também entraram com processos no Departamento de Comércio contra os produtores japoneses, fazendo com que o departamento entrasse em uma ação sem precedentes, iniciando uma investigação de dumping em DRAMS de 256K e/ou mais. Assim,

«[e]m agosto de 1986, os governos dos Estados Unidos e do Japão chegaram a um acordo com o objetivo de resolver a Seção 301 e as investigações de dumping. Em troca da suspensão dos casos de dumping sobre EPROMS e DRAMS de 256K ou mais, as empresas japonesas concordaram em fornecer informações sobre seus custos; o Departamento de Comércio calculou então os “valores justos de mercado” (FMV) para as vendas de cada empresa japonesa. As vendas no mercado dos Estados Unidos abaixo do preço do FMV seriam consideradas objeto de dumping e estariam sujeitas a impostos. [...] Em troca da suspensão da ação da Seção 301, os japoneses indicaram em uma carta secreta que a participação no mercado estrangeiro no Japão deveria atingir 20% ao final do acordo de cinco anos»58.

Com a chegada do fim do primeiro acordo de semicondutores, o Japão estava receoso em relação a Washington. As autoridades japonesas desconfiavam de qualquer terminologia que pudesse ser interpretada como um compromisso governamental aplicável de acordo com a legislação comercial dos Estados Unidos59. Além disso, de 1993 em diante, o Japão insistiu na postura de não entrar em negociações com os Estados Uni- dos quando a Seção 301 pudesse ser exercida, e se opôs fortemente à introdução de «critérios objetivos» que corriam o risco de se tornar uma aprovação para julgamentos arbitrários60. A partir de então, os contenciosos nipo-americanos arrefeceram, de modo que, de 2010 a 2012, as relações nipo-americanas foram caracterizadas pelas tentativas de reativação de uma aliança em direção aos novos desafios do século XXI61.

A guerra comercial sino-americana

A vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais de 2016 foi um marco importante na política comercial dos Estados Unidos. Ainda durante a corrida eleitoral, Trump anunciou que «consertaria o abuso de longa data da China no sistema internacional falido e as práticas injustas»62, afirmando que reformularia os princípios de cooperação de seu país com a China e que traria «casos» contra Pequim, inclusive na Organização Mundial de Comércio, em uma ampla variedade de questões63. Assim, quando Trump chega à presidência dos Estados Unidos, em janeiro de 2017, a política externa e comercial de Washington adota uma postura mais beligerante e menos negociadora64.

Diferentemente de seus antecessores - que desde o pós-Segunda Guerra Mundial em diante defenderam a liderança da economia dos Estados Unidos, em um contexto de integração à economia mundial, assim como a internacionalização de normas liberalizantes, sempre a partir uma perspectiva nacionalista e hegemônica -, Trump adotou um discurso realista e mercantilista que, apesar de não romper com a complexa arquitetura de multilateralismo liberal construída ao longo de mais de setenta anos, possui características inéditas, como adotar uma política que ignora os ritos, atropela a estrutura partidária e tensiona os limites da democracia norte-americana65.

Esse conjunto de ideias e concepções, que compõe o denominado «trumpismo», deixou claros seus objetivos em termos de política comercial, que visavam reformatar as relações e a distribuição de ganhos, recuperar as perdas econômicas, sobretudo a liderança estratégica dos Estados Unidos - a qual se afirma que foi perdida em algum momento no passado66. É dentro desse contexto que a China ganhou os holofotes. Isso se deu não apenas por ser entendida como a principal causa do défice comercial norte-americano, mas também por adotar práticas injustas e desleais, colocando-se como uma rival de peso contra Washington pelo domínio econômico global67.

Não obstante, já em governos anteriores a China exercia um papel relevante para os formuladores de política externa norte-americanos. Especialmente após 1971, quando «os representantes do Governo da República Popular da China são [reconhecidos como] os únicos representantes legais da China nas Nações Unidas e que a República Popular da China é um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança»68, o que acaba por fortalecer o peso de Pequim no cenário internacional.

Ao longo da década de 1990 e dos primeiros anos do século XXI, a China foi o mercado de exportação de crescimento mais rápido para as empresas americanas69. Ademais, o défice comercial de mercadorias com a China nesse período atingiu números altíssimos, que não podiam mais ser ignorados por Washington. Nesse sentido, durante seu governo, Bush vai-se esforçar constantemente para vincular condições legislativas ao status de nação mais favorecida da China70. Um desses esforços foi a Emenda Jackson-Vanik, que forneceu fundamentos legais para a renovação anual do status de nação mais favorecida da China pelo Congresso até 2001, quando o país aderiu à OMC, cujas regras proíbem os membros de impor tais restrições comerciais a outros membros71. A subida econômica chinesa e a crescente interdependência econômica entre Estados Unidos e China acabaram por intensificar as controvérsias, transformando-as em atritos cada vez mais tangíveis. Em um panorama mais geral, os Estados Unidos insistiam na necessidade de a China consumir mais e exportar menos. Há, então, no cenário internacional um ambiente fértil para o retorno do discurso do fair trade ainda no Governo Barack Obama, ganhando força em 2016 durante as eleições e avançando em sua institucionalização com a chegada de Donald Trump ao poder72. Destarte, em seu terceiro mês de governo, Trump se reuniu com o Presidente chinês, Xi Jinping, e ambos os lados concordaram em realizar negociações comerciais.

No entanto, as negociações não foram bem-sucedidas, pois não se chegou ao seu principal objetivo: um acordo sobre o défice comercial dos Estados Unidos com a China. Como consequência, tomou-se «a primeira ação séria contra Pequim na forma de uma investigação sob a Seção 301 para averiguar o potencial roubo de propriedade intelectual pelos chineses»73. Essa foi a primeira vez desde 1997 que o USTR iniciou uma investigação sobre licenciamento «injusto» e políticas «injustas» de propriedade intelectual, usando a Seção 30174.

Em 2018, as divergências comerciais entre os Estados Unidos e a China aumentaram em escala e frequência, de modo que há uma política de retaliações e contra-retaliações marcando todo o período. Em resumo temos que, entre julho de 2018 e maio de 2019, o Governo Trump impôs tarifas sobre mais de 360 bilhões de dólares em produtos chineses usando o respaldo da Seção 301 para tal. Em resposta, Pequim reagiu com uma nova rodada de tarifas idênticas sobre 110 bilhões de dólares em mercadorias americanas75. Esses valores exemplificam, por- tanto, a dimensão que a guerra comercial sino-americana tomou, em que as tarifas mais que triplicaram de valor em menos de um ano.

Em dezembro de 2018, por ocasião da reunião do G20, em Buenos Aires, Xi Jinping e Trump puderam alcançar um acordo provisório, arrefecendo, mesmo que momentaneamente, a tensão comercial. Na ocasião, «Trump anunciou uma quarentena até o 1.º de março de 2019, prometendo dobrar as tarifas, caso nenhum acordo fosse firmado até lá»76. O anúncio foi seguido de uma redução das tarifas chinesas poucos dias depois, de modo que, em janeiro de 2019, a China e os Estados Unidos retomaram as negociações em Washington. Em março, a China estendeu a suspensão de tarifas adicionais sobre automóveis e peças de automóveis norte-americanos, que deveriam entrar em vigor em abril de 2019. Porém, como os dois Estados não conseguiram chegar a um acordo, os Estados Unidos decidiram aumentar as tarifas sobre 200 bilhões de dólares em produtos chineses de 10% para 25%. A China, por conseguinte, anunciou que aumentaria as tarifas sobre 60 bilhões de dólares em mercadorias americanas a partir de junho de 2019.

Poucos dias depois, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos anunciou a adição da Huawei Technologies Co. Ltd e suas afiliadas em sua entity list, o que efetivamente proibiu as empresas norte-americanas de vender para a empresa de telecomunicações chinesa sem a aprovação do Governo dos Estados Unidos77. Passados dois meses, o Tesouro dos Estados Unidos declarou que a China era manipuladora da moeda - depois que o yuan depreciou em relação ao dólar americano atingindo seu nível mais baixo em onze anos -, em aparente retaliação às novas tarifas punitivas que ameaçavam aplicar o restante das importações chinesas. O Banco Popular da China, por sua vez, refutou essas afirmações em uma declaração fortemente redigida, sustentando que «a China nunca usou e não usará» a taxa de câmbio do yuan como uma ferramenta para lidar com os atritos comerciais, destacando que a taxa de câmbio do yuan é determinada pela oferta e demanda do mercado78. Arrefecendo, em certa medida, as tensões e o escalonamento das retaliações, em outubro de 2019 os Estados Unidos anunciaram o Acordo de Fase Um.

Assinado em 15 de janeiro de 2020, pelos Estados Unidos e pela China, e em vigor desde 14 de fevereiro de 2020, o Acordo de Fase Um tinha por objetivo aliviar as tensões entre os dois países e abrir um caminho para o fim da guerra comercial79. O acordo exigia reformas estruturais e outras mudanças no regime econômico e comercial da China nas áreas de propriedade intelectual, transferência de tecnologia, agricultura, serviços financeiros, moeda e câmbio80. Ademais, ele incluía provisões sobre compromissos que a China deveria assumir, como: realizar reformas estruturais e outras mudanças em seu regime econômico e comercial nas áreas previamente mencionadas; consumir, em valores substanciais, mais bens e serviços dos Estados Unidos nos próximos anos; não manipular sua moeda; abster-se de forçar empresas estrangeiras a transferir tecnologia. Do lado norte-americano, Washington assumiu, entre outros, o compromisso de modificar suas ações tarifárias da Seção 301 de maneira significativa81. No entanto, apesar de ser um passo importante, os críticos do acordo e muitos analistas afirmam que o Acordo de Fase Um deixou a maioria das preocupações dos Estados Unidos sem solução82. Isso acontece, em grande medida, porque essa guerra comercial «envolve muito mais do que o défice comercial dos Estados Unidos; trata-se de poder e domínio econômico»83.

Considerações Finais

Por todo o exposto, foi possível observar que as guerras comerciais envolvem mais do que questões estritamente de cunho econômico, permeando também outras esferas, como a política, a segurança e o desenvolvimento. Nesse sentido, ao se trazer premissas e debates da literatura sobre o tema para, em seguida, analisar os casos nipo- e sino-americanos, constatou-se que, de fato, as instituições de fair trade - nomeadamente a Seção 301 - são mobilizadas para operacionalizar e legitimar as medidas norte-americanas em busca de um comércio justo, bem como para pressionar seus parceiros comerciais a acatarem suas demandas por meio das ameaças de retaliação. Destarte, a lógica do fair trade permitiu (e permite) que os Estados Unidos retaliem outros países por não serem recíprocos para com eles, dando «ares de legitimidade» para a sua tomada de decisões.

Tanto o Japão, quanto a China, em seus respectivos contextos históricos, suscitaram debates acerca de uma suplantação possível e crível da hegemonia norte-americana. Não obstante, é digno de nota que a comparação entre os casos nipo- e sino-americanos apresenta algumas limitações importantes. Enquanto o Japão do pós-guerra esteve na dependência de segurança militar dos Estados Unidos - e se transformou em uma democracia liberal, sendo visto como uma extensão do Ocidente político -, a China tem um forte controle estatal sobre a economia e a sociedade, além de um sistema político singular e extensões demográficas e geográficas inigualáveis às japonesas.

Apesar das diferenças de cada um desses países asiáticos, os Estados Unidos adotaram, em ambas as situações, uma resposta similar perante eles. Essa resposta, por sua vez, traduziu-se na implementação de medidas que fomentaram o início de conflitos comer- ciais com o objetivo basilar de contrariar a ascensão de então parceiros comerciais emergentes, pois para um país de longa hegemonia ver sua liderança ser lentamente assumida por um país subordinado é incabível. Assim, como já afirmado por realistas como Mearsheimer, todos os Estados almejam a hegemonia. E, no caso específico norte-americano, se um Estado ascender como potência dominante, é de esperar que os Estados Unidos reajam tentando evitar ou minar o poder desse Estado, seja qual for a região em que ele emergir.

As guerras comerciais são, portanto, uma das ferramentas que Washington utiliza para interromper o crescimento de uma potência em ascensão, colocando-a em uma posição em que seu avanço será mitigado, arruinando suas possíveis pretensões hegemônicas. A arte da guerra norte-americana é, portanto, adotar estratagemas que lhes permitam arruinar os planos daqueles que tentam colocá-los em xeque, impedindo a integração de suas forças e quebrando suas resistências, assegurando, assim, seus interesses, sem lutar nas vias de fato de uma guerra tradicional.

Ademais, com a aceleração do processo de globalização e o avanço de novas tecnologias, a interconexão e a interdependência entre mercados e países é cada vez mais notória, de modo que mudanças promovidas por atores, como os Estados Unidos, em sua política comercial, reverberam nos demais mercados em uma velocidade cada vez maior. Por conseguinte, as semelhanças observadas nos casos nipo- e sino-americanos são simbólicas, uma vez que elas podem ser utilizadas por outros governos como lições frente a cenários possíveis e subsídios para a formulação de estratégias político-comerciais.

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Notas

1 ZENG, Ka - Trade Threats, Trade Wars: Bargaining, Retaliation, and American Coercive Diplomacy. University of Michigan Press, 2004.

2CONYBEARE, John A. C. - Trade Wars: The Theory and the Practice of International Commercial Rivalry. Nova Iorque: Columbia University Press, 1987.

3ZENG, Ka - Trade Threats, Trade Wars…, p. 44. Salvo indicação em contrário, todas as citações são traduções livres da autora.

4BAYARD, Thomas O.; ELLIOTT, Kimberly Ann - Reciprocity and Retaliation in U.S. Trade Policy. Washington DC: Institute for International Economics, 1994.

5URIU, Robert M. - Clinton and Japan: The Impact of Revisionism on US Trade Policy. Nova Iorque: Oxford University Press, 2009; CHONG, Terence Tai-leung; LI, Xiaoyang - ≪Understanding the China - US trade war: causes, economic impact, and the worst-case scenario≫. In Economic and Political Studies. Vol. 7, N.o 2, 2019.

6TUCÍDIDES - The Peloponnesian War. Chicago: University of Chicago Press, 1989.

7Ibidem, p. 406.

8MEARSHEIMER, John - The Great Tragedy of Great Power Politics. Nova Iorque: W.W. Norton, 2001.

9Wallin, Emilie; Aström, Emelie - Trade Wars Are Good, and Easy to Win: A Study of Trump’s Steel Tariffs and International Trade. Umea: Umea University, 2018. Consultado em: 15 de marco de 2022. Disponível em: http://urn.kb.se/resolve?urn=urn:nbn:se:umu:diva-149619.

10YU, Miaojie; ZHANG, Rui - «Understanding the recent Sino-U.S. trade conflict». In China Economic Journal. Vol. 12, N.o 2, 2019.

11MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo: A Reciprocidade na História Política Comercial dos Estados Unidos. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2013. Tese de doutorado em Ciência Política.

12Government Printing Office. Trade Act of 1974: Summary of the Provisions of H.R. 10710. 1974. Consultado em: 21 d e julho de 2022. Disponivel em: https://www.finance.senate.gov/imo/media/ doc/trade9.pdf.

13MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo….

14Ibidem, p. 32.

15MENDONÇA, Filipe - Entre a Teoria e a História: A Política Comercial dos Estados Unidos na Década de 1980. São Paulo: Editora Unesp, 2011.

16IRWIN, Douglas A. - Clashing over Commerce: A History of US Trade Policy. Chicago: The University of Chicago Press, 2017.

17Ibidem, p. 07.

18Neste período, observou-se no cenário internacional um «relaxamento» das tensões entre a União Soviética e os Estados Unidos, movimento este mais conhecido pelo termo francês détente.

19Entendida aqui como as reduções tarifárias, abertura unilateral e concessões comerciais sem exigências similares.

20MENDONÇA, Filipe - Entre a Teoria e a História…, p. 22.

21«EIGHTY YEARS AFTER the Reciprocal Trade Agreements Act, 2014». United Staztes Trade Representative. Consultado em: 21 de outubro de 2021. Disponível em: https://ustr.gov/about-us/policy-offices/press-office/blog/2014/June/Eighty-years-of-the-Reciprocal-Trade-Agreements-Act.

22IRWIN, Douglas A. - Clashing over Commerce…, p. 08.

23A reciprocidade difusa refere-se à observância de normas que prescrevem que um Estado contribua com sua parte justa, ou se comporte bem com os demais, visando obter benefícios para um grupo do qual faz parte, ao invés de o fazer visando recompensas condicionais específicas.

24MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo…, p. 71.

25CRUZ, Sebastião Carlos Velasco e - Estados e Mercados: Os Estados Unidos e o Sistema Multilateral de Comércio. São Paulo: Editora da Unesp, 2017.

26MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo…, p. 161.

27A teoria da estabilidade hegemônica foi o nome dado a formulação da tese fundamental de Charles Kindleberger e Robert Gilpin, no início da década de 1970, cuja primeira apresentação foi feita por Kindleberger, na forma de uma teoria de «liderança» ou «responsabilidade», na qual ele argumenta que uma economia mundial aberta e liberal requer a existência de uma única potência hegemônica ou dominante.

28WEBB, Michael C.; KRASNER, Stephen D. - «Hegemonic stability theory: an empirical assessment». In Review of International Studies. Vol. 15, N.º 2. 1989, pp. 183-198. Número Especial sobre a Balança de Poder.

29Segundo Webb e Krasner, apenas um hegemon tem poder e motivação suficientes para prover o bem público da estabilidade econômica internacional por meio de suas próprias ações.

30FIORI, José Luis - «Sobre o poder global». In Novos estudos, CEBRAP. N.º 73, 2005.

31KEOHANE, Robert O. - After Hegemony: Cooperation and Discord in the World Political Economy. Princeton: Princeton University Press, 1984.

32KINDLEBERGER, Charles - The World in Depression, 1929-39. Berkeley: University of California Press, 1973; GILPIN, Robert - The Challenge of Global Capitalism: The World Economy in the 21st Century. 4.a edição. Washington: Institute for International Economics, 2005.

33GILPIN, Robert - The Challenge of Global Capitalism…,, p. 5.

34 BAYARD, Thomas O.; ELLIOTT, Kimberly Ann - Reciprocity and Retaliation in U.S. Trade Policy, p. 9.

35MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo…, p. 173.

36Ibidem, p. 139.

37«H.R. 4848 (100th): Omnibus Trade and Competitiveness Act of 1988 ». Govtrack. Consultado em: 20 de março de 2022. Disponível em: https://www.govtrack.us/congress/bills/100/hr4848/text.

38MENDONÇA, Filipe - Entre a Teoria e a História…, p. 247.

39Ibidem.

40O protecionismo é entendido aqui pelo autor como sendo a necessidade de se proteger as indústrias nacionais da com- petição estrangeira por meio de barreiras, mantendo internamente as atividades produtivas. Tal política era defendida por muitos congressistas, principalmente do Partido Democrata. Como a defesa de tal princípio não é viável politicamente nos Estados Unidos, muitas vezes utiliza-se o termo fairness para justificar suas políticas, criando as demandas pró-fair trade. Contudo, tal demanda tem sua característica própria onde práticas desleais de comércio devem ser combatidas para deixar os atores em igualdade de condições para a competição.

41MENDONÇA, Filipe - A Face Multilateral do Unilateralismo…, p. 163.

42Ibidem, p. 73.

43BAYARD, Thomas O.; ELLIOTT, Kimberly Ann - Reciprocity and Retaliation in U.S. Trade Policy.

44No caso japonês, não é possível afirmar que o conflito se transformou em uma guerra comercial, pois, apesar da mídia da época defini-lo de tal forma, o Japão não contrarretaliou os Estados Unidos, sendo esta uma condição necessária para caracterizar uma guerra comercial segundo a literatura específica. Não obstante, o caso mantém-se insigne na presente análise, dadas as retaliações, imposições de tarifas e demais ações que os Estados Unidos adotaram.

45MENDONÇA, Filipe - Entre a Teoria e a História…, p. 264.

46Diante das VER, as empresas automobilísticas japonesas adotaram duas estratégias principais. A primeira consistia na estratégia de iniciar a produção de seus automóveis nos Estados Unidos. A outra, em transferir as exportações para categorias de preços mais elevados. Por exemplo, nas vendas da Toyota nos Estados Unidos, a proporção das vendas de carros novos na faixa de 4500 dólares a 6000 dólares nas vendas totais diminuiu de 36,5% em 1981 para 24% em 1982, enquanto as participações correspondentes para vendas de carros novos com preços acima da faixa de 12 001 dólares aumentaram de 0,5% a 12%, respetivamente.

47URATTA, Shujiro - «US-Japan trade frictions: the past, the present, and implications for the US-China trade war». In Asian Economic Policy Review. Vol. 15, N.o 1, 2019.

48Ibidem; «Document 4. Memorandum of Conversation (S), Secretary of State Haig, Foreign Minister Ito, et al., Subject: General Foreign Policy, Automobiles, Defense, North South, March 23, 1981». NSARCHIVE. Consultado em: 1 de maio de 2021. Disponível em: https://nsarchive2.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB175/japan2-04.pdf; VIGEVANI, Tullo; MENDONÇA, Filipe; LIMA, Thiago - Poder e Comércio: A Política Comercial dos Estados Unidos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.

49DESTLER, I. M. - American Trade Politics. 4.ª edição. Washington: Institute for International Economics, 2005.

50KUNKEL, John - America’s Trade Policy Towards Japan: Demanding Results. Londres: Routledge, 2003.

51Ibidem, pp. 107-108.

52DESTLER, I. M. - American Trade Politics, p. 215.

53BAYARD, Thomas O.; ELLIOTT, Kimberly Ann - Reciprocity and Retaliation in U.S. Trade Policy, p. 14.

54Ibidem, p. 15.

55CHORA, Miguel - O Desafio do Oriente: Uma Análise Comparada entre os Dois Maiores Conflitos Económicos das Últimas Décadas. Observatório Político. 2020. Consultado em: 25 de abril de 2021. Disponível em: http://www.observatoriopolitico.pt/wp-content/uploads/2020/12/WP_98_MC.pdf.

56ABE, Takeshi - «The history & significance of Japan’s trade & industrial policy - a case study of trade friction at the end of the 20th century». In Japan SPOTLIGHT. Novembro-dezembro de 2017. Disponível em: https://www.jef.or.jp/journal/pdf/216th_Economic_History.pdf.

57URATTA, Shujiro - «US-Japan trade frictions…», p. 11

58BAYARD, Thomas O.; ELLIOTT, Kimberly Ann - Reciprocity and Retaliation in U.S. Trade Policy, p. 419.

59KUNKEL, John - America’s Trade Policy Towards Japan…, p. 173.

60ABE, Takeshi - «The history & significance of Japan’s trade & industrial policy…». p. 51.

61PECEQUILO, Cristina - Os Estados Unidos e o Século XXI. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

62SIDER, Kammogne Josiane - «Sino-American clash of hegemony: an analysis of US-China trade war». In Open Journal of Political Science. Vol. 10, N.o 1, 2020, pp. 15-26.

63GIBBON, Peter; VESTERGAARD, Jakob - US Trade Policy under Trump: Assessing the Unilateralism Turn. Copenhaga: Dansk Institut for Internationale Studier (DIIS), 2017.

64CASTILLEJO, Juan Mañez; SILVENTE, Francisco Requena - «La guerra comercial de Donald Trump y sus consecuencias eco- nómicas». In Análisis económico. Vol. 35, N.º 913, 2020, pp. 33-56.

65LIMA, Thiago; MENDONçA, Filipe - «As eleições nos Estados Unidos e o futuro do trumpismo». Estadão. 2020. Consultado em: 10 de maio de 2021. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/ blogs-gestao-politica-e-sociedade/as-eleicoes-nos- estados-unidos- e- o-futuro- do-trumpismo/.

66MENDONÇA, Filipe, et al. - «“America First but not alone: uma (nem tão) nova política comercial dos Estados Unidos com Donald Trump». In Revista Tempo no Mundo. Vol. 5, 2019.

67CHONG, T. T. L.; LI, X - «Understanding the China - US trade war…».

68«RESTORATION OF THE LAWFUL rights of the People’s Republic of China in the United Nations». United Nations Digital Library. 1972. Consultado em: 19 de outubro de 2022. Disponível em: https://digitallibrary.un.org/record/192054.

69WANG, Dong - «China’s trade relations with the United States in perspective». In Journal of Current Chinese Affairs. Vol. 39, N.º 3, 2010, pp. 165-210.

70ZENG, Ka - Trade Threats, Trade Wars: Bargaining…, p. 121.

71WANG, Dong - «China’s trade relations with the United States in perspective», p. 173.

72MENDONÇA, Filipe, et al. - «“America First but not alone”…».

73SCHEIPL, Thomas; BOBEK, Vito; HORVAT, Tatjana - «Trade war between the USA and China: impact on an Austrian company in the steel sector». In Naše gospodarstvo/ Our Economy. Vol. 66, N.º 1, 2020, pp. 39-51.

74MENDONÇA, Filipe, et al. - «“America First but not alone”…», p. 119.

75PASZAK, Paweł - «China-U.S. trade war: origins, course and consequences». Warsaw Institute. Special Report, 2020. Consultado em: 19 de setembro de 2022. Disponível em: https://warsawinstitute.org/china-u-s-trade- war-originscourse-and-consequences/.

76MENDONÇA, Filipe, et al. - «“America First but not alone”…», p. 125.

77WORLD TRADE ORGANIZATION - «The US-China trade war: a timeline». 2019. Consultado em: 20 de maio de 2022. Disponível em: https://wtocenter.vn/chuyen-de/13504-the-us-china-trade-war-a-timeline.

78Ibidem.

79«ECONOMIC AND TRADE Agreement between the United States of America and the People’s Republic of China». United States Trade Representative. 2020b. Consultado em: 19 de maio de 2021. Disponível em: https://ustr.gov/sites/default/files/files/agreements/ phase%20one%20agreement/ Economic_And_Trade_Agreement_Between_The_United_States_And_China_Text.pdf.

80«ECONOMIC AND TRADE Agreement between the United States of America and the People’s Republic of China» - Fact sheet. 2020a. United States Trade Representative. Consultado em: 19 de maio de 2021. Disponível em: https://ustr.gov/ sites/default/files/files/agreements/phase%20one%20agreement/US_China_Agreement_Fact_Sheet.pdf.

81Ibidem.

82SUTTER, Karen M. - «U.S. China trade relations». Congressional Research Ser- vice (CRS). Versão 13. Atualizado em 2021.

83MILDNER, Stormy-Annika; SCHMUCKER, Claudia - «The battle of the giants: US trade policy vis-à-vis China». In CESifo Forum. Vol. 20, N.º 1, 2019, pp. 3-10.

Recebido: 04 de Novembro de 2022; Aceito: 18 de Julho de 2023

Débora L. Nascentes Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e bolseira da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP: 2022/05841-2)

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